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Foto Jonathan Campos/ Gazeta do Povo
Foto Jonathan Campos/ Gazeta do Povo| Foto:

Lula saiu da cadeia e se encontrou com Lula.

Deixo de lado as questões jurídicas e criminais. Lava Jato à parte, o problema de Lula, o problema do Brasil a respeito de Lula, é político e, sobretudo, moral. Lula precisa ser exorcizado do imaginário brasileiro por razões outras que não as policiais. Que cometamos erros, mas outros erros, erros melhores do que esse. Aliás, cometam vocês, porque esse erro nunca cometi.

“Fail better”, eleitor.

Quando os mais ingênuos pensavam que sairia da cadeia um homem prudente, cuidadoso, democrata, pacificado, manso e humilde de coração, eis que temos o sindicalista rousseauniano, tacape ideológico em punho, pré-2002: o Lula da moratória, o Lula da mitomania, o Lula que não assinou a Constituição de 88.

Lula é o pai da polarização. As palavras são dele, não minhas. Ele as berra com olho rútilo e lábio trêmulo:

Aos que criticam ou temem a polarização, temos que ter coragem de dizer: nós somos, sim, o oposto de Bolsonaro. Não dá para ficar em cima do muro: somos e seremos oposição a esse governo de extrema-direita que gera desemprego e exige que os desempregados paguem a conta.”

O oposto do fascismo talvez seja a democracia, mas o oposto da extrema-direita é a extrema-esquerda.

Num arroubo de sinceridade, a baba da arrogância escorrendo, zombou dos que lhe pedem autocrítica.

O PT não tem que fazer autocrítica!

Ele está certo e mais do que certo. O PT não tem de fazer autocrítica nenhuma, porque fazê-lo seria trair sua própria natureza e, pior, trair seus correligionários. E o que faríamos nós se o PT reconhecesse crimes e erros: aceitaríamos as desculpas e apostaríamos de novo? Votaríamos em Fernando Haddad, que deseja a unificação da esquerda contra um liberalismo que nunca existiu?

Declino.

Sob os governos petistas, embrulhado no papel-de-presente da redistribuição de renda e do consumo imediato, montou-se um dos mais engenhosos esquemas de corrupção da América Latina. Como mágico de bairro, Lula distraía a audiência com a mão esquerda do populismo, enquanto com a outra cumprimentava os banqueiros. Da sabotagem à democracia, no Mensalão, ao bilhões às empreiteiras, o país se descobriu grilado, loteado, dividido. Não bastasse, a inabilidade quase artística de Dilma Rousseff, vulgo “gerentona”, levou as contas públicas à bancarrota, o que precipitou e justificou seu impeachment.

O trabalho de recuperação econômica e institucional de Michel Temer foi bom e poderia ter sido ainda melhor, caso as tramoias de Rodrigo Janot e grande elenco tivessem sido averiguadas, descobertas e punidas a tempo. A reforma da Previdência, por exemplo, teria sido aprovada. Nesse ínterim, uma eleição das mais imprevisíveis entre tantas culminou na vitória de Jair Bolsonaro.

Mais do que propriamente polarização, temos na verdade um vasto conjunto de ideias (ou falta de ideias) e posturas extremas, que se canibalizam e conquistam a atenção do eleitorado.

Não, Lula não é à esquerda o que Bolsonaro é à direita. Ambos estão do mesmo lado, disputam os mesmos votos, capitalizam o mesmo ressentimento, ocupam o mesmo espaço simbólico, respondem aos mesmos anseios. Precisam um do outro e sabem disso. Lula quer disputar com Bolsonaro as próximas eleições, por motivos óbvios. Bolsonaro quer disputar com Lula as próximas eleições, por motivos igualmente óbvios.

No Brasil, os extremos estão em toda parte e o centro em parte alguma.

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