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O ministro Luís Roberto Barroso durante sua posse como presidente do STF.
O ministro Luís Roberto Barroso durante sua posse como presidente do STF.| Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF

“Que eu possa ser abençoado para cumprir bem essa missão”. Assim o ministro Barroso teria terminado seu discurso de posse na presidência do STF, não voltasse em seguida para chamar Maria Bethânia para cantar “uma linda música, uma linda canção de amor”. E aí Bethânia cantou uma qualquer aí daquele Chico hoje menos famoso do que o ex da Luísa Sonza, encerrando a cerimônia com esse toque de figurinha de “Boa noite” mandado por vó no grupo do Whats da família.

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Foi tudo muito brega, claro, mas queria voltar à frase final: “Que eu possa ser abençoado…” Percebeu? O senhor ministro não pede bênção, ele espera merecer uma bênção. São coisas bem diferentes. Quem pede bênção é humilde. Quem acha que bênção é um prêmio para algum suposto mérito demonstra o contrário da humildade. Resta a vaidade, imensa e incontida, vazando pelas lágrimas infantilizadas de uma posse cuja eleição “vencida” é tão meritória quanto receber diploma de formatura de educação infantil.

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Escrevi poucas colunas no formato drops de hortelã, como esta. Em geral, colunistas apelam a esse formato de breves notas, conectadas ou não, por falta de tempo para escrever. Ou preguiça. Meu caso é a soma de ambos. Mas não a preguiça de escrever, de produzir, é preguiça de tratar dessas coisas, desses “assuntos da semana”, tão inesquecíveis quanto um drops de hortelã chupado na hora do recreio entre a aula de Português e a de Educação Moral e Cívica (quem lembra?).

O senhor ministro não pede bênção, ele espera merecer uma bênção. São coisas bem diferentes. Quem pede bênção é humilde. Quem acha que bênção é um prêmio para algum suposto mérito demonstra o contrário da humildade

Aliás, drops de hortelã não é o nome de uma música do nosso cancioneiro? Deixa eu ver. Pior que é. Do Oswaldo Montenegro. “Mas fiz um drops de hortelã da bala que eu te dei / Para tirar o porém da frase que eu nunca fiz”. [insira figurinha de constrangimento]. Perdi, mané.

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Falando em bênção, esta semana o papa Francisco respondeu formalmente às dubia feitas por alguns bispos, como esta: “sobre a afirmação de que a prática difusa de abençoar uniões do mesmo sexo está de acordo com a Revelação e o Magistério”. Parte da resposta: “a prudência pastoral deve discernir adequadamente se existem formas de bênção, solicitadas por uma ou mais pessoas, que não transmitam um conceito errôneo de matrimônio. Pois, quando se pede uma bênção, está se expressando um pedido de ajuda a Deus, uma súplica para poder viver melhor, uma confiança em um Pai que pode nos ajudar a viver melhor”.

Caberia aqui uma ressalva à crítica ao pedido de bênção do ministro Barroso (que não tem nada a ver com casamento homossexual, acho)? Afinal, e se o mérito buscado for deixar de estar em pecado, não seria razoável e justo pedir a bênção de forma condicional (“que eu possa ser abençoado quando parar de pecar”, por exemplo)? Nah, ainda assim o orgulho transparece nessa falsa humildade, como aquelas raízes de árvores à beira da rua rachando o asfalto. Quem reconhece estar em pecado humildemente suplica a ajuda de Deus para sair desse estado, não condiciona essa ajuda a quando ele, pecador, por mérito próprio e exclusivo, se sentir digno de ser abençoado.

Mas, que digo? Isso é para cristãos, católicos especificamente. Desculpe a amolação, ministro. E que Deus me abençoe. Porque Ele pode, mesmo eu não sendo digno de entrar em Sua morada.

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Para finalizar, uma nota sobre a verdadeira humildade. Escrevo a coluna no dia de São Francisco de Assis, meu santo onomástico. Lembrei de um trecho de sua biografia, escrita por Tomás de Celano:

“Um dia, seguia ele montando num jumento (a debilidade e o mal-estar não lhe consentiam andar a pé), quando, ao atravessar a propriedade de um lavrador que andava no cultivo da terra, este correu ao seu encontro e lhe perguntou com vivo interesse se era acaso o irmão Francisco. E como o varão de Deus respondesse com humildade ser ele mesmo, disse-lhe o lavrador: ‘Pois então trata de ser aquilo que os outros dizem de ti, pois muitos são os que em ti acreditam. Vê lá, pois, não nos desiludas’. Francisco, ao ouvir tais palavras, desceu do burro e, prostrando-se diante do aldeão, beijou-lhe humildemente os pés e agradeceu-lhe ter-se dignado admoestá-lo.”

Agora imagine como reagiria um ministro do STF se fosse admoestado… Nah, não precisamos imaginar, sabemos bem como seria; está sendo.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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