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Daniel Castellano/Arquivo Gazeta do Povo
Daniel Castellano/Arquivo Gazeta do Povo| Foto:

A Previdência tem dificuldade de combater a pobreza – como vimos na última coluna – porque a pobreza no Brasil está desproporcionalmente concentrada nas crianças e jovens. Como é especialmente incomum que idosos e crianças dividam o mesmo domicílio, aposentadorias fazem pouco para reduzir a pobreza.

Enquanto em crianças e jovens até 17 anos a taxa de pobreza é de impressionantes 30% (3 em cada 10 jovens vivem abaixo da linha da pobreza), a taxa cai a 7% no caso de idosos acima de 75 anos. O gráfico a seguir apresenta a percentagem de brasileiros, por faixa etária, vivendo abaixo da linha da pobreza. Os cálculos são da OCDE, com base na PNAD 2015. Observe como grupos mais jovens são claramente mais afetados pela pobreza.

Taxa de pobreza – Por faixa etária – Brasil – 2015

Fonte: OCDE

Não é possível naturalizar esta desproporção, considerando normal que domicílios com crianças sejam mais pobres. A própria OCDE apresenta os mesmos dados para o conjunto de países do grupo. Ela é apenas ligeiramente mais alta nas faixas etárias mais jovens. Aliás, pode surpreender alguns leitores que a taxa de pobreza para os idosos acima de 66 anos seja menor no Brasil do que em países desenvolvidos.

Taxa de pobreza – Por faixa etária – Brasil e OCDE – 2015

Fonte: OCDE

Em verdade, o fato de a pobreza ser tão concentrada nas crianças, como no Brasil, praticamente não é encontrado em outros países[1].

Assim, a OCDE conclui, no documento Economic Survey of Brazil 2018:

Limitar futuros aumentos nos benefícios sociais que alcançam principalmente a classe média poderia ajudar a aumentar transferências sociais com forte impacto na redução da desigualdade e forte focalização direcionada a crianças e jovens, como o programa condicional de transferência de renda Bolsa Família. (…) Uma abrangente reforma previdenciária se tornou o mais urgente elemento do ajuste fiscal, e é também uma oportunidade para tornar o crescimento mais inclusivo por meio da melhor focalização dos benefícios.

Por outro ângulo, segundo a Síntese de Indicadores Sociais 2017 do IBGE, baseada na PNAD Contínua de 2016, as crianças e jovens até 14 anos são 43% dos brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza. Os jovens de 15 até 29 anos respondem por 29% desta população. Somente cerca de 8% dos pobres possuem 60 anos ou mais, vide gráfico.

Distribuição de pessoas abaixo da linha da pobreza – Por faixa etária – 2016

Fonte: IBGE

Ressalta-se que o dado acima é de natureza diferente dos dados da OCDE apresentados nos outros dois gráficos, embora convirjam para a mesma conclusão: antes apresentamos o percentual de brasileiros em uma determinada faixa etária que são pobres; agora o percentual de pobres que pertence a cada  faixa etária.

Outros dados contribuem para explicar a baixa efetividade da Previdência em chegar nestas famílias. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais 2017, a taxa de pobreza é de 9% em domicílios unipessoais, mas de 56% em domicílios compostos por mulheres sem cônjuges com filhos até 14 anos! No caso de casais, a taxa é de 12% para os sem filhos até 14 anos, mas de 30% nos domicílios de casais com filhos.

Taxa de pobreza – Por arranjo domiciliar – 2016

Fonte: IBGE

Os arranjos domiciliares são relevantes para entender a incapacidade da Previdência em reduzir a pobreza. Somente 3,5% dos idosos que são beneficiários de aposentadoria ou pensão possuíam pelo menos 2 crianças ou jovens de até 15 anos em suas famílias no ano de 2011, segundo os cálculos dos pesquisadores Paulo Tafner, Carolina Botelho e Rafael Erbisti  a partir da PNAD[2]. Quase 90% destes idosos não possuíam nenhuma criança ou jovem no domicílio.

Crianças ou jovens de até 15 anos vivendo com idosos beneficiários de aposentadoria/pensão – 2011

Neste sentido, políticas mais bem sucedidas no combate à pobreza serão aquelas focadas nas famílias jovens. Do ponto de vista do orçamento, é o caso do Bolsa Família, de investimento em saneamento básico e em creches. Medidas destinadas a combater o desemprego e a informalidade entre jovens em geral, e mulheres em particular, também tendem a alcançar essas famílias – como a reforma trabalhista fez com modalidades alternativas de contratação para inserção de trabalhadores de baixa experiência/produtividade.

 

[1]     TAFNER, P. S. B. (Ed.). Brasil: O Estado de uma Nação, 2006: Mercado de Trabalho, Emprego e Informalidade. Rio de Janeiro: IPEA, 2006.

[2]     TAFNER, P.; BOTELHO, C.; ERBISTI, R. Debates sobre Previdência: Confusões, Polêmicas Iniciais e Mitos. In: TAFNER, P.; BOTELHO, C.; ERBISTI, R. (Org.). Reforma da Previdência: A Visita da Velha Senhora. Brasília: Gestão Pública. 2015.

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