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Ilustração de Felipe Lima
Ilustração de Felipe Lima| Foto:

Dias atrás esta Gazeta publicou editorial dos mais pertinentes. Em resumo, se minha memória não me trai, era um apelo para que, dos escombros ideológicos a que foi reduzida a esquerda nesta era pós-Lula, ela se reinventasse, e aceitasse de uma vez por todas que o direito, a política, a economia e a ética não são instrumentos para ascensão ao (e manutenção no) poder.

É bem isso mesmo; ou seria. Ainda que não tenha este jornal – e muito menos este cronista – qualquer esperança mais entusiasmada com as alternativas que os socialistas têm proposto ao mundo desde antes do Manifesto Comunista, nem por isso deveríamos desistir de ver, de crer, numa esquerda melhorzinha.

Uma esquerda melhorzinha que já não tivesse saudades de Stálin ou de Fidel; que já tivesse se convencido de que Che não passava de um escroque, incompetente até para ser revolucionário.

É possível, há exemplos: Fernando Gabeira, figura das mais importantes e engajadas, rompeu com Lula quando Lula ainda encantava cobras à esquerda e à direita. Desde então, convertido ao bom senso, tem feito análise relevante e digna de ser lida.

Em vão.

Nossa esquerda se agarra a Lula como se dependesse dele sua sobrevivência; isso é mau sinal. É sinal de que se já nada ou muito pouco tem a oferecer como diagnóstico dos males da república, menos ainda como prognóstico; sinal de que não anda a passos de cágado, mas de curupira: quando se pensa que poderia seguir em frente, volta às origens.

Lula aí está, vagando como morto-vivo político, esperando o momento de ver a candidatura nascer quadrada.

O PSOL, partido-oxímoro, lançou a candidatura Boulos sob a bênção de painho. Nisso, certa ala que agora quer se afastar de Lula, protestou; o partido, para fazer jus ao nome, deu mostras do quanto o socialismo preza a liberdade, e admoestou os protestantes: “Voltem à santa igreja se quiserem ter vida eterna!” Por aí vai o folhetim.

Tenho alguma simpatia pelos que hoje pretendem se afastar do Lula. Andaram com más companhias, mas estão se emendando; porém, a simpatia vem com o gosto ruim da descrença, e que Deus me perdoe se atiro as primeiras, segundas e terceiras pedras. Talvez tenham se manifestado um pouco tarde demais para serem cridos como pecadores arrependidos.

Lentos de entendimento, custaram a acreditar no que viam há muito tempo, como uns Tomés às avessas. Viram, tocaram, cheiraram. Já não se sabe se antes eram Tomés, ou se hoje são ratos de navio naufragado. Também não sei dizer se esse rompimento é com o Lula ou com o espírito do petismo, “a letra mata, o espírito vivifica”, como quem dissesse: “Joguemos o bebê, fiquemos com a água do banho, ainda que sujinha”.

Apóstolos e apóstatas à parte, uma coisa é certa e talhada em pedra: a doutrina não é boa.

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