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Uma breve história do Foro de São Paulo – Parte 1
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No dia 4 de julho do malfadado ano de 2020 – um verdadeiro annus horribilis – o Foro de São Paulo, organização que reúne mais de 100 partidos e organizações de esquerda da América Latina, completou 30 anos. A efeméride só foi registrada, praticamente, nos veículos autodenominados progressistas. Como a perseguição aos cristãos, assunto abordado no meu último artigo, o Foro é um tema estrategicamente ignorado pela grande mídia, como se fosse algo irrelevante, ou mesmo inexistente.

Estranhamente, o Foro de São Paulo também tem sido ignorado (e subestimado) pela direita conservadora – com raras e honrosas exceções, como o recente artigo do Rodrigo Constantino publicado aqui na “Gazeta”. No caso da direita, não se trata de uma estratégia deliberada, mas de um erro de avaliação, já que essa desatenção ao tema contribui para que a entidade continue operando “abaixo do radar”, de forma semiconfidencial, ausente da mídia e praticamente ignorada pelos brasileiros comuns.

Criado em 1990 por Lula e Fidel Castro, no contexto da queda do Muro de Berlim e da desintegração da União Soviética, o Foro de São Paulo foi anunciado na época como uma plataforma de resistência às políticas neoliberais que vinham sendo implementadas na região. Com o tempo, tornou-se um guarda-chuva que abriga representantes de sindicatos, associações comunitárias, grupos étnicos e ambientalistas e a esquerda cristã, o que é legítimo, mas também – como Olavo de Carvalho vem denunciando há mais de 20 anos – terroristas e narcotraficantes, associados à esquerda em um plano de conquista do poder total no continente.

Em um momento no qual, tirando proveito da crise provocada pela pandemia de Covid-19, a esquerda se reorganiza e ameaça voltar ao governo em alguns países da América Latina – começando pelo Equador, onde se realiza hoje o primeiro turno da eleição presidencial, tendo como favorito o candidato apoiado pelo ex-presidente Rafael Correa – convém fazer uma breve recapitulação da história do já balzaquiano Foro de São Paulo.

Essa história pode ser dividida em três períodos, mais ou menos correspondentes às três últimas décadas:

  1. Os primórdios, da fundação em 1990 à vitória de Hugo Chávez na eleição de 1998 na Venezuela;
  2. A consolidação, com o grande crescimento e os sucessos eleitorais dos partidos de esquerda entre 1998 e 2009, expansão financiada em parte com recursos do Estado venezuelano (e, provavelmente, também do Estado brasileiro);
  3. A crise, que, a partir de 2010, levou ao enfraquecimento da esquerda em diversos países, em função da péssima gestão e dos escândalos de corrupção em escala industrial – processo que, no Brasil, culminou com o impeachment de Dilma Rousseff em 2016, o breve Governo Temer e a subsequente eleição de Jair Bolsonaro em 2018.

A pandemia de Covid-19 pode representar o início de um quarto período, com a tentativa oportunista da esquerda de voltar ao poder explorando a tragédia humanitária, e não necessariamente por vias legais. Trataremos neste artigo do primeiro período do Foro de São Paulo, ficando o segundo e o terceiro para textos futuros.

O primeiro ciclo do Foro de São Paulo:

Em 1990, o fim da União Soviética, a extinção do comunismo nos países da Europa Oriental e a queda do Muro de Berlim pareciam ter enterrado definitivamente o projeto marxista, impressão reforçada pela publicação de “O fim da História e o último homem”, do cientista político americano Francis Fukuyama. A tese do livro era que a democracia liberal e capitalista estava consolidada e tendia a ser unanimemente reconhecida como o único regime capaz de dar conta dos desafios sociais e econômicos do planeta – algo que parecia estar sendo enfaticamente confirmado pelos acontecimentos. Não foi bem assim.

Essa atmosfera de excesso de otimismo contribuiu, na verdade, para que movimentos de esquerda na América Latina tivessem paz para reordenar suas tropas, atualizar sua agenda e reformular seus métodos. Foi nesse contexto que surgiu o projeto conjunto de Lula e Fidel de convocarem todos os seus aliados no continente para um seminário em São Paulo.

