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As discussões sobre o futuro imediato das fontes de energia têm sido grandemente prejudicadas pela vasta difusão do equivocado conceito de transição energética, entendida como uma substituição acelerada dos combustíveis fósseis – petróleo, gás natural e carvão mineral – até meados do século, alegadamente, necessária para evitar o impacto das emissões de carbono sobre a dinâmica climática global.
Nesse cenário, a realidade dos fatos tem demonstrado que, ao contrário do que propõem militantes ambientalistas, políticos e lobistas engajados na disparatada agenda da “descarbonização” da matriz energética e da economia em geral, o carvão e os hidrocarbonetos deverão continuar servindo aos anseios de desenvolvimento e progresso da humanidade, em especial, das suas frações majoritárias mais pobres.
Não por acaso, as majors petroleiras internacionais estão expandindo ostensivamente os seus investimentos na prospecção e exploração de petróleo e gás natural, enquanto os reduzem discretamente em energias renováveis, como eólica e solar. Algumas, mais prescientes, casos da Equinor, ENI, Chevron e Shell, estão se voltando para a futurista energia de fusão, investindo em startups com projetos promissores na área. Iniciativas convergentes com a alternativa de se converterem gradativamente em empresas de energia, e não apenas de hidrocarbonetos, mas explorando fontes de densidades energéticas de ordens de grandeza superiores às ineficientes eólicas (offshore e terrestres) e solares.
Todavia, as possibilidades na área nuclear também se abrem no campo dos Pequenos Reatores Modulares (SMR, sigla em inglês), na faixa de até 300 megawatts (MW) de potência. Isto ficou evidenciado na recente feira Nuclear Trade & Technology Exchange (NT2E), promovida no Rio de Janeiro (RJ) no início de maio, pela Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN).
No evento, o engenheiro sênior do Centro de Pesquisas Leopoldo Américo Miguez de Mello (CENPES), Edgar Poiate, afirmou que a Petrobras está avaliando a possibilidade de emprego de SMRs como fontes energéticas em navios-plataformas (FPSO - Floating Production Storage and Offloading), embarcações que produzem, armazenam e transferem petróleo e gás natural. Segundo ele: “Já mapeamos e ranqueamos as tecnologias disponíveis, levando em conta o quando seria possível reduzir as emissões por barril de óleo produzido. Com as tecnologias atuais, já é possível reduzir cerca de 55% das emissões de CO₂ [dióxido de carbono]. No entanto, para atingir o chamado net zero, precisaremos incorporar novas tecnologias – e a energia nuclear aparece entre elas como um dos meios para alcançar essa meta (Petronotícias, 22/05/2025).”
Um FPSO tem uma demanda de eletricidade de 150 megawatts elétricos (MWe) e 40-80 MW térmicos (MWt). Atualmente, a alimentação dos navios é feita por turbinas a gás natural, mas os SMR poderiam representar uma alternativa viável.
A Petrobras avalia duas possibilidades para a utilização dos SMRs: embarcados e integrados no próprio FPSO ou instalados em uma embarcação específica para funcionar como centro de força (power hub), alimentando até três FPSOs.
No primeiro caso, a operação de troca de combustível do reator teria que ocorrer no próprio navio, uma vez que os FPSOs são projetados para permanecer em suas posições durante toda a sua vida útil. No segundo, o abastecimento de vários FPSOs implicaria no desafio adicional do emprego de cabos submarinos capazes de suportar cargas dinâmicas em ambientes de correnteza, ondas e ventos.
Uma hipótese ainda mais ousada seria a utilização submarina de microrreatores que operam na faixa de 3-5 MW. De acordo com Poiate: “Esses dispositivos poderiam alimentar diretamente equipamentos instalados no leito marinho, como bombas injetoras de água ou CO₂ supercrítico, compressores para reinjeção de gás, ou separadores submarinos óleo-água e gás-líquido. Dependendo da potência do SMR, seria possível atender a vários desses sistemas simultaneamente.”
Na NT2E, a empresa estadunidense Westinghouse Electric Company, projetista do microrreator eVince (5 MWe), assinou um acordo com a brasileira Constellation, visando a uma cooperação técnica com aplicações potenciais na indústria petrolífera.
Em uma iniciativa nacional, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) de São Paulo e o Instituto de Engenharia Nuclear (IEN) do Rio de Janeiro, órgãos técnicos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), apoiados pelas empresas Diamante Geração de Energia, Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e Terminus Pesquisa e Desenvolvimento em Energia, além de várias universidades, desenvolvem um projeto de três anos para validar a viabilidade técnica de um microrreator de 3 MW, capaz de operar por cerca de dez anos sem reabastecimento.
Em um setor historicamente prejudicado por prioridades e orçamentos reduzidos, a entrada da Petrobras na área nuclear, se concretizada, representa um importante potencial de alavancagem, além de um poderoso fator de disseminação de tecnologias de ponta em vários setores de atividades econômicas.
Ademais, tal diversificação tecnológica sinalizaria o caminho certo para uma futura empresa de energia, embora não no rumo proposto pelos cultores do ambientalismo desinformado.




