Se queremos conhecer nosso destino, é só voltarmos os olhos para dentro de nós mesmos e ter a coragem de desnudar nossos mais primitivos sentimentos e atitudes que, como sombras disfarçadas em fragmentos inconscientes, habitam nossa alma desde a mais tenra infância. Crescemos em idade e tamanho, mas continuamos a ser as mesmas crianças birrentas e manhosas que só trocaram as cores de suas máscaras para viver um novo aporte de comportamentos.
Libertar e reconhecer estas emoções e mentiras que contamos a nós mesmos não é fácil mas é, sim, possível. Para que nosso ego cresça e nos proteja das verdades que ignoramos, vamos nos enrustindo na dissimulação das máscaras. Fixamos nossas expectativas no olhar do outro – é ele quem dirá quem somos, e nele acreditamos para não ter que despertar e nos dar conta de nossa verdadeira essência. E assim prosseguimos, distanciados de nós mesmos, buscando a aprovação externa. Uma eterna roda viva, em que as sofrências fazem sua morada, as ansiedades se avolumam, as sombras nefastas dos pensamentos destrutivos tomam forma e se adonam do ser, que acaba por tornar-se menor, mesquinho, a ponto de ele ter de si mesmo uma imagem do que, simplesmente, ele não é. Está, pois, criado o inferno…
Sair desse inferno, derrubar os muros da prisão, desmontar as armadilhas demanda introspecção e, como já dito anteriormente, auto-observação. Não há outra forma de nos libertarmos dos papéis inconscientes que interpretamos, de refugar que a ‘verdade está no e vem do outro’, de livrar-nos da necessidade de aplausos, de parar de mentir e enganar a nós mesmos, de rever as nossas pendências emocionais, de arrancar em definitivo as velhas máscaras e mostrar a cara, de sair das sombras que nos enredavam para poder, finalmente, enxergar que nada advém do mundo externo : tudo está aprisionado em nosso próprio interior.
Fazer uma faxina nesses sótãos escuros de nossa existência é lançar fora todo o entulho acumulado pela imposição de pensamentos alheios, valores distorcidos, atitudes destrutivas, dogmas estabelecidos como verdades absolutas etc.. Fazer a faxina é despertar para uma existência plena, é acreditar que nós somos o produto de nossas próprias escolhas, é retirar do ombro do outro o fardo de ser ele o responsável pelas nossas dores, tristezas, fracassos. Fazer a faxina é, sobretudo, adentrar no mundo dos que sonham e sabem que são os donos e senhores de seu destino, e portanto vão em busca da liberdade de ser. Um ser autêntico, um ser de bem sabe que, onde quer que se encontre, qualquer que seja a crença ou o credo professado pelos que o cercam, seja qual for a origem, a cor da pele, a cultura exterior, o sexo – o ‘outro’ é seu semelhante, jamais seu juiz, ou seu tutor, ou seu desigual.
E, assim, pleno de si mesmo, inevitavelmente exercerá a prática do maior bem da humanidade – o respeito, uma vez que após sua cura, este ser aprendeu a se perdoar, a se aceitar como um ser íntegro, a se respeitar.
Quando nossa consciência desperta para a premência do autoconhecimento, estamos prontos para ‘encarar-nos’ e envidar todos os esforços para nossa auto-edificação. Finda a edificação, é só prosseguir na jornada, agora leve e livre das aparências, das diferenças, dos conceitos e preconceitos estabelecidos como se fôssemos todos exatamente iguais : semelhantes sempre, iguais jamais! Cada um de nós é único, mas não sozinho – somos todos, sem exceção, uma parte do Todo, um grão da Unidade.
Por Pedra Bucci
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