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É bem possível (e é bem possível o contrário, aliás) que, diante das tantas críticas e da não muito animadora repercussão, Jair Bolsonaro reconsidere o infalível plano de indicar o sangue do seu sangue à embaixada do Brasil nos Estados Unidos. Já estamos nos acostumando com um governo que é todo feito de excentricidades e nenhum centro, pois o estilo é esse e o estilo é o homem: testar os limites do arbítrio, a reação da imprensa e a receptividade da militância. Se colar, colou.

Seja qual for desfecho de mais esse esquete, a ideia em si é estapafúrdia, e deveria servir de alerta a todos aqueles que, tendo apostado no Capitão como o mal menor ante o PT, insistem em tratá-lo como se fosse o bem maior a despeito do PT, mesmo depois da findas as eleições. Ou então confessem de uma vez por todas: vocês “amam muito tudo isso”.

Não me atenho às controvérsias jurídicas acerca do nepotismo. Mais do que impedimentos legais, há – deveria haver – óbvios impedimentos éticos e institucionais. Nunca uma nova prática soou tão velha. A indicação de parentes a cargos de altíssima relevância é própria de Estados em que a separação entre poderes não é clara, e a distinção entre o interesse público e o desejo privado não é estabelecida.

Alguma novidade por aqui?

Nenhuma novidade num país em que a ascensão social se dá por meio do Estado e de trocas de favores, do quem-indica e da “cordialidade” de que falava Sérgio Buarque de Holanda. Na dúvida, resolvemos tudo com a mistura de família e Estado, Estado e família, até que não consigamos mais distinguir uma coisa da outra. O vício do “cargo de confiança” é comum àqueles que não confiam na impessoalidade das instituições. Podem ser tudo, até bem intencionados, mas liberais e republicanos não são.

Não bastasse a inconveniência ético-institucional, falta ao rebento messiânico a competência técnica necessária. Seu currículo é constrangedor. Seu inglês é precário. Sua experiência é nenhuma. Sua envergadura intelectual é discutível. Sua cosmovisão é controversa. Isso não é má vontade minha ou de quem quer que seja; são fatos públicos e notórios. É preciso um pouquinho mais do que saber fritar hambúrgueres para assumir chapa tão quente.

Nossa diplomacia, apesar dos desvios lulopetistas, sempre se notabilizou pelo indiscutível preparo cultural dos profissionais de carreira. Já indiquei nesta Gazeta o ótimo livro de Rubens Ricupero, A diplomacia na construção do Brasil, que conta uma pouco dessa história que deu certo. Anos de PT corroeram os alicerces; mais alguns anos de Bolsonaro – nestes termos – derrubarão o edifício.

E tudo isso à toa, num assunto frio, em mais uma crise gerada por um governo em permanente processo de autocombustão. Mas decerto é divertido governar. Tudo tão movimentado e surpreendente, como num parque de diversões que acaba de chegar à cidade.

Eu já estou começando a fazer planos para o futuro. Quem sabe um dia não viro também presidente? Ou ministro. No mínimo secretário ou chefe de repartição. Tenho quem me indique, já fui funcionário público, já ensinei crianças e, muito aqui entre nós, sei fazer um feijão carioquinha que vocês nem imaginam.

Troco a receita por uma embaixada.

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