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A morte do papa Francisco, em 21 de abril, forçou o adiamento de uma das canonizações mais aguardadas de 2025: a do bem-aventurado Carlo Acutis, que estava marcada para 27 de abril – os peregrinos que tinham ida marcada para Roma e não cancelaram a viagem acabaram presenciando os funerais do papa falecido, realizados no dia 26. Mas agora temos uma nova data: na última sexta-feira, o papa Leão XIV realizou seu primeiro consistório ordinário, em que o pontífice e os cardeais discutem causas de canonização, e o dia 7 de setembro foi escolhido como o novo dia da canonização de Acutis. Junto com ele, será declarado santo outro bem-aventurado que também serve de modelo para os jovens: Pier Giorgio Frassati, que morreu de poliomielite aos 24 anos, em 1925 – e que originalmente seria canonizado em 3 de agosto, durante o Jubileu dos Jovens.
Conheci a história de Frassati em 2006, quando estive em Turim para participar dos Jogos Olímpicos de Inverno (alguns leitores devem saber que Jogos Olímpicos são uma das minhas paixões, e mantive por um tempo uma coluna sobre o assunto no Um Dois Esportes). Fui visitar a catedral da cidade para ver ao menos o lugar onde está guardado o Santo Sudário – jamais perdoarei o arcebispo por não ter aproveitado a ocasião para uma exibição pública – e lá havia uma exposição sobre Frassati, que está sepultado na catedral.
Pier Giorgio nasceu em uma família de classe alta – seu pai fora senador, embaixador e era o dono do jornal La Stampa, o maior da região; sua mãe era uma artista cujo trabalho tinha sido reconhecido até pelo rei da Itália. Frassati era um jovem comum do seu tempo, amante de esportes – especialmente o montanhismo – e piadista inveterado, mas muito mais que isso: era um católico de profundo amor pelos pobres, inspirado justamente na Doutrina Social da Igreja, proposta por Leão XIII, que inspirou a escolha do nome do atual papa.
Canonizando Acutis e Frassati no mesmo dia, a Igreja oferecerá aos adolescentes e jovens de todo o mundo não um, mas dois modelos de santidade
Membro da Ordem Terceira dominicana, dos vicentinos, do Apostolado da Oração e da Ação Católica, Frassati não hesitava em usar a sua parte dos recursos da família para ajudar os pobres, mas não parou aí. Ele se formou em Engenharia porque pretendia evangelizar os trabalhadores das minas, empenhou-se em fomentar organizações populares e de operários como forma de combater a pobreza e a desigualdade, e foi um forte adversário do nascente fascismo, a ponto de ter sido preso durante um protesto contra Mussolini em 1921, quando o fascismo já era uma força política notável, embora ainda não tivesse chegado ao poder. Seu funeral teve a presença de milhares de pessoas pobres que Frassati havia ajudado, e também foram os pobres de Turim que pressionaram pelo início do processo de canonização do jovem.
São João Paulo II beatificou Frassati em 1990, mas antes disso ele já havia falado do jovem piemontês em algumas ocasiões: durante sua visita de 1980 a Turim, o papa o propôs como exemplo para os jovens. Em 1989, em uma visita a Pollone, terra natal dos antepassados de Frassati, o pontífice disse que desde a sua juventude o exemplo de Frassati o havia tocado. Na homilia de beatificação, o papa o chamou de “homem das bem-aventuranças” e afirmou:
“O segredo do seu zelo apostólico de sua santidade deve ser buscado no itinerário ascético e espiritual percorrido por ele. Na oração, na adoração perseverante – inclusive à noite – do Santíssimo Sacramento, na sua sede pela palavra de Deus, buscada nos textos bíblicos, na sua aceitação serena das dificuldades da vida, inclusive familiar, na castidade vivida como disciplina alegre e sem concessões, na preferência cotidiana pelo silêncio e pela ‘normalidade’ da existência. (...)
À primeira vista, o estilo de Pier Giorgio, um jovem moderno cheio de vida, não parece ter nada de extraordinário. Mas é justamente essa a originalidade de sua virtude, que convida a refletir e que desperta o desejo de imitá-lo. Nele, a fé e os acontecimentos cotidianos se fundem harmonicamente, a ponto de a adesão ao Evangelho se traduzir na atenção amorosa aos pobres e necessitados, em um crescendo contínuo que vai até os últimos dias da doença que o levará à morte. O gosto pelo belo e pela arte, a paixão pelo esporte e pela montanha, a atenção aos problemas da sociedade não o impediram de ter um relacionamento constante com o Absoluto.”
