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Pegada forte do começo ao fim é o que se pode esperar do show que Lobão apresenta neste sábado, 18 de agosto, na Ópera de Arame. O nome da turnê já meio que dá a dica do que vem por aí, “Antologia Politicamente Incorreta dos Anos 80 pelo Rock”. Lobão vem acompanhado da banda Os Eremitas da Montanha e apresenta um setlist totalmente baseado em seu álbum de mesmo nome.

Posso dizer que as músicas escolhidas por Lobão talvez fossem também as escolhidas por qualquer um que tenha vivido o Rock Brasil dos anos 80, ou seja, apenas clássicos do rock brazuca. Dá uma olhada na setlist:

“Orra Meu” (Rita Lee), “Planeta Água” (Guilherme Arantes), “Vítima do Amor” (Blitz), “Nosso Louco Amor” (Gang 90), “Certas Coisas” (Lulu Santos), “Eu Não Matei Joana d’Arc” (Camisa de Vênus), “Geração Coca-Cola” (Legião Urbana), “Primeiros Erros” (Kiko Zambianchi), “Leve Desespero” (Capital Inicial), “Louras Geladas” (RPM), “Nós Vamos Invadir Sua Praia” (Ultraje a Rigor),  “Núcleo Base” (Ira!), “Até Quando Esperar” (Plebe Rude), “Dias de Luta” (Ira!), “Toda Forma de Poder” (Engenheiros do Hawaii), “Pânico em SP” (Inocentes), “Eu Sei” (Legião), “Vida Bandida” (Lobão),  “Virgem” (Marina Lima), “Esfinge de Estilhaços” (Lobão), “Quase um Segundo” (Paralamas do Sucesso), “Somos Quem Podemos Ser” (Engenheiros), “O Tempo Não Para” (Cazuza), “Lanterna dos Afogados” (Paralamas), “Azul e Amarelo” (Cazuza). Só pedrada!

Acompanhe o papo que o Blog Música Urbana teve com o artista que não tem papas na língua. Com vocês, Lobão!

PAPO RETO COM LOBÃO:

Falando do seu livro mais recente, lançado em 2017 “O Guia Politicamente Incorreto dos Anos 80 Pelo Rock”, e também do nome do seu show “Antologia Politicamente Incorreta dos Anos 80 pelo Rock”. Seria uma autocrítica?  Em que momento você se viu “Politicamente Incorreto”?

Não chega a ser uma autocrítica, é mais simples que isso. Eu recebi um convite da pra fazer um livro para grife do Leandro Narloch, que é o “Guia Politicamente Incorreto”. Ou seja, na verdade é uma grife.

Você nunca imaginou esse título como uma uma autocrítica?

Eu nunca imaginei, porque é uma diferença gritante, e também tem questão do vocabulário que me é repulsivo, porque sou um homem arcaico. Não me permito viver esse tipo de realidade, porque eu acho desnecessário ser “politicamente incorreto”. Não há nenhum conceito intelectual ou transcendental dentro do livro chamado “Guia Politicamente Incorreto”. Ele é uma espécie de corrimão editorial.

80% do material escrito nos anos 1990, se você for avaliar, seria impossível e inviável de ser composto nos anos de hoje, porque você tem uma autocensura que é o “politicamente correto”. Chega a ser uma tautologia. É obvio que você vai pegar qualquer música dos anos 1980 um pouco mais concatenada, ela vai ser completamente fora do contexto de hoje. Por isso achei pertinente escrever um livro politicamente correto para falar sobre uma época em que, virtualmente, é incorreta, me soa absolutamente natural.

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Você gravou neste disco, várias bandas e vários discos que por muito tempo você criticou. Você considera que foi levado por esta situação relacionada com essa grife?

São coisas diferentes. Eu sou sócio-fundador dos anos 80 e conheço todo o panorama dessa época. Dentro do livro, existe toda a explicação e eu convido a todos os leitores do seu blog a lerem minha obra.

