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“Não há como negar, nessa altura do campeonato, que existem indícios absolutamente claros a respeito de uma tentativa de golpe de Estado. Eu não tenho dúvida a respeito disso. Nós temos depoimentos consistentes. O trabalho da Polícia Federal é um trabalho bem feito. Tem um general confirmando, de certa forma, a existência do golpe. Temos mensagens, tem execução, tem monitoramento de um ministro do Supremo Tribunal Federal, tem um plano que estava no Palácio do Planalto.” A declaração não é do ministro Alexandre de Morais, do ministro Flávio Dino ou do procurador-geral da República Paulo Gonet, que denunciou Jair Bolsonaro por tentativa de golpe. É de ninguém menos que Celso Vilardi, atual advogado de defesa do ex-presidente Bolsonaro em entrevista, dois meses atrás, no programa de William Waack na CNN Brasil.
Vilardi é um dos mais proeminentes especialistas em direito penal do Brasil. Uma figura conhecida não apenas no âmbito jurídico, mas também do debate público. Assim que assumiu a função de representar a defesa de Bolsonaro, declarações anteriores como essa começaram a ser relembradas nas redes sociais e até por jornalistas como forma de desmoralizá-lo.
O direito de defesa é um primado do liberalismo político e deve servir a todos. Enquanto ele não for compreendido e aceito como parte fundamental da democracia, continuaremos presos numa caverna anticivilizatória
Com ar acusatório, gente experiente da imprensa tentou constranger Vilardi, como se, ao aceitar advogar na defesa de Bolsonaro, tivesse entrado em contradição com que havia dito anteriormente. Isso, por óbvio, é ignorar a natureza de sua profissão e desprezar as garantias fundamentais, que valem para Bolsonaro, assim como para qualquer outro cidadão, independente da visão que se tenha das acusações que lhe são feitas.
Pouco importa o juízo que o advogado de Bolsonaro faça dele. Isso não o impede de exercer o seu papel de defesa e de buscar, dentro da lei, a absolvição de seu cliente. Nas democracias é assim: todos têm direito a representação legal na Justiça, mesmo que eventualmente responsáveis pelos atos que lhes são imputados. Ou não há criminosos já condenados com advogados constituídos? O direito de defesa não tem relação com opiniões dadas aqui ou acolá nos meios de comunicação.
Parte da direita está reconhecendo apenas agora a necessidade do devido processo legal. Outrora punitivos, muitos se tornaram legalistas e garantistas. Do outro lado, pela esquerda, notórios garantistas se converteram, pelas mesmíssimas circunstâncias, em persecutores ávidos por penas exemplares.
O direito de defesa é um primado do liberalismo político e deve servir a todos, inclusive Bolsonaro ou quem quer que seja. Enquanto ele não for compreendido e aceito como parte fundamental da democracia, continuaremos presos numa caverna anticivilizatória. Bolsonaro pode ter feito tudo o que eventualmente a PGR diz que ele fez, mas tem o direito que um advogado lhe defenda, ainda que este o considere culpado.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos