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E, no recente Jubileu dos Esportistas, Leão XIV falou de Frassati, que será declarado também padroeiro dos atletas:
“Pensemos no Beato Pier Giorgio Frassati, padroeiro dos desportistas, que será proclamado santo no próximo dia 7 de setembro. A sua vida, simples e luminosa, recorda-nos que assim como ninguém nasce campeão, ninguém nasce santo. É o treinamento diário do amor que nos aproxima da vitória definitiva e nos torna capazes de trabalhar pela construção de um mundo novo.”
Achei uma ótima escolha unificar as datas de canonização de Frassati e Acutis. No mesmo dia, a Igreja oferecerá aos adolescentes e jovens de todo o mundo não um, mas dois modelos de santidade. Com quase um século de intervalo entre eles, ambos foram movidos pelo amor à Eucaristia, que levou um a se dedicar aos pobres e excluídos, e outro a usar os novos meios de comunicação para levar Jesus ao máximo possível de pessoas. Precisamos muito de mais jovens como eles, que se dediquem a esses caminhos por amor a Deus e ao próximo.
Arquidiocese do Rio desaconselha fiéis a participar de eventos do Centro Dom Bosco
Em nota publicada ontem, e assinada pelo monsenhor André Sampaio, delegado episcopal para o atendimento aos fiéis tradicionalistas (e que o leitor da coluna conheceu durante o conclave), a Arquidiocese do Rio de Janeiro esclareceu os fiéis sobre as atividades recentes do Centro Dom Bosco, especialmente a publicação do livro Os erros do catecismo moderno e a realização do Fórum Nacional da Liga Cristo Rei, em agosto. Sobre o livro não pretendo dizer muito; tem muita gente boa aí, como o padre José Eduardo e canais como o Católicos de Verdade, e Educar para o Céu, mostrando como essa obra é problemática. Nem a nota da arquidiocese se detém muito nisso, limitando-se a lembrar que a edição original em inglês tem prefácio assinado por um excomungado, o arcebispo Carlo Maria Viganò.
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O que a arquidiocese mais faz questão de ressaltar, porque é mesmo o problema principal, é a aproximação entre o Centro Dom Bosco e a Fraternidade Sacerdotal São Pio X (SSPX), grupo tradicionalista sem situação canônica regular na Igreja e conhecido por suas posturas rebeldes. Por isso, diz a nota, “os fiéis católicos devem abster-se de participar das atividades promovidas por tal Fraternidade ou por associações jurídica ou espiritualmente a ela vinculadas, como é o caso agora do Centro Dom Bosco, que se autodeclarou sob a direção da Fraternidade e de ministros que a ela pertencem ou a suas comunidades amigas”. E monsenhor André finaliza dizendo que “os fiéis vinculados a tal rito têm à disposição, na Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, templos designados para celebração de forma estável, sob guia segura de sacerdotes legitimamente autorizados para esse fim que estão em situação canônica plenamente regular e que poderão também ofertar a formação doutrinária e espiritual devida”.
Exatamente: como eu já disse por ocasião de minha primeira coluna sobre os padres Françoá Costa e Wander Maia, os católicos que preferem a liturgia tradicional têm várias opções que estão em perfeita comunhão com a Igreja; ninguém precisa abraçar a rebelião da SSPX. No caso do Rio, especificamente, há quatro igrejas com missa tridentina dominical (Traditionis custodes jamais afirmou que precisava ser apenas uma igreja ou capela por diocese), bem distribuídas geograficamente no território da arquidiocese. Opção não falta, mostrando que o Rio entendeu algo que infelizmente nem todos os bispos entenderam ainda: por mais que não haja nenhuma justificativa decente para um católico ir parar na SSPX, o bispo que reprime os bons fiéis tradicionalistas – aqueles que só querem assistir à missa tridentina em paz, sem birra nem com o Novus Ordo, nem com o Vaticano II, nem com o Catecismo de São João Paulo II – acaba facilitando a vida dos rebeldes.











