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Rodolfo Hernández ao lado de Íngrid Betancourt, que desistiu da sua candidatura e decidiu apoiá-lo
Rodolfo Hernández ao lado de Íngrid Betancourt, que desistiu da sua candidatura e decidiu apoiá-lo| Foto: EFE/Str

O colombiano Gustavo Petro foi votar no domingo passado convencido que estava com as mãos na faixa presidencial, ou pelo menos a um passo dela. Vários de seus assessores previam uma vitória no primeiro turno ou um segundo turno bem folgado com o direitista Federico Gutiérrez nas cordas, rechaçado pelo enfado dos colombianos com o uribismo – a corrente política direitista liderada pelo ex-presidente Álvaro Uribe. Essa era a visão do comitê de Petro, um ex-guerrilheiro do grupo M-19 que migrou para a política, foi prefeito da capital, Bogotá, parlamentar e candidato presidencial em 2010 e 2018 – nesta, perdeu no segundo turno para o atual presidente, Iván Duque.

O resultado das urnas mostrou Petro em primeiro lugar como previsto nas pesquisas, mas ele na reta final da disputa potencialmente derrotado. O empresário Rodolfo Hernández, o candidato outsider que se apresentou como o representante da antipolítica e comprometido com o combate à corrupção, recebeu 28% dos votos e levou a disputa para um segundo turno até então improvável.

Apenas duas semanas antes do pleito, Hernández tinha apenas 10,9% segundo as pesquisas e jamais havia representado perigo algum para os planos de Petro em polarizar a disputa contra o segundo colocado nas pesquisas, Federico Gutiérrez, que é o afilhado de Uribe. Mas, ao final, ficou de fora da disputa, em terceiro lugar, com 24% dos votos.

O favoritismo de Petro era calculado pelo bom desempenho das legendas de esquerda nas eleições legislativas em março desde ano, quando os partidos aproveitam para fazer consultas sobre os nomes de seus candidatos. Uma espécie de test drive eleitoral que mostrou que Petro e Francia Márquez, que veio a se tornar sua vice, eram uma chapa imbatível.

Mas um detalhe parece ter fugido aos cálculos do comitê socialista de Petro. O trauma das décadas de guerrilha e terrorismo empreendidos pelas Farc e a proximidade com a tragédia social e econômica da Venezuela de Nicolás Maduro podem estar na origem da explicação de um movimento inédito no país, onde o povo não faz muita questão de votar.

Na Colômbia, o voto não é obrigatório. Por essa razão, os índices de abstenção estão entre os maiores da América Latina. Em março, por exemplo, quando Petro se convenceu de que havia chegado a sua hora, menos de 46% dos eleitores aptos compareceram às seções eleitorais. O silêncio de 54% dos eleitores pouco importava. Um erro de cálculo que pode ter sido fatal para a candidatura de Petro.

O primeiro turno das eleições colombianas teve a mais alta taxa de participação eleitoral dos últimos 20 anos. A adesão do eleitorado chegou próximo a 55% e, possivelmente, trouxe consigo sentimentos que estavam sendo negligenciados tanto por Petro quanto pelo grupo uribista. Diante dos dois candidatos mais bem posicionados nas pesquisas, o eleitor resolveu aderir ao processo eleitoral ou por medo da venezuelização e o trauma da esquerda armada, ou por cansaço dos velhos políticos locais.

Hernández, que era o candidato sem chances, segundo as pesquisas, ganhou 28% dos votos, desbancou Federico Gutiérrez, com 24%, e se transformou no pesadelo de Petro no alto de seus 40% dos votos.

A questão é relativamente simples. Hernández tem potencial para atrair os votos de Gutiérrez e de outros candidatos, enquanto Petro parece ter batido no teto.

A saída para a candidatura de esquerda é apostar no desânimo dos eleitores (aumento das abstenções) ou no esforço brutal de tentar mostrar para aqueles eleitores que não saíram para votar no domingo passado que Hernández é tão ruim que é preciso um esforço coletivo para que a Colômbia seja administrada pelo candidato menos pior.

Hernández, que hoje tem as maiores chances de vitória, viu sua campanha acelerar nos últimos momentos antes da eleição e está no segundo turno sem conseguir mostrar o que é capaz de fazer, o que pensa e com quem vai governar.

O segundo turno na Colômbia será a disputa entre o atraso e a incerteza.

Bogotá recebeu uma série de delegações de brasileiros empolgados com a possibilidade de vitória de Petro. PT e PSOL se fizeram presentes e posaram de observadores eleitorais. Eles sonhavam em voltar para casa com um exemplo na bagagem que seria a sinalização de que o Brasil estaria, sim, no mesmo refluxo esquerdista que tem carreado muitos países da região.

As lições que vêm da Colômbia são outras. As sondagens eleitorais são instrumentos de referência, mas não são infalíveis. Elas mediram corretamente o tamanho de Petro, mas não foram capazes de ver a fotografia completa. Portanto, o que convenientemente se chama de “surpresa” é o que não foi visto por limitação ou erro.

A Colômbia nos ensina que qualquer movimento dentro da margem de abstenções pode mudar significativamente o quadro eleitoral. Em 2018, quase 21% dos eleitores não compareceram para votar. Qualquer movimento dentro deste universo tem potencial de criar agitação.

Por fim, o eleitor não é apenas idealista ou utilitário. Ele é acima de tudo pragmático e movido por sentimentos muito próprios de quem busca a sobrevivência. Tendo a acreditar que os colombianos se mexeram não foi para dizer sim para o seu candidato preferido, mas um enorme e sonoro não para os postulantes que eles querem longe da Casa de Nariño, a sede do governo da Colômbia.

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