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O apagão da imprensa
| Foto: Alberto Sanchez/Pixabay

Você sabe quais são os critérios que deveriam ser usados para determinar o que é notícia e o que não é? E, na hora de definir como uma história real será contada, o que deve ser levado em conta? E o espaço que essa história vai ocupar? Primeira página? Manchete em letras garrafais? Uma notinha? Metade de uma edição do principal telejornal do país? Ou uma reportagem curta, de um minuto e meio? Com essas questões em mente, uma rápida olhada nos principais veículos de informação do Brasil vai nos levar, inevitavelmente, a uma conclusão desesperadora: o que chamávamos de imprensa, agora, está ao lado de quem tem empurrado o Brasil para o precipício.

As joias, as joias do Bolsonaro... Praticamente, só se fala nisso. O que pergunto é: o espaço dedicado ao assunto não é exagerado? Esta deve ser mesmo a pauta principal? Não estou dizendo que o assunto não deva virar notícia, mas onde estão as perguntas fundamentais, necessárias, inescapáveis? Pesca probatória deve ser admitida? Prisões ilegais? Inquéritos que servem a tudo o que for do interesse de quem está no poder também? Apodrece a imprensa que publica coisas assim: “Embora seja necessária apuração maior, os investigadores afirmam não ter dúvida do envolvimento de Bolsonaro”. Exala mau cheiro o jornalismo morto, quando aceita que o ministro da Justiça anuncie sentença sobre caso ainda em “investigação” e defina quando deve ser a hora de prender o criminoso escolhido a dedo.

O país está entregue ao caos total. Está no escuro, no breu. Se o jornalismo não tivesse morrido, se pudesse ressuscitar, mas como?

Apurar, investigar, desde que dentro da lei, não tem problema algum. Fizeram isso com Lula? Os 11 contêineres que levou do Alvorada, as 23 caixas com joias e obras de arte, incluindo o crucifixo que havia desparecido do Planalto, o relógio que recebeu do presidente da França em 2005, isso tudo já está regularizado... Lula pode tudo. A ele todas as facilidades, a ele tudo de bom é garantido. Se ele faz uso político da Petrobras, a imprensa compreende. Se, com ele, os preços dos combustíveis sobem ou descem, é sempre bom. No governo Bolsonaro, se os preços dos combustíveis subiam, era ruim. Quando caíam, também era ruim. A inflação, com Bolsonaro, era uma desgraça universal. Com Lula, a imprensa cria a “inflação seletiva”, que só existe para os mais ricos.

A imprensa destruiu o debate público, o debate que realmente importa. Afastou-se das perguntas, da desconfiança, da dúvida. Afastou-se da verdade e, portanto, da liberdade. O que deveria ocupar os jornais, as revistas, os canais de televisão e de rádio, os portais de notícias, tudo isso passa a ser secundário, passa a ser desconsiderado, descartado. E Lula pode relançar, sem questionamentos sérios, o velho PAC, com quase 3 mil obras que as gestões petistas anteriores não concluíram. De novo, ele aposta no que não tem como dar certo, o “Estado indutor”, usando estatais e bancos públicos. De novo, ele aposta na contabilidade criativa... E ainda veta vários pontos do projeto aprovado no Congresso que facilitaria a vida dos pagadores de impostos. A imprensa não está nem aí para o crescimento do país. Déficit primário disparando, as dívidas se multiplicando, a inflação atacando, nada disso é pauta.

O importante agora é invisível. A bolsa de valores tem uma série histórica de quedas seguidas, os investidores estrangeiros saem em massa do país, e a imprensa finge que não vê. O ministro da Casa Civil pode se esforçar para recuperar as empreiteiras envolvidas na Lava Jato. Lula e a imprensa decidiram que o problema não é a corrupção, é o combate a ela. Estão aplaudindo o procurador do MPF que reduziu em quase R$ 7 bilhões a multa da J&F estabelecida em acordo de leniência... Decisiva para o país é a “investigação” sobre as joias do Bolsonaro.

Fundamental também é não investigar aquilo que pode atingir Lula, o PT, seus aliados... Enterre-se a CPMI do 8 de Janeiro, mesmo que em depoimento tenham revelado que naquele dia a Força Nacional de Segurança estava no Ministério da Justiça e não entrou em ação, 150 homens inertes... Flávio Dino pode esconder à vontade as imagens das câmeras do Palácio da Justiça. A imprensa não tem interesse por elas, também não quer saber da CPI do MST. As provas de que dinheiro dos pagadores de impostos financiou crimes do grupo podem ser destruídas. O Centrão está nessa com Lula, em troca de mais emendas parlamentares, ministérios, talvez mais duas pastas possam ser criadas, já que temos tão poucas, apenas 37.

Os maus se juntaram. Quem quer dinheiro? A imprensa do Lula já garantiu uma boa verba em publicidade estatal. Agora vão jorrar mais R$ 200 milhões para turbinar as redes sociais do petista. Quatro empresas devem ser contratadas para cuidar da imagem do governo na internet. O show de mentiras e disparates está autorizado. E Lula, o Centrão e a imprensa velha e velhaca defendem a censura. Ai de quem usar a verdade contra eles. A ditadura é assim, tão linda. O importante são eles, o que eles pensam, o que eles dizem. O resto é o resto e deve ser extirpado. É o país entregue ao caos total. É o país no escuro, no breu. Se o jornalismo não tivesse morrido, se pudesse ressuscitar, mas como? Não, não há energia comprada da Venezuela que possa dar fim ao apagão da imprensa.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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