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A resistência de boa aparência
| Foto: Unsplash

A cena de uma jovem deputada de boa aparência (e ótimos padrinhos) avançando a céu aberto para derrubar o fascismo comoveu o Brasil. A imagem da meiga Tabata Amaral marchando ao lado de Alexandre Frota pela educação encheu os brasileiros de esperança. Se a Petra Costa não estivesse no Oscar poderia ter começado a filmar ali mesmo a Democracia em Vertigem 2 – Mais Vertiginosa Ainda. Enquanto não vem o novo blockbuster da Andrade Gutierrez, vamos tentando explicar essa nova e exuberante pedagogia nacional.

Como todo mundo já sabe e todo mundo já viu, o petismo já era. Quem está dando um show hoje no Brasil é a resistência de boa aparência. O que aconteceu foi o seguinte: quando os heroicos defensores da democracia e do liberalismo viram que a reforma da Previdência – que eles sempre disseram que era a salvação – estava realmente sendo feita, partiram para a guerra. Não a guerra para aprovar a reforma, claro. A guerra para bombardear os que estavam ousando fazê-la.

É uma lógica muito simples. Como é que você vai viver de vender uma salvação se os possíveis compradores já estão salvos? Não dá. E aí é que a coisa complicou de vez. A nova Previdência, que sozinha já salva o país do colapso – ou seja, uma desgraça – é uma de várias reformas que começam finalmente a remover os caninos do Estado do pescoço do contribuinte. Enfim, uma revolução – a verdadeira, a libertadora, a única.

Foi assim que nasceu a revolução de auditório – limpinha, perfumada e fácil de usar. É um movimento de renovação nacional com receitas simples e geniais que qualquer um pode fazer. Por exemplo: pegue um rostinho meigo, jogue uma pitada de PDT com Ambev, misture tudo no caldeirão do Huck e está pronta uma liderança política novinha em folha. Se o Darcy Ribeiro soubesse disso teria levado os índios direto pro shopping.

Nesse alegre parque de diversões cívico você pode ver políticos históricos como Fernando Henrique Cardoso ou Roberto Freire fazendo acrobacias intelectuais e acadêmicas para explicar sua devoção a um apresentador de auditório milionário. Esses cardeais da democracia e da civilidade estavam preocupadíssimos com o avanço da ignorância no poder – e depois de muito refletir, conjecturar e prospectar suas mais refinadas fontes de saber e erudição, fecharam com Luciano Huck.

Nessa Disney da renovação democrática você não para de se divertir. Tem um brinquedo que é sensacional: você pergunta ao Armínio Fraga – o ex-presidente do Banco Central e grande propagador do liberalismo – o que ele está achando das reformas liberais do Paulo Guedes e ele te responde que a Amazônia está em perigo. Aí você pergunta ao Armínio o que ele achou do menor risco da década e dos menores juros da história e ele te responde que a mulher é dona do próprio corpo. Com um pouco de sorte você ainda verá Armínio Fraga alertando que Bolsonaro ameaça as baleias – alerta que vale ao mesmo tempo para ecologia e para gordofobia. Gênio.

A ecologia é muito importante nesse tsunami de renovação – e nada mais novo que João Amoedo reciclando panfleto petista para acusar o fascismo por derramamento de óleo na praia. Reciclar é renovar. Ande um pouco mais no parque de diversões da resistência e você verá João Dória de mãos dadas com Alexandre Frota contra a brutalidade no poder. Dória também pode ser visto dando a mão ao presidente petista da OAB para gritar contra a ditadura do século passado. Renovar é viver.

Na Disney da renovação só tem gente bem vestida e cheirosa. Ali é tudo tão excitante que você pode até encontrar um grande amor. Aí você só vai ter o trabalho de perguntar: no meu jatinho ou no seu?

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