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Somente psicopatas comemoram a doença alheia
| Foto: Reprodução Twitter

A notícia de que Donald Trump pegou Covid-19 deixou em polvorosa a turma do “ódio do bem” e a extrema-imprensa. Pelo menos desta vez nenhum jornalista chegou ao ponto de escrever um artigo criminoso desejando abertamente a morte do presidente americano, como aconteceu quando Jair Bolsonaro ficou doente. Mas a satisfação foi evidente.

Mal escondendo a torcida abjeta pelo vírus, a mídia se apressou a criar uma narrativa esquizofrênica, que pode ser resumida assim: “Trump minimizou a gravidade da pandemia, logo Trump é um genocida que assassinou mais de 200.000 americanos, logo é bem feito que Trump tenha ficado doente”. Nas entrelinhas, o “tomara que morra!” é a conclusão evidente – reforçada pela mal disfarçada torcida por um “quadro de saúde mais grave”, sugerida em uma das manchetes sobre o assunto.

O mesmo silogismo torto é adotado, por ingenuidade ou má-fé, por todos aqueles que acusam Bolsonaro de ser o responsável direto pelas vítimas da Covid-19 no Brasil. Na cabeça dessas pessoas, o presidente é um genocida que deliberadamente assassinou ou deixou morrerem 140.000 brasileiros, por pura maldade ou raiva do povo brasileiro.

Felizmente, é só na cabeça dessas pessoas mesmo: nem que quisesse, Bolsonaro seria capaz de semelhante feito, já que – como parece necessário repetir à exaustão – o STF delegou aos governadores o poder de decisão sobre políticas de combate à disseminação do coronavírus.

Ora, no Brasil e nos Estados Unidos, qualquer debate intelectualmente honesto sobre a Covid-19 teria que partir das seguintes premissas:

1: Nem Trump nem Bolsonaro desejaram a morte de uma pessoa sequer ao longo da pandemia. O fato é que um e outro foram surpreendidos por uma tragédia imprevisível e de proporções inimagináveis; um e outro tomaram as medidas que julgaram as mais adequadas em cada momento, com base na evolução dos números e nas informações disponíveis.

Por exemplo, já no dia 4 de fevereiro, muito antes da primeira morte por Covid no Brasil, Bolsonaro decretou estado de emergência de saúde pública no território nacional; Trump, por sua vez, proibiu todos os voos da Europa para os Estados Unidos já em 11 de março: na ocasião, um e outro foram criticados pela esquerda, pelo caráter autoritário das medidas.

É claro que os dois presidentes fizeram suas apostas diante de escolhas difíceis e cometeram eventualmente erros de avaliação – como todos os gestores públicos em todos os países de todo o planeta, o que é natural em uma situação inédita como a que vivemos.

Mas que motivo Trump, eleito por mais de 62 milhões de votos, e Bolsonaro, eleito por mais de 54 milhões, teriam para comemorar uma só morte por Covid? Por que eles teriam ódio do povo que os elegeu? É tão absurdo acreditar nisso que chega a ser constrangedor, e no entanto é esta a convicção que norteia a narrativa da esquerda e de boa parte da mídia.

Nem Trump nem Bolsonaro desejaram a morte de uma pessoa sequer: por que eles teriam ódio do povo que os elegeu?

2: A preocupação dos dois presidentes com os efeitos (trágicos e incalculáveis) da paralisação radical da economia sobre a população, sobretudo sobre os mais desassistidos, era e continua sendo legítima. De novo, os dois presidentes tomaram medidas ousadas para mitigar os efeitos sociais da crise econômica.

No caso do Brasil, basta dizer que, graças ao programa emergencial adotado, a parcela da população abaixo da linha da pobreza diminuiu, em plena pandemia – tanto que a popularidade do presidente vem aumentando. A desigualdade decresceu. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, o auxílio emergencial reduziu a pobreza extrema ao menor nível em 40 anos.

Nesse con texto, acusar o governo de indiferença com os pobres só pode ser ignorância ou má-fé deliberada. O problema é que é mais fácil contabilizar – e manipular politicamente – as mortes diretamente provocadas pela Covid-19 que as mortes indiretamente provocadas pelo aumento do desemprego, da violência, de doenças que deixaram de ser tratadas, da depressão e outros distúrbios emocionais decorrentes de uma recessão prolongada e profunda.

Fato: não importa o que façam, Trump e Bolsonaro sempre serão objeto do ódio dos negacionistas de esquerda, que até hoje não assimilaram a vitorianas urnas dos dois presidentes. Para eles a agenda ideológica sempre prevalecerá sobre a verdade e sobre o interesse do povo brasileiro.

Mas, ainda que você abomine Bolsonaro e Trump, qualquer ataque que não considere as duas premissas apresentadas acima será mero (e inútil) exercício de ódio do bem.

