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Desde a última quinta-feira, 12 de junho, o mundo testemunha um novo capítulo da guerra entre Israel e Irã. Israelenses e iranianos trocam salvas de mísseis e drones, causando mortes e destruição em ambos os lados. Não se pode dizer que o confronto tenha sido inesperado.
As tensões entre os dois países vinham se acirrando há tempos, à medida que o Irã avançava a passos largos rumo à construção de uma bomba nuclear. Eu mesmo, neste espaço na Gazeta do Povo, já havia alertado sobre essa possibilidade em duas colunas, publicadas nos dias 31 de março e 19 de maio.
Há muito tempo, Israel afirma que não poderá admitir que o Irã — um país que não reconhece o direito de existência do Estado israelense — se transforme em uma potência nuclear. Apesar das negativas oficiais, a liderança iraniana vinha acelerando seu programa atômico.
Na semana passada, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) declarou formalmente que o Irã não está cumprindo suas obrigações de não proliferação.
Urânio e impasse diplomático agravaram o conflito
Segundo o relatório da agência, o país já teria estocado 408,6 kg de urânio enriquecido a 60% de pureza. Essa quantidade, se enriquecida a 90%, seria suficiente para a produção de até nove ogivas nucleares, conforme estimativas técnicas amplamente reconhecidas.
Ao mesmo tempo em que as tensões escalavam, as negociações em curso entre Estados Unidos e Irã para um novo acordo nuclear chegavam a um impasse. Enquanto os americanos exigiam que o Irã abrisse mão por completo de seu programa nuclear, os iranianos consideravam essa exigência inaceitável.
Após o ataque israelense, o Irã suspendeu as negociações, cancelando a reunião que estava marcada para o dia 15 de junho. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, por sua vez, alertou que ataques “ainda mais brutais” ocorrerão caso Teerã não se comprometa com um novo acordo com Washington.
É importante destacar que este não é um confronto qualquer.
Para além do sofrimento humano e das perdas materiais que todas as guerras causam, trata-se de um embate entre as duas maiores potências militares do Oriente Médio — com um enorme potencial de escalada regional e global
A ação militar israelense tem por objetivo “degradar, destruir e remover a ameaça” representada pelo programa nuclear iraniano.
O ataque inicial foi conduzido por cerca de 200 aeronaves que, decolando de Israel e sobrevoando os espaços aéreos sírio e iraquiano, lançaram mísseis contra alvos previamente selecionados: instalações do programa nuclear e áreas militares, residências de lideranças e de cientistas do programa nuclear, além de baterias antiaéreas.
Simultaneamente, forças especiais israelenses infiltradas no território iraniano — em ação semelhante às operações ucranianas contra a Rússia — lançaram drones de curto alcance contra sistemas de defesa aérea.
Os ataques resultaram na morte de alguns dos mais importantes generais iranianos, incluindo os dois principais comandantes militares: o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Mohammad Bagheri, e o comandante da Guarda Revolucionária, Hossein Salami, além de diversos cientistas envolvidos no programa nuclear.
O Irã vem respondendo com sucessivas salvas de mísseis. Apesar de Israel possuir o mais avançado sistema de defesa antiaérea do mundo, vários mísseis balísticos iranianos conseguiram ultrapassar as defesas e atingir alvos nas principais cidades israelenses.
No momento em que escrevo esta coluna, ambos os lados prometem manter os ataques por tempo indefinido, até que seus respectivos objetivos sejam alcançados. A principal pergunta, contudo, é: qual será o impacto dessa guerra sobre o programa nuclear iraniano?
Um cenário possível — e certamente o mais perigoso — é o de que o ataque israelense leve o regime iraniano à conclusão de que possuir a bomba é a única forma de garantir sua sobrevivência. Caso consiga preservar os elementos centrais do programa — centrífugas, estoques de urânio e instalações-chave — Teerã pode iniciar uma corrida final pela arma nuclear, o que, segundo especialistas, poderia ser alcançado em questão de meses.
Outro cenário seria o de uma capitulação parcial do regime, renunciando ao programa nuclear para evitar danos maiores. Os primeiros ataques israelenses já causaram perdas expressivas às defesas antiaéreas iranianas, e os danos tendem a se acumular. Caso os prejuízos se tornem insuportáveis, é possível que o Irã se veja forçado a negociar. Essa parece ser a aposta estratégica de Israel.
A queda do regime, a exemplo do que aconteceu recentemente na Síria, também é uma hipótese que não pode ser descartada.
De qualquer forma, independentemente do desfecho final, o caminho até ele é preocupante. O regime iraniano pode decidir lançar mão de todos os recursos à sua disposição para tentar regionalizar o conflito.
Bloqueio do Ormuz e a economia global
Uma forma eficaz de fazer isso seria provocar uma crise econômica global, interrompendo o tráfego no Estreito de Ormuz. Por ali passa cerca de 21% do petróleo consumido diariamente no planeta. Um bloqueio parcial ou total, provocado por ação militar iraniana, causaria danos significativos à economia global — e ampliaria ainda mais os riscos do conflito.
Como se vê, a guerra não se restringirá a definir o futuro do programa nuclear iraniano, mas a estabilidade de todo o Oriente Médio — e, por consequência, parte da segurança energética do mundo. A guerra entre Israel e Irã ainda pode escalar para um conflito mais amplo, envolvendo outras potências regionais e afetando profundamente o equilíbrio global.




