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Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo
Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo| Foto:

“Nenhum princípio da Constituição é absoluto”, sapecou o procurador da República e coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, durante o Congresso de Direito Constitucional realizado na última sexta-feira. As sensações que o procurador tem alimentado, acima de tudo desde o início do governo Jair Bolsonaro, não deixam de ser intrigantes: causam arrepios em todos aqueles com um mínimo de espírito democrático, entretanto merecem ser celebradas por desnudarem uma natureza tão tirana quanto fundamentalista.

A fala de Dallagnol, se interpretada com boa vontade, não configura ameaça à Carta. Para concordar com essa tese, basta ignorar a menção do termo “princípio”, algo que sugeriria um debate mais profundo. Além disso, de fato, a Constituição pode ser modificada.

Contudo, tratando-se do procurador, do ministro da Justiça Sérgio Moro e dos demais paladinos da moralidade, que desde os idos de 2013 se outorgaram a missão divina de higienizar Pindorama, premissas incontornáveis pedem passagem.

Alterar a Constituição Federal, por exemplo, é mesmo possível. Há inclusive um instituto para isso, cujo nome, assaz autoexplicativo, deveria esmorecer atrevimentos: Emenda Constitucional.

O problema é que, por meio de ações, pronunciamentos e conversas escabrosas em grupos de aplicativos, já está claro, nenhum desses representantes ungidos pelo fervor político-eleitoral está preocupado com o respeito às regras. Baliza até existe, apenas não está escrita em qualquer documento e tampouco pode prevalecer em ambientes democráticos. Trata-se, como as evidências deixam claro, na teoria de que os fins justificam os meios.

Desgraçadamente, nos dias atuais, em que o simples ato de ponderar ganha contorno de afronta, o populismo autoritário exercido por figuras como Dallagnol e Moro não é apenas tolerado, mas recebido com loas pela sociedade.

Não se trata aqui — pinçando o exemplo inevitável — de levantar a tese da inocência de Lula. As provas que conduziram o ex-presidente à cadeia são robustas e foram analisadas em três instâncias. Não há de ser à toa, diga-se, que, para além do caso do Triplex no Guarujá, o líder petista já foi condenado em primeira instância no do sítio em Atibaia e é réu em outros sete processos.

Apenas não cabe fechar os olhos para o fato de que, em última análise, assim como fez Luiz Inácio, essa leva de pessoas claramente imbuída de um discurso messiânico ludibriou e ainda ludibria a população, traindo a sua confiança.

Vale dizer, a única possibilidade de Dallagnol e demais procuradores alçados ao patamar de ídolos se mostrarem tímidos na hora de emitir pronunciamentos é verem as benesses e o lauto salário que suas carreiras proporcionam sob os holofotes.

Durante o mesmo Congresso, o procurador-Padim Ciço também afirmou que “a prisão após a condenação em segunda instância é algo salutar” e sorrateiramente celebrou o fato de o decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, se aposentar em 2020. É que isso, em tese, favoreceria a prisão após condenação em segunda instância.

Salutar mesmo, mais do que qualquer mudança constitucional — desde que conduzida com observância às regras do jogo —, é o descaramento do procurador para forçar sua visão de mundo ameaçadora para quem é adepto da ordem democrática.

Quem sabe assim sua aura de herói perde o viço.

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