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O lema de São Paulo é “Não sou conduzido, conduzo”, mas pelo que testemunhamos nesta semana, o estado está à mercê das oligarquias de outros, e é objeto de traição por parte de alguns de seus próprios representantes.
O aumento do número de deputados, de 513 para 531, vai beneficiar os estados do Pará, Santa Catarina, Amazonas, Mato Grosso, Rio Grande do Norte, Paraná, Ceará, Goiás e Minas Gerais. A priori, sou contra o aumento de deputados federais para qualquer estado, mas deve-se reconhecer a desvantagem histórica de São Paulo, sub-representado há décadas.
Paulistas estão sendo roubados
A aprovação desse projeto na Câmara, que ainda vai ao Senado, gerou revolta porque São Paulo detém 22% da população brasileira e apenas 13% dos deputados. Se for levar em consideração a arrecadação, o estado é responsável por 35% de tributos federais.
A baixa representação produz um efeito nefasto para todos os entes federativos. Recursos arrecadados aqui são direcionados a outros estados não só sob a forma de emendas parlamentares diretamente, mas também na votação de leis de diretrizes orçamentárias, em um estatuto enviesado que prejudica o nosso estado.
Para piorar essa conta, São Paulo recebe de volta apenas 10% do que manda em impostos ao Governo Federal, enquanto muitos estados sobre representados do Nordeste recebem o dobro ou o triplo em repasses federais, enviando muito menos.
É nítida essa distorção e esse desvio de Brasília, que está institucionalizando o roubo sistemático de São Paulo
É evidente também que o poder central não quer ver o estado ser bem representado e dono de seus próprios recursos. A política federal é clara: São Paulo produz e Brasília desvia.
Projeto contra o Brasil
O projeto aprovado sem o devido debate agrava essa situação. São Paulo vira um pagador sem ter praticamente nenhum tipo de alavancagem de representação que possa lhe dar poder de barganha para garantir um mínimo comensurável de retorno daquilo que contribui.
Falacioso e mal-planejado, o processo também segue totalmente errado. A princípio, deveria ter sido criada uma comissão especial para rever a questão da representação. Na nossa opinião e de qualquer cientista político, deve valer o conceito “um eleitor, um voto”. É isso o que a Câmara precisa representar. O Senado já tem representação equânime entre os entes da federação, e a Câmara deveria ser a casa que obedece à proporcionalidade, o que não aconteceu.
Para obedecer à proporcionalidade que consta na Constituição, São Paulo precisaria ter, no mínimo, 120 a 140 cadeiras. O número de parlamentares de cada estado, até por uma questão lógica, deve refletir onde está a população.
O cenário em alguns estados é praticamente de depopulação, bem possível em vista da reforma tributária e de uma série de movimentos econômicos. Observamos uma concentração de empresas, negócios e pessoas em estados com mais estrutura e economia mais diversificada. Em uma projeção futura, devemos questionar: por que fixar representação onde as pessoas não vivem?
O cidadão de São Paulo vale 10 vezes menos
Por isso devemos obedecer a um modelo razoável: onde está o eleitor, é um voto. Não tem cabimento o eleitor de São Paulo valer 10 vezes menos do que outro, de 10 estados menores, cujos deputados foram eleitos com menos votos que qualquer vereador de pequena ou média cidade de São Paulo.
Essas distorções são muito graves. Ademais, para fazer qualquer cálculo de proporcionalidade, está se considerando que nos demais estados a diversidade sócio-econômica é similar à de São Paulo.
O resultado desses equívocos é que muitos dos representantes que vêm de rincões do Brasil estão completamente despreparados para o cargo, tecem opiniões e votam temas por eles ignorados: o que sabem muitos deles sobre mercado consumidor pujante, indústria, de fato funcionando ou agronegócio, por exemplo? Nada.
Há economias de estados que são muito mais subsidiários do governo federal, péssimo para o país, pois o lado produtivo está sendo completamente destruído por esses parlamentares que não fazem a mínima ideia do que estão votando e até levam São Paulo a ter desinteresse de investimento.
O risco Brasil está inteiramente nessa postura do governo e dos estados e políticos alinhados a ele. Deixar para o Congresso decidir sua dimensão sempre resultará em um número de membros crescente, mas a realidade demográfica é implacável.
Com população estável e natalidade decrescente, teríamos que pensar o contrário, em diminuir o número de deputados, um redimensionamento que deveria ser conduzido por comissão especial e emenda constitucional, e não da maneira atabalhoada e obscura, como foi.
A Constituição, velha vilã
Pela Constituição de 88, o número mínimo de deputados federais por estado é 8, o máximo é 70. Essa trava comprova que o texto está ultrapassado, pois não levou em consideração as dinâmicas futuras do Brasil e do mundo.
Essa distorção deve ser revista por pelo menos duas propostas de emendas constitucionais (PECs), que já estão em curso para assinaturas. É curioso observar que essas propostas não dependem de ideologia para aprovação, é questão de proporcionalidade, então estamos otimistas que obtenham sucesso na Câmara.
A maior parte da bancada paulista concorda que esse processo é o mais correto, entretanto, fiquei surpreso de ver deputados de outros estados se alinharem com São Paulo, sensíveis à questão da representatividade e da necessidade de nosso estado.
Diversos colegas da Câmara rejeitaram o projeto em plenário, dando exemplo de lucidez e espírito de justiça. Muito diferente foi a atitude de 14 deputados eleitos por São Paulo, que votaram favoravelmente para o aumento de deputados de outros estados. Provavelmente foram orientados pelas lideranças a fazê-lo, e esperamos que se arrependam em futuro próximo.
São Paulo vale pouco na Câmara
São Paulo já está sub-representado há mais de 30 anos, e os mais de 80% de parlamentares de outros estados podem dispor sempre de mais recursos, em detrimento, principalmente, de vários pequenos municípios do estado de São Paulo.
Independentemente de seus orçamentos, as cidades estão sempre sem dinheiro para garantir o básico para a manutenção de sua estrutura. Por quanto tempo essa situação se sustentará, agora que a representação do estado vai deteriorar ainda mais?
O cidadão paulista precisa se erguer e tomar uma posição firme, assim como os vereadores e os prefeitos, contra essa medida absurda, pois aqui se gera o recurso de imposto pago a Brasília, para que a administração centralizada e pouco transparente o distribua a vários estados, muitos deles que não merecem o suor do povo trabalhador de São Paulo. Contemplados pelos nossos impostos, são geridos por corruptos, meros representantes de oligarquias.
O governador Tarcísio de Freitas também precisa se posicionar em defesa do nosso estado e de seus representantes na Câmara. A bancada paulista deve estar muito bem alinhada na proposição de projetos e na reação aos desmandos, como fazem as de alguns outros estados que sabem muito bem trabalhar em equipe para extorquir São Paulo, mantendo as coisas como estão e até sugando ainda mais o nosso sangue. Pior para o Brasil.
Conteúdo editado por: Aline Menezes




