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Peru - primeiro turno
Professor do ensino primário na zona rural do Peru, Castilllo usa o lápis e o chapéu como principais símbolos da campanha.| Foto: Divulgação de campanha/Facebook

Nada menos que 100% da cocaína produzida no planeta – o que inclui o crack – é refinada nas franjas do Brasil. Bolívia, Colômbia e Peru são os provedores globais da droga. A Bolívia é o caso mais explícito de como o tráfico não só é capaz de sequestrar as engrenagens econômicas como sequestrar a legitimidade do poder político. Por lá os traficantes sempre mantiveram uma relação mutualista com o Estado. A Bolívia foi o primeiro narcoestado do continente, por sinal. Fazendo jus ao conceito, por muito tempo, o dinheiro sujo proveniente da venda da droga irrigava campanhas, comprava apoio e influenciava o rumo do país.

Em 2006, quando Evo Morales chegou ao poder, a relação mudou. Líder máximo dos cocaleiros da região onde os cultivos são quase que exclusivamente destinados à produção de cocaína, Morales rompeu as barreiras e fundou o que defino como estado-narco. A subversão completa da já promíscua relação entre traficantes e políticos. No novo modelo adotado na Bolívia, o Estado é o agente do tráfico. Criando políticas voltadas ao incremento da produção de insumos e protagonizando a própria atividade. O Estado passou a agir como uma organização criminosa. A Venezuela já era assim e Cuba promovia tráfico estatal de cocaína desde os anos 80.

A Colômbia virou símbolo mundial da droga, sobretudo, depois que Pablo Escobar, o chefe do Cartel de Medellín, virou o mito que sobrevive até hoje. Escobar tentou ser presidente, inaugurou o conceito de cartel, fez alastrar a violência e chegou a ser sócio de Fidel Castro. Além de este currículo realmente denso, no fundo da Amazônia colombiana os guerrilheiros das Farc fizeram do tráfico uma das mais rentáveis fontes de subsistência. Subestimadas na sua relação com a produção da cocaína, a narcoguerrilha foi uma das principais forças de corrosão institucional da Colômbia.

Sócia de partidos brasileiros PT, PCdoB, PDT e PPS no mal-afamado Foro de São Paulo, as Farc têm em seu histórico as seguintes cifras: 24.842 sequestros, 3.900 assassinatos pontuais, 700 vítimas civis em confrontos, 854 ataques a povoados, 77 atentados terroristas, 343 massacres e 4.000 crianças recrutadas como soldados. Mas a companheirada sempre tolerou em nome da revolução.

O Peru chega às vésperas de mais uma eleição presidencial com um candidato com alegados vínculos com a guerrilha de orientação maoísta, o Sendero Luminoso. Pedro Castillo, que lidera as pesquisas de intenção de votos, é um professor de ensino médio, sindicalista e produtor rural. Símbolo de “novidade”, que tem atraído o voto passional dos peruanos que se sentem abandonados pelos políticos “de sempre” sobretudo em meio a pandemia.

O Peru é uma daquelas tragédias que quase ninguém presta atenção. É assim na pandemia e foi assim durante décadas de violência desmedida do Sendero Luminoso. Até os atentados de 11 de setembro de 2001, o Peru estava entro os lugares do planeta com o maior número de atentados terroristas e vítimas em todo planeta.

Aquele Sendero fundado por professores universitários que sonhavam em transformar o Peru em uma versão andina da China de Mao Tse Tung, foi varrido do mapa e no seu lugar restou (e ainda resta) uma autêntica combinação de drogas pesadas: traficantes com ideias comunistas.

Castillo nega os vínculos. Provavelmente ele será o novo presidente do Peru. Tudo indica que será uma replicação de que Morales foi para a Bolívia. Populismo étnico e overdose de bolivarianismo. Como o tráfico de drogas evoluirá e como o Estado se relacionará com o crime será o termômetro de quão similar serão.

O Sendero Luminoso está ouriçado. Tem enfrentado cada vez mais as forças militares nas áreas de cultivo de coca controladas por eles, sobretudo nos Vales do Rios Apurímac, Ene e Montano, também conhecido pelo acrônimo de VRAEM. Nomes esquisitos, mas que podem se tornar bem familiares no Brasil. A explosão do tráfico no Peru terá efeitos diretos no Brasil. O VRAEM produz folhas de coca não só para o refino da droga que o Peru envia para o Brasil pelos rios amazônicos.

Aquela região é uma espécie de offshore das organizações que operam na Bolívia em consórcio com o Estado. Exporta toneladas de folhas para reforçar a produção boliviana que é 100% destinada ao Brasil. O falecido Fidel ensinou seus discípulos que quando o tráfico tem ideologia é arma. Foi assim que Hugo Chávez transformou a Venezuela em um grande entreposto de cocaína. Foi por este caminho que a América Central se aprofundou na maior crise de segurança pública do hemisfério. O futuro Peru é uma grande incógnita. Ou será uma triste previsibilidade?

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