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O benéfico efeito colateral da radicalização
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Os últimos embates entre Olavo de Carvalho e os militares causaram desconforto em muita gente dentro e ao redor do governo. Se as brigas não são exatamente novidade, o fato é que o ataque ao militar mais respeitado do país, General Villas Boas, foi a gota que faltava para o balde da paciência transbordar.

A cada vez mais estridente ala-ideológica-do-governo, assim com hífen mesmo, tem atacado o próprio governo para se tornar mais governo que o governo (não reparem a bagunça), e parece acreditar que radicalizando o discurso, esticando a corda, espicaçando os adultos, terminará por conseguir o que quer. E o que eles querem? Pelo jeito, desejam que as pautas mais reacionárias tomem lugar do que consideram pragmatismo frio e calculista.

Jair Bolsonaro se equilibra com dificuldade entre os extremos. De um lado, men at work: a excelente equipe econômica; o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas; os tantos militares com preparo técnico devido e prudência bem-vinda. De outro, os filhos, que não têm cargo mas agem como se tivessem; o MEC e as Relações Exteriores; e todo um miolo político cheio de gente que não se sabe ao certo o que tem feito ali.

Ainda que eu tenha muitas restrições à figura política que é – e sempre foi – Jair Bolsonaro, sou capaz de imaginar que ele talvez preferisse conduzir o governo sem tantas trombadas, rupturas e discursos. É um palpite. Entretanto, o presidente tem cedido território para que os alunos do fundão ideológico atrapalhem a aula e tomem conta da sala. Uma baderna, como diria Weintraub.

Contudo, nem tudo acontece como se espera, e o resultado desse acirramento de ânimos pode inviabilizar o governo – até mesmo o pior aspecto do governo. Aqui a ironia é deliciosa: a tentativa de radicalizar o discurso político, para fazer política com ainda mais radicalidade, pode se transformar na impossibilidade de qualquer radicalização. Explico.

Um líder autoritário tem duas maneiras de impor sua agenda iliberal e antidemocrática: submetendo o Congresso à sua vontade ou fechando o Congresso à força. Ou seja, por meio da chantagem e da corrupção (Lula fez isso); por meio do poder militar (como em 64). Ao brigar com o Congresso, ao tratar o STF como a origem da maldade e ao humilhar publicamente os militares, o que resulta é que os personagens mais radicais asfixiam o presidente, e tiram dele até a possibilidade de ser radical. Eu não reclamo.

Afinal de contas, se Bolsonaro não tem o Congresso, não tem o STF e não tem os militares – pois todos: congressistas, ministros e militares foram convertidos em oposição –, o que é que ele tem, exatamente? Os filhos, a militância virtual e adolescentes gravando aula de cursinho, porque os mais de cinquenta milhões de eleitores que o elegeram querem saber de emprego, não de ideologia. Ninguém pegará em armas para defender um governo que não merece defesa e só produz desertores.

Moral da história: ruim para eles, bom para nós.

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