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Bolsonaro utiliza de seu estado de saúde como combustível para discursos políticos
Bolsonaro utiliza de seu estado de saúde como combustível para discursos políticos| Foto: Joédson Alves/EFE

Nem bem havia chegado ao hospital, o presidente Jair Bolsonaro já usava suas redes sociais para espetacularizar politicamente o seu estado de saúde. Publicou em seu Instagram uma foto na maca, já com a sonda no nariz e a barriga com a cicatriz à mostra. Há ali um conjunto de elementos visuais que, somados ao texto que vai em anexo, tentam convencer o público não apenas a se condoer por ele (o que não seria problema), mas, principalmente direcionar a consequente possível indignação aos supostos inimigos que teriam lhe imposto essa condição.

bolsonaro - obstrução intestinal
Foto publicada nas redes sociais de Bolsonaro.| Reprodução/Facebook

O flagrante de um momento de fragilidade serve de combustível para alimentar a propaganda que busca criar a imagem daquele que colocou a vida em risco para salvar o Brasil. Ele seria, a um só tempo, a vítima e também o predestinado. Com isso, a facada que levou se torna também metafórica, com cada um que se opõe ou o critica sendo reduzido a um Adélio Bispo com vis propósitos de lhe furar as entranhas.

A mensagem que acompanha a foto do presidente é um misto de mistificação política com pura teoria conspiratória. “Mais um desafio, consequência da tentativa de assassinato promovida por antigo filiado ao PSOL, braço esquerdo do PT, para impedir a vitória de milhões de brasileiros que queriam mudanças para o Brasil”, consta no primeiro parágrafo da postagem. Aqui temos o típico encadeamento desonesto, no qual fatos isolados e não conexos vão sendo juntados por fiapos de realidade associativa.

Sim, Adélio Bispo foi filiado ao PSOL entre 2007 e 2014, deixando o partido quatro anos antes do atentado. Sim, PSOL e PT são de esquerda, já estiveram juntos no passado e militam em favor de pautas semelhantes. Mas o que uma coisa tem a ver com a outra? Qual a relação do ato de Adélio e seu antigo partido? Qual a relação do ato de Adélio com seu antigo partido ser ideologicamente próximo ao PT? A frase foi construída pra fazer o público achar que a tentativa de homicídio tem alguma conexão política com legendas de esquerda, quando tudo demonstra que não tem.

Por certo, a motivação de Adélio era dar cabo de Bolsonaro. Mas, por ser mal sucedido, seu ataque mudou os rumos da campanha em favor de seu alvo. Uma vez tendo sobrevivido, o então candidato, que perdia em todos os cenários de segundo turno, passou a ser poupado de críticas na campanha eleitoral, capitalizou empatia e venceu, tornando-se presidente.

Bolsonaro enfrenta o pior momento de seu mandato. Na medida em que se avolumam pedidos de impeachment, cresce em igual medida o descontentamento com o governo, e agora não apenas potencializado pela condução catastrófica da pandemia, mas também por denúncias graves de corrupção em seu Ministério da Saúde e uma acusação de possível prevaricação.

O núcleo duro do bolsonarismo sabe muito bem que a exploração política da facada é um ativo. Essa estratégia, já usada ainda na eleição de 2018, se renova agora em meio a uma crise crescente. A tentativa de vender o líder como um mártir do patriotismo é só escatologia, morbidez e desespero.

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