 <br /> <br /> <br /> <br /> <br /><br /> Já em sua primeira edição, o Foro de São Paulo reuniu representantes de 22 países






Já em sua primeira edição, o Foro de São Paulo reuniu representantes de 22 países

Já naquela primeira edição do Foro, compareceram representantes de 68 partidos e agremiações políticas de 22 países da América Latina e do Caribe, como a Frente Sandinista da Nicarágua e a Frente Farabundo Martí de El Salvador. A cerimônia de abertura do evento incluiu, vejam só, a leitura de uma carta de felicitações do então líder das Farc – Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, Pedro Antonio Marín, também conhecido, sugestivamente, como “Tiro fijo” (“Tiro certeiro”).

O Foro contava, ainda, com o apoio do MIR – Moviminento de Izquierda Revolucionário, partido radical do Chile responsável por vários sequestros de cunho político (incluindo o do empresário Abílio Diniz, em 1989, que o MIR classificaria mais tarde como um erro, por ter prejudicado o PT nas eleições, bem como dos partidos socialistas e/ou comunistas de todos os países do continente.

A Ata que resultou da primeira Assembleia inclui o trecho abaixo, revelador em seu malabarismo ao tentar conciliar o socialismo e a defesa da democracia, ao mesmo tempo em que tenta associar o capitalismo à miséria e à “opressão antidemocrática”:

“Manifestamos, portanto, nossa vontade comum de renovar o pensamento de esquerda e o socialismo, de reafirmar o seu caráter emancipador, corrigir concepções errôneas, superar toda expressão de burocratismo e toda ausência de uma verdadeira democracia social e de massas (...).

“Rejeitamos toda pretensão de aproveitar a crise da Europa Oriental para encorajar a restauração capitalista, anular suas conquistas e direitos sociais ou alentar ilusões nas inexistentes bondades do liberalismo e do capitalismo.

Nós, organizações políticas reunidas em São Paulo, encontramos um grande alento – para reafirmar nossas concepções e objetivos socialistas, anti-imperialistas e populares – no surgimento e desenvolvimento de vastas forças sociais, democráticas e populares no Continente que se opõem aos mandados do imperialismo e do capitalismo neoliberal, e à sua sequela de sofrimento, miséria, atraso e opressão antidemocrática. Essa realidade confirma a esquerda e o socialismo como alternativas necessárias e emergentes.”

Ainda mais reveladora é a descrição do evento no vídeo abaixo, postado no Youtube em fevereiro de 2016:

“O Foro de São Paulo é um órgão político-estratégico revolucionário que reúne partidos de esquerda, facções criminosas e grupos narcotraficantes. Criado por Lula e Fidel Castro nos anos 90 (e ocultado pela grande mídia por mais de uma década!), o Foro de São Paulo tem a sua estratégia comunista sintetizada no seguinte slogan: "Implantar na América Latina o que se perdeu no Leste Europeu"

Cabe observar que a decadência e o desmoronamento da União Soviética tinha provocado, além do desprestígio do projeto comunista, uma seca de recursos financeiros: sem o apoio financeiro de Moscou, Cuba, por exemplo, entrou em uma grave crise econômica, eufemisticamente chamada pelo governo de “período especial” (aliás, visitei Havana em 1990 e pude constatar em primeira mão os efeitos dessa crise na vida das pessoas comuns: censura, miséria e medo por toda parte, sem falar na explosão da prostituição).

Mas foi justamente naquele momento sombrio para o socialismo e o comunismo que alguém teve a grande sacada para o renascimento da esquerda – sacada cujos desdobramentos só se manifestaram de forma clara nos últimos anos: abandonar os conceitos e as bandeiras econômicas de cunho marxista (luta de classes, mais-valia, prevalência da infraestrutura sobre a superestrutura na determinação do destino dos indivíduos e das sociedades etc) e assumir um novo figurino: o da defesa de grupos indígenas e outras minorias e o discurso ambientalista. Como se fosse a direita liberal, e não as ditaduras comunistas, quem historicamente sempre perseguiu homossexuais, oprimiu as mulheres e proibiu minorias religiosas de professarem sua fé.

Sem que ninguém percebesse, estavam sendo lançadas as sementes da era da lacração que vivemos hoje: a guerra da esquerda não seria mais contra as elites econômicas – que, aliás, se tornariam grandes financiadoras dos movimentos progressistas, caso da Fundação Open Society, de George Soros, entre muitas outras; essa guerra passaria a ser travada no plano mais sutil e eficaz do ataque a valores e instituições: mudar a cabeça das pessoas, sobretudo por meio da doutrinação das crianças e jovens nas salas de aula, passou a ser a prioridade da agenda revolucionária. (Continua)

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