Eu parto do princípio de que o disco é um complemento do livro, e como eu sempre falo, a riqueza sensorial de assistir ao show dessa natureza, implica interativamente que o sujeito vá ter que ouvir o disco. Portanto, não está implícito que o sujeito deva ler o livro ou assistir o show, ou ouvir o disco. Uma coisa pode ser independente da outra.

O que pode ser mudado em você para rever os conceitos de regravar bandas que você havia antes criticado?

Eu não gosto dos anos 80, você sabe disso. Então, o fato de eu começar a escrever sobre uma década… Quando você mergulha historicamente, dentro de uma década inteira (foi o que aconteceu pelo menos comigo),  eu tendo a ver coisas que dificultaram muito a existência da própria geração, como por exemplo: todas as gravadoras da época, todos os diretores eram oriundos da jovem guarda. Todos eles tinham em mente contratar a rodo, um monte de gente pra que essas pessoas fossem terceirizadas e eles pudessem controlar.

Aí você já tem o primeiro bloco de contrapeso da geração. Você vê que o início de bandas como a Gang, a Blitz, Titãs – isso reflete bem no início da década esse fluxo. O que acontece é que, no meio disso tudo, por infelicidade desses diretores, eles estão contratando, talvez a geração mais profícua de compositores que o Brasil já teve. Estou falando de autores como Renato Russo, Julio Barroso, Evandro Mesquita, o Roger, Cazuza, Herbert Vianna, Humberto Gessinger, e outros, é um atrás do outro, e cada um deles tem uns 30 hits.

Então, a gente teve que lutar contra essa precariedade, contra intenções enviesadas, com grupos descartáveis, e querer colocar músicas de outras autorias para bandas autoras. Além disso, tinha a eminência das rádios. Então, juntava-se uma péssima qualidade de som, já inerente dos discos brasileiros em qualquer gênero musical com a interferência ainda estético conceitual do pessoal da jovem guarda. Isso fez com que os discos ficassem bem piores do que eram, principalmente na época. Você ligava no dial e tinha eu, o Ultraje depois o The Cult e Guns’n Roses acabando com a gente. Por que os sons dos anos 80, que vinham de fora, eram possantes. Então a gente tinha que brigar com isso. A mídia especializada, também antevia o último verão do rock a cada ano, no agouro constante. Nós tínhamos também os brasileiros intelectuais de MPB, o pessoal da passeata contra a guitarra elétrica, que sempre achou ótimo um subproduto, que na minha opinião, era inferior.

Então, quando você começa a escrever sobre esse período e vê que para a época, essas coisas não fazem muito sentido, você sente isso aos 30 anos depois do que aconteceu. Através de toda essa dificuldade, eu tive mais serenidade para ouvir o material, inclusive o meu material que eu tenho “nojo” de ouvir. Mas com esse período de espaço de tempo, você começa a perceber a qualidade do texto, da ideia e daquilo que não está exatamente gravado naquele arquivo, mas você sabe a essência da música.

A partir dali eu comecei a usufruir com um pouco mais de benevolência e serenidade. Eu me lembro da primeira banda que eu ouvi e desprezei muito, foi Engenheiros do Hawaii. E um dia eu comecei a ouvir um disco e a música “Cidade em chamas” e eu fiquei completamente comovido com aquela letra linda.

Quanto ao Herbert, eu continuo dando aquelas alfinetadas, mas tendi a ressaltar coisas com as quais eu me emocionei profundamente, que foram basicamente as músicas “Quase um segundo”, “Lanterna dos Afogadas” que eu acabei gravando. E essas músicas, eu tenho certeza que ele me copiou, porque eu achei muito bonitas.

Você ainda chama ele de “Herbérto”?

Eu sempre chamei ele de vários nomes, chamá-lo de “Herbérto” não se configura como um hábito…

…E nem demérito.

