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Doeu
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Não esconda, doeu. Doeu porque havia certa esperança, apesar das baixas insubstituíveis: o craque partido ao meio, o capitão que chora. Mas tudo, até o abraço consolador e vidente de David em James no capítulo anterior, foi uma ilusão, infantil como Bernard, tristeza nas pernas.

Como em 98, até então nossa maior derrota depois de 50, avançamos catando cavacos, com um time à gaúcha, não à baiana, como está sendo, de corpo e alma, a Alemanha rubro-negra. Eles, tropicalistas de ocasião, fizeram-nos reaprender que o futebol também se reinventa e que todo peso de camisa tem prazo de validade.

1982

Doeu porque, arrogantes do técnico ao comentarista, não reconhecemos que éramos pequenos. Pô, Felipão, era jogo para três volantes — logo você, que gosta tanto deles. Mas tentar agredir um time que não se assusta tendo um dente de leite como pseudo-surpresa foi nossa estratégia. Este 8 de julho foi o dia em que o complexo de vira-latas desfilou de nariz empinado.

Doeu porque a seleção era aquela mesma, incontestável desde a sua convocação. Era o nosso melhor, goste você de Fred ou não.

Dói ainda mais quando ouvimos Daniel Alves misturar espanhol e português numa entrevista pós-jogo para a maior tevê aberta do país, que vive de panaceia, mas se esquece que é responsável pelos extintores quando rompe o inferno. Aquela mesma a que assiste o Walmir, entregador de pizza que reclamou “daqueles porras que usam um estádio construído com bilhões, não jogam nada e continuam ganhando a mesma coisa, ao contrário de nós, que trabalhamos hoje para pagar o que comemos ontem.” É a legítima voz do povo que não foi ao estádio. Se na vitória todos se sentