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AFP PHOTO / DIEGO HERCULANO
AFP PHOTO / DIEGO HERCULANO| Foto:

Pesquisa do Datafolha aponta Lula em primeiro lugar na preferência dos eleitores. Acredito. Pesquisa aponta que a maioria dos eleitores acredita ter sido justa sua prisão. Também acredito. Há quem veja contradição nisso: se querem Lula presidente, não o querem na cadeia; se o querem na cadeia, não o querem presidente. Não há contradição. Esse tipo de aporia é possível – diria até: previsível, cotidiana – no Brasil.

Tem alguma coisinha meio avariada no sistema límbico do eleitor brasileiro. É um bicho que assovia, chupa cana e grita bingo: admite contradições sem maiores cerimônias nem timidezes. De resto, o princípio de identidade parece nunca ter sido muito bem aceito por aqui. Uma coisa – qualquer coisa – é ela mesma, e não é ela mesma, é e não é ela mesma, ao mesmo tempo, sob o mesmo aspecto, sem problema: a depender das conveniências, do pleito eleitoral, do preço da gasolina.

O eleitor comum – cuja percepção política é uma mixórdia de informações desencontradas, sentimentos, expectativas, medos e desinteresse – se acostuma com tudo: com o escândalo, com a farsa, com os bilhões, com a sátira; a sátira perde o poder de corrosão e vira piada; a piada em pouco tempo perde a graça e deixa de ser piada, para se converter em elogio. E João Santana, ou um qualquer marqueteiro, se aproveita da situação e inverte o placar.

Se Freud não explica, Lombroso há de explicar. Se nem ele, chamem um exorcista.

A criatividade moral por esses pampas, essas marginais e esses sertões é uma força da natureza, uma oitava maravilha virada do avesso. Por isso, é bem razoável que queiram o Lula preso e ao mesmo tempo presidente. Que o queiram presidente e depois preso. Que o queiram presidindo direto da cadeia, como fazem os traficantes stricto sensu (que, por sinal, são bandidos e heróis para muita gente). Ou melhor ainda: que o queiram roubando direto da presidência, como fez durante tantos anos.

Dentro e fora, presidente e bandido: tudo isso se funde numa mesma figura, tudo isso se confunde num mesmo país.

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Aliás, que Lula seja sequer considerado em pesquisa eleitoral, estando preso, e  que tenha qualquer vantagem, pequena ou grande, real ou hipotética, e ainda arrebanhe eleitores, além dos familiares e comprometidos, dos fanáticos e dos cúmplices – é de fazer pensar. Ou de paralisar qualquer pensamento. Nosso cinismo político não será resolvido nos tribunais. Para aquém ou além da justiça, há política. Temos de lidar seriamente com ela.

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Lula, a propósito, disse de si mesmo que já não é mais uma pessoa, mas uma ideia. De fato: uma ideia bastante estúpida saída da cabeça de intelectuais da USP, de pelegos do ABC paulista, de histórica dependência assistencial do nordeste, da ala canhota e irresponsável da Igreja Católica. O resultado aí está: depois de um breve período de bonança – consumo desenfreado, aquecimento artificial da economia, cheque sem fundo eleitoral –, um país à beira do colapso e do ataque de nervos. Lula é uma ideia, ele disse, e “ideias têm consequências”, como lembra o clássico de Richard Weaver.

 

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