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Mas o fato é que ele fez musicas bonitas, e o que eu percebi também, é que contrariando todo os fatos e juntando num caldeirão uma série de músicas dos artistas que citei, são verdadeiras obras primas. Músicas incríveis e compostas em um intervalo de tempo razoavelmente pequeno. Um espaço de 6 anos, que foi o tempo que durou os anos 80. E nesse tempo, uma produção incrível de músicas fabulosas, e em um volume de letras e composições excelentes, que ficaram muito apequenadas por tudo isso que eu falei pra você antes. E quando eu consegui a oportunidade de entrar em contato com esse repertório na circunstância de escritor e de ouvinte serene depois de 30 anos de tempestade, eu consegui resgatar de mim mesmo uma benevolência e admitir que essas pessoas conseguiram fazer músicas incríveis.

A Bossa Nova e a MPB não atingem, numericamente, a quantidade de músicas geniais que houve nesse período. Foi uma constatação que eu só pude confirmar depois desse livro. Porque eu fiz uma pesquisa enorme, eu me “rasguei” pra fazer esse livro, e por tudo isso que eu te falei, a única coisa que eu poderia fazer depois de fazer o livro, era fazer o disco. Porque eu sabeia que eu nos últimos 10 anos eu adquiri conhecimento de produção de disco, de tirar um puta som. Eu aprendi a fazer isso, recentemente, por assim dizer. Eu cansei de pegar produtor e o cara acabar com o meu disco. Aí pensei: “vou ter que me inventar como produtor”, mesmo sabendo que eu poderia ser bastante proficiente nos requisitos de tirar som e pensei em fazer um disco. Vou pegar um apanhado um pouco maior do que pegar um disco duplo, pra poder justamente experimentar a sensação de que, se uma vez qualquer artista daquela época tivesse liberdade, poderia fazer um disco praticamente como este que foi feito agora.

Falando sobre o resultado dessas suas regravações para o disco. Você achou que atingiu seu objetivo? E você as considera melhores que as gravações originais?  

Eu não iria deixar passar uma música que não estivesse apaixonado por ela. Se tem 25 músicas ali, é porque eu estou amando todas elas. Em todas eu me emocionei de chorar e vivenciei intensamente, porque, por exemplo, eu tentei fazer várias músicas que não entraram, Legião, Titãs. A pesar de uma assimetria na quantidade de músicas entre um cantor e outro, mas são músicas que eu realmente consegui tirar um som de excelência, se não seria um contra senso.

Você já ouviu a opinião dos autores?

De alguns sim. O Nasi chorou, ficou muito emocionado. O Clemente também, o Capital, a Marina, o pessoal da Blitz. Eu fiquei muito surpreso com o reconhecimento dos autores, como Kiko Zambianchi, fiquei muito feliz mesmo! Por mais atritosa que fosse a nossa relação a recepção foi muito amorosa.

Dessas situações atritosas que você teve, tem alguma que que o tempo não diminui a rusga? Ou ficou tudo no passado?

Não. Eu escrevo sobre isso no livro e falo no disco, deixo bem claro que é uma situação de amor a todos eles. É um tipo de trabalho que, se eu me empenhei a fazer, não foi pra denegrir ninguém, muito pelo contrário.

A única voz dissonante foi a do pessoal dos Replicantes, eles ficaram ofendidíssimos com uma frase na música que eu modifiquei, pra atualizar a piada inclusive. Eles não gostaram e não permitiram continuar gravando. Uma pena, porque a música ficou sensacional.

E no ápice dos anos 80, vendo a situação do Rock de hoje, onde ou quando o Rock errou?

