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Minha primeira reivindicação política foi um pedido de ciclovias
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Foi pedindo a construção de espaços seguros para os ciclistas que exerci ativamente, pela primeira vez, a minha cidadania. E isso já faz um bom tempo. Foi em meados da década de 1990, bem antes mesmo de poder votar, quando tinha lá meus 11 ou 12 anos de idade e dava minhas pedaladas em Araraquara, no interior de São Paulo.

Minha família e eu morávamos a cerca de seis quilômetros do centro da cidade, em um condomínio cercado por chácaras e sítios. Ao mesmo tempo em que isso nos dava a tranquilidade de ter uma casa sem muros ou grades na frente, essa distância também nos separava de certos símbolos da civilização moderna; o maior deles, o asfalto na frente de casa.

Para as crianças, isso estava longe de representar um problema. Movimento de carros ali, só mesmo o dos poucos moradores do local – naquela época, havia umas oito ou dez casas em todo o condomínio. Brincar na enxurrada em dias de chuva ou andar de Caloi Cross nas poças de lama eram duas das brincadeiras preferidas da molecada da rua.

Mas a terra roxa que era garantia de diversão para a criançada era também sinônimo de dor de cabeça para os adultos, sujando carros, empoeirando casas e encardindo os filhos. Cansados daquele subdesenvolvimento, os moradores resolveram agir e formaram uma associação de moradores do condomínio Altos da Fonte. Como primeira medida, convidaram o prefeito da cidade para um churrasco, com o objetivo de promover um lobby pró-asfalto.

O então prefeito da cidade era Roberto Massafera (então PMDB, hoje deputado estadual pelo PSDB-SP). O encontro político foi na casa do Marcelo, um engenheiro que era uma espécie de liderança comunitária e articulava a troca de lâmpadas queimadas dos postes e as operações tapa-buraco quando a erosão da chuva tornava as ruas de terra praticamente intransitáveis para veículos.

Muito mais pela picanha do que propriamente pelo asfalto, também fui àquela reunião com meus pais. Massafera ouviu pacientemente as queixas e reivindicações dos moradores.

Naquela época, eu já pedalava quase que diariamente 20 quilômetros até o distrito de Bueno de Andrada e, vez ou outra, atravessava a cidade e ia de bicicleta para a escola.

Filho de pai e mãe curitibanos, cresci ouvindo o dialeto “leite quente” dentro de casa e viajando para o Sul pelo menos uma vez por ano para visitar avós, tios e primos. Mas Curitiba me despertava a atenção por outro motivo: aquela era uma cidade que tinhas ruas exclusivas para as pessoas andarem de bicicleta. “Por que não ciclovias em Araraquara?”, pensei comigo. Um pouco inseguro, compartilhei a ideia com a minha mãe, que me incentivou a ir conversar com o prefeito para apresentar a sugestão.

Tomando a cidade de meus pais como exemplo, me aproximei do prefeito e, mudando o foco da reunião, perguntei quando Araraquara teria ciclovias como as de Curitiba. Um pouco supreso, Massafera, como bom político, saiu pela tangente e disse que também achava muito importante garantir a segurança dos ciclistas, mas que havia ainda muitas coisas a serem feitas em Araraquara antes de construir vias exclusivas para as bicicletas. Como exemplo, citou que era preciso, antes, asfaltar a rua da minha casa.

Ainda que frustrado com a resposta, aquele dia deixou algumas lições importantes. Aprendi que tinha voz e que era possível usá-la para participar da vida pública e entendi a importância de usá-la de forma democrática para cobrar e reivindicar ações do poder público. Foi unindo vozes que os moradores do bairro, finalmente, conseguiram conquistar o tão sonhado asfalto.

É preciso unir vozes. Não há outro caminho para pavimentar a via para a realização dos nossos sonhos e concretização de nosso interesses coletivos.

Epílogo

Me mudei para Curitiba com a família em 1999, aos 15 anos. Araraquara só ganhou sua primeira ciclovia em 2005, mais de uma década depois da minha conversa com o prefeito Massafera. A pista construída na gestão do prefeito Edinho Silva (PT) tem quase um quilômetro e liga a Faculdade de Química ao campus da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

Depois de tanto tempo, pude pedalar em 2011 por uma ciclovia na minha terra natal. Hoje vejo com orgulho que a cidade, a exemplo de tantas outras, também está engajada na luta pela ciclomobilidade.

Além da realização das Bicicletadas, os ciclistas também criaram a Associação Bike Ativa para defender os interesses dos ciclistas araraquarenses.

Mas os desafios são muitos: a própria Unesp não permite a entrada de bicicletas na Faculdade de Química. Na atual administração do prefeito Marcelo Barbieri (PMDB), os ciclistas estão praticamente excluídos das discussões dos programas de infraestrutura viária.

A cidade carece de paraciclos nos prédios públicos e a ciclovia foi abandonada ainda no governo anterior. A convivência com os motoristas de ônibus do sistema de transporte público também é problemática, sendo comuns casos de acidentes.
Que da união dessas vozes, surja uma Araraquara amiga da bicicleta.

Todo apoio à luta dos cicloativistas da Morada do Sol!

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