Por outro lado, há que se considerar também a gravidade e a dimensão da tragédia, sem minimizar seu custo em sofrimento em vidas humanas. Sem esse consenso mínimo, toda e qualquer discussão sobre a Covid-19 continuará sendo um diálogo de surdos entre aqueles que acham que o presidente é um genocida e aqueles que têm a convicção de que ninguém morre de Covid. Normalmente essa convicção termina quando o vírus leva algum ente querido, mas aqueles que minimizam o vírus, pelo menos, não desejam nem a morte de ninguém.

Atenção! Eu, pessoalmente, defendi a quarentena e o uso de máscara como medidas necessárias para diminuir o ritmo do contágio (e, portanto, das mortes), desafogar os hospitais e achatar a curva, com o objetivo de ganhar tempo, enquanto não chega uma vacina ou uma medicação de eficácia comprovada. Obviamente, o isolamento social é apenas uma maneira de mitigar danos, porque quarentena e máscara não curam, apenas previnem. Mas alguém acredita sinceramente que o Brasil teria ficado imune à tragédia, que ninguém teria morrido de Covid se o presidente fosse de esquerda e tivesse imposto um lockdown radical no país? A Argentina foi por esse caminho e está pagando um preço elevado.

Ainda que em diversos momentos atitudes do presidente possam me irritar pelo mau exemplo, não serei irresponsável a ponto de jogar no seu colo a culpa pelas mortes, nem serei um psicopata a desejar que ele próprio morra ou fique gravemente doente.

Sim, “psicopata” é a palavra: porque somente psicopatas se comprazem com o sofrimento alheio ou torcem para que adversários – à esquerda ou à direita, na política ou fora dela – adoeçam e morram.

Mas não é apenas um sinal de deficiência de caráter e desvio moral desejar a morte de Bolsonaro ou Trump. É um erro estratégico no qual incorrem reiteradamente a mídia, a oposição em geral, a esquerda em particular e, mais particularmente ainda, os intelectuais (como os acadêmicos que adoram inventar neologismos como “necropolítica” e “r-existência”) e artistas (como o ator famoso que nesta semana lamentou em uma live que a facada de Adélio não tenha matado Bolsonaro).

Somente psicopatas se comprazem com o sofrimento alheio ou torcem para que adversários adoeçam e morram

Ou seja, teimar na narrativa enviesada que atribui ao presidente, nas linhas ou entrelinhas, a decisão deliberada de matar ou deixar morrer dezenas de milhares de brasileiros é apenas uma burrice.

Quanto mais esperneiam, mais a popularidade de Bolsonaro aumenta: segundo pesquisa divulgada nesta semana pelo DataPoder, o Governo Bolsonaro é aprovado por 52% e desaprovado por 42% dos brasileiros. “Ain, mas a popularidade dele aumentou por causa do auxílio emergencial”. Óbvio, da mesma forma que a popularidade de Lula, sobretudo no Nordeste, sempre esteve diretamente associada ao assistencialismo e ao Bolsa-Família. Mas não é só isso, como não era só isso no caso de Lula: o bolsonarismo e o lulismo têm raízes muito profundas.

Discurso terrorista algum vai convencer um eleitor sequer de Bolsonaro a deixar de apoiar o presidente. Mas, em vez de tentar entender o que acontece no Brasil real, a esquerda insiste em esbravejar, em tom de superioridade moral, seu discurso de ódio travestido de defesa da democracia. Enclausurada na bolha da mídia e da academia, ela prega apenas para os convertidos, apesar das evidências de que a narrativa de intolerância reversa não está convencendo ninguém. Ao contrário, pode estar até fortalecendo o presidente (e enfraquecendo a credibilidade da mídia, diga-se de passagem).

O mesmo erro pode estar sendo cometido pela oposição a Donald Trump, quando atribui a ele a responsabilidade pelas mortes por Covid-19 – e quando comemoram, abertamente ou nas entrelinhas, o fato de ele ter adoecido. Lá, segundo as pesquisas, a estratégia pode estar até funcionando, já que Joe Biden apresenta uma margem folgada nas intenções de voto na eleição que se aproxima. Mas basta lembrar o que diziam as pesquisas às vésperas da eleição americana de 2016 para olhar esses números com desconfiança – até porque Hillary Clinton era uma candidata muito mais forte que o sonolento e idoso Biden (que completará 78 anos em novembro).

Quando teve alta e saiu do hospital, Donald Trump postou no Twitter uma mensagem que incluía a seguinte frase: “Não deixe a Covid dominar sua vida”. Em tempos de polarização extrema, a frase também pode ser aplicada a outras formas de patologia – por exemplo, a paixão política que cega e emburrece. Então meu conselho é: não importa de que lado esteja, nunca deixe a paixão política dominar sua vida, pelo menos não a ponto de transformar você em um psicopata que deseja a doença e a morte de alguém.

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