Toda a minha ira e meu desconforto com os anos 80 prevalece até hoje. Eu sempre fui aquela pessoa que ficava lá gritando sozinho. Mas o rock é gritar, você não pode, por exemplo, chegar numa roda de músicos e soltar uma “merda”, mas pro Brasil tá legal. Eu acho que essa acomodação, essa “vaselinagem” de circunstâncias, faz com que o rock vire um subproduto de si mesmo, porque você pensa assim. No próprio livro eu falo que o rock começa a se filiar à Tropicália. E eu achava tudo um absurdo e ficava muito aflito. E acho que eles foram vingando mesmo. Inclusive sobre o episódio do Paulo Ricardo com os ombros, de que esse seria um dos seus maiores atributos. Eu não admitiria uma coisa dessas. Só porque ele colocou um terno de ombreiras enormes e foi cantar “London, London” com Chico Buarque e Caetano Veloso, que assimilaram aquilo como se fosse um elogio, de fato. Essas pequenas coisas vão matando o rock, porque você pensa que o rock, quanto rock não aturaria em hipótese alguma.

Perde-se um pouco a tal da rebeldia do rock…

Você perde a essência do rock, e o motivo de estar ali utilizando aquele veículo que te dá tanta energia e tanta potência e você em marcha lenta… não dá pra entender.

Dentro das suas definições foram mal entendidas ou não levadas pelo lado bom, por assim dizer, teve alguma situação da qual você se arrepende, ou algo que você disse?

Claro, eu sou o rei da ressaca moral! O arrependimento é a moto propulsora da tentativa e erro. Se você não se arrepende, você não admite que errou e não vai tentar outra vez.

Então basicamente, o Lobão é pra ser levado à sério?

Eu acho que dentro dessa fragrância suja do rock, é cínico achar que não estou falando sério com os meus 46 anos de carreira, com a minha resiliência e a minha capacidade de reinvenção e com o meu texto poderoso. Como é que alguém pode achar que um homem com o eu, pode falar algum tipo de besteira. Tem que ser muito insensato.

Eu não estou reivindicando isso, simplesmente seria mais exato dizer “prestem mais a devida atenção no que estou falando”, acho que seria mais cirúrgico e preciso do que ser levado à sério, que e uma coisa que hoje em dia é um desgaste ontológico essa expressão.

O que me deixa forte, é que eu conheço todos eles. Eu estava pensando, “Quem bom né, que eu posso conhecer profundamente meus amigos e meus inimigos”, e isso cara, é o melhor patrimônio que um guerreiro pode ter.

Dentro dessas situações menos ou mais agradáveis, se baseando do que você falou sobre o arrependimento, você acha que para as pessoas assimilaram mal sua opinião, tem espaço para o Lobão ser perdoado? Por exemplo a situação do Faustão há algumas semanas.

Eu sou amigo do Faustão há muito tempo, eu fui o primeiro cara que entrou no programa Domingão do Faustão de muitos anos. As pessoas acham que eu cometi um crime eleitoral em 89 e nunca mais fui ao Faustão, mas não foi isso. Eu cometi um crime eleitoral e fiquei afastado da Rede Globo, por 11 anos. O Dr. Roberto Marinho, falou com meu pai, mas o Faustão é meu amigo, foi ele que promoveu meu disco de banca. O que aconteceu foi que eu tinha mandado printar 50 mil cópias de “A vida é doce” e tinha vendido 1.500, mas eu estava blefando dizendo que tinha vendido 50mil cópias. A gravadora estava com o cabelo em pé pensando no prejuízo, aí eu falei com o Fausto, ele me pediu um tempo e fomos fazer em Março de 2000 a divulgação. Eu voltei pra gravadora e disse: “falei com o Faustão, vamos fazer o seguinte. Printem mais 50mil”. Aí eles printaram mais 50 nil, com o cabelo mais em pé ainda. Chegou no domingo do Faustão, ao vivo, eu organizei uma logística toda em função do programa. Distribuímos as 100 mil cópias pelo Brasil inteiro, colocamos até no Acre. O Fausto, como não poderia deixar de ser, passou o programa inteiro dizendo “Lobão, vendeu 50 mil cópias…”, e aí quando eu entrei no programa, bateu o recorde histórico de ibope, e eu acabei vendendo todas as 100 mil cópias.

Boa Lobão! Foi ótimo bater esse papo com você.

 

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