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Viagens de Lula para palestras pagas por empresas custaram R$ 1,1 milhão aos cofres públicos
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Em 27 viagens para fazer palestras contratadas por empresas privadas em 2011, Luiz Inácio Lula da Silva foi acompanhado por seguranças e assessores pagos pela Presidência da República. A despesa com passagens e diárias para esses servidores chegou a R$ 800 mil (valor atualizado pela inflação) – equivalente ao valor cobrado por palestra: U$ 200 mil. Vinte dessas viagens foram internacionais. Os maiores clientes eram empreiteiras envolvidas na operação Lava Jato.

Em algumas dessas viagens, havia também outros compromissos, como entrega de títulos e honrarias e visitas a chefes de Estado, como relatou reportagem do blog publicada no dia 19 de abril. Em outras, o objetivo era apenas as palestras, além de rápidos encontros com autoridades, lideranças políticas e intelectuais. Naquele ano, ele gastou R$ 1,44 milhão em viagens pelo mundo.

Considerando mais oito viagens feitas para realizar palestras em 2014, com despesas de R$ 295 mil para passagens e diárias dos assessores, o custo para a Presidência da República alcançou R$ 1,1 milhão. Esses direitos, incluindo mais os salários dos servidores e carros oficiais, estão previstos na Lei 7.474/1986.

Viagens de Lula pelo mundo

Na viagem para Lisboa, em setembro de 2011, Lula recebeu a medalha Leonardo Da Vinci, oferecida a personalidades que contribuíram para a educação na área da engenharia. Mas ele também fez a palestra “Saídas da crise: a experiência econômica brasileira”, paga pela empreiteira Camargo Corrêa. A viagem dos assessores do ex-presidente custou R$ 80 mil aos cofres públicos.

A viagem mais longa se estendeu por alguns países do Caribe – Nicarágua, Panamá, Bahamas, Cuba e Venezuela – de fins de maio a início de junho de 2011, organizada pela empresa Telos Empreendimentos. Essa viagem custou R$ 162 mil ao contribuinte entre diárias e passagens. Em Manágua (Nicarágua), Lula também esteve reunido com líderes de esquerda da América Latina e participou do XVII Foro de São Paulo. A palestra foi sobre “Os desafios da América Latina”, seguida de almoço com empresários.

Em Nassau, capital das Bahamas, a palestra “Desenvolvimento com inclusão social: a experiência brasileira”, foi paga pelo grupo mexicano Elektra. Executivo da empreiteira Odebrecht, Alexandrino Alencar, afirmou em inquérito da Polícia Federal que uma das palestras era para ter ocorrido na Venezuela, mas acabou sendo feita na Ilha de Comandatuba, em Uná (BA), com o título “Brasil e América Latina: Presente e futuro”. (Veja a relação das viagens e palestras abaixo)

No Brasil, os assessores pagos pela Presidência também acompanharam Lula em sete viagens onde ele fez palestras em 2011. O ex-presidente esteve em Mata de São João e Uná, na Bahia, em maio; em Curitiba, em julho; em Olinda (PE), em agosto; e em Porto Velho (RO) e Niterói (RJ), em setembro.

Os custos das viagens foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. As informações sobre as palestras, com os seus respectivos patrocinadores, foram obtidas no relatório de palestras publicado pela empresa LILS Palestras e Eventos, criada pelo ex-presidente Lula para administrar os convites que começou a receber para proferir palestras. Lula declarou ter feito 72 palestras empresariais pagas, para 45 empresas no Brasil e no mundo, de 2011 a 2015.

Como surgiram as palestras

No âmbito da sua delação premiada, Alexandrino afirmou que, concluído o mandato de Lula, em 2011, o grupo Odebrecht resolveu promover atividades com o ex-presidente “de modo que ele pudesse ter uma remuneração digna de um ex-chefe de Estado”. A forma de palestras seria a mais adequada “ao perfil carismático do ex-presidente”, acrescentou. Ele teria proposto uma sequência de palestras ao presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto.

O delegado que presidiu o inquérito, Dante Pegoraro Lemos, concluiu que não houve prática de crimes na contratação e pagamento dessas palestras. Mas acrescentou: “Fica ressalvado que apurações específicas, existentes ou futuras, possam vir a demonstrar a configuração de crime”.

Os depoimentos reportados no inquérito explicam o interesse da Odebrecht na contratação de Lula para as palestras. Alexandrino afirmou que Lula era um “cartão de visitas muito importante” para o presidente do país, percebendo relação diferenciada com o grupo. Ele citou que, certa vez em Angola, a partir da notícia de que Lula iria ao país, 20 dias antes a administração de Angola teria liberado o pagamento de algumas faturas que estavam sendo “procrastinadas, apenas para criar um clima positivo”.

A estratégia inicial

O executivo revelou outra estratégia da empresa. Disse que havia inicialmente uma preocupação em não aparecer o nome da Odebrecht como contratante, ou mesmos durante os eventos. Esse intuito seria para “não gerar uma imagem de arrogância ou superioridade nas comunidades locais, de forma a facilitar a integração do grupo na comunidade”.

A empresa preferia que a organizadora do evento fosse um sindicato, um instituto ou associação. Como exemplo citou a palestra em Angola, contratada pelo Centro de Estudos Estratégicos de Angola, em parceria com a Odebrecht. A viagem à Angola custou R$ 47 mil à Presidência. A palestra dada por Lula teve o título “O Desenvolvimento do Brasil modelo possível para África”.

Como mostrou reportagem publicada pelo blog em 2017, Angola recebeu investimentos de R$ 4 bilhões do BNDES para grandes obras a partir de 2007, sendo R$ 3,1 bilhões por intermédio da Odebrecht. Só a construção da hidrelétrica de Lauca consumiu R$ 646 milhões.

A construção do aeroporto internacional de Catumbela, também tocada pela Odebrecht, custou R$ 110 milhões. A empreiteira tocou ainda o programa de saneamento básico para Luanda, no valor de R$ 145 milhões, e construiu 3 mil unidades habitacionais, além de implantar a infraestrutura para outras 20 mil unidades, ao custo total de R$ 281 milhões.

Os benefícios do grupo

No depoimento à Polícia Federal, Alexandrino solicitado a explicar quais os benefícios do grupo com o modelo das palestras. O executivo citou como exemplo a palestra do Panamá em 2011, onde visitaram duas obras da Odebrecht, seguida de uma palestra a empresários e jantar, ambos com a presença do Presidente Martinelli, pessoas formadoras de opinião. Era estratégia do grupo expandir os negócios de engenharia para outros países.

Segundo a Polícia Federal, outro colaborador da Odebrecht, João Carlos Mariz Nogueira, trouxe indicativos de que as remunerações de palestras possivelmente não se restringiam apenas aos serviços de “palestras”, mas também a atuações diretas do ex-presidente Lula para influenciar governos estrangeiros e a então Presidente da República Dilma Roussef a praticar atos administrativos em benefício da empreiteira. (Veja documento abaixo)

Depois de narrar a ação de Lula, o inquérito registra que, apesar do empenho do ex-presidente, o financiamento não foi aprovado porque o governo de Cuba, posteriormente, recuou da ideia de oferecer como garantia eventual fluxo financeiro obtido com a venda de nafta petroquímica qualquer outra alternativa apresentada, insistindo no oferecimento de garantidas soberanas. A viagem de Lula a Havana, em fevereiro de 2014, custou R$ 30 mil à Presidência da República em diárias e passagens para assessores do ex-presidente.

Após análise da movimentação bancária da empresa LILS Palestras e Eventos, a Polícia Federal constatou que a empresa recebeu transferências num total de R$ 28 milhões. Laudo pericial demonstra que a Odebrecht transferiu aproximadamente 10% das origens de recursos da empresa de Lula. As quatro maiores fontes de recursos da LILS são, além da Odebrecht, as construtoras Andrade Gutierrez, Camargo Correa e OAS, que juntas participam com aproximadamente 30 % do total transferido.

A reportagem publicada no blog em 2017 mostrou que, com a ajuda do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato conseguiram R$ 13,6 bilhões para tocar obras em países da África e da América Latina durante os governos petistas. Isso representa 93% do total financiado pelo banco estatal para exportação de bens e serviços. A Odebrecht ficou com 64% do total. As informações foram obtidas pelo blog na base de dados do BNDES.

Outro lado

O blog enviou à assessoria de Lula dados sobre as viagens do ex-presidente e questionou se seria correto levar assessores pagos pela Presidência em viagens para palestras pagas por empresas privadas. Também questionou o ex-presidente sobre os relatos dos diretores da Odebrecht sobre a sua suposta ação como lobista em países da África e América Latina. Não houve resposta.

Onde Lula fez palestras

Confira a lista de cidades e datas em que Lula teve eventos. As informações são da LILS Palestras e Eventos:

<strong>Local</strong><strong>Data</strong>
Washington6 de abril
Acapulco (México)8 de abril
Londres14 de abril
São João da Mata (BA)12 de maio
Uná (BA)18 de maio
Cidade do Panamá20 de maio
Nassau (Bahamas)31 de maio
Caracas (Venezuela)2 de junho
Cidade do México21 de junho
Luanda (Angola)1 de julho
Curitiba (PR)27 de julho
Bogotá (Colômbia)6 de agosto
Olinda (PE)8 de agosto
Santa Cruz de la Sierra (Bolívia)30 de agosto
El Salvador (San Salvador)31 de agosto
San Jose (Costa Rica)31 de agosto
Lisboa6 de setembro
Porto Velho (RO)14 de setembro
Niterói (RJ)19 de setembro
Salvador( BA)20 de setembro
Washington24 de setembro
Londres29 de setembro
Nova York6 de outubro
Madri18 de outubro
Madri20 de outubro
Querétado (México)25 de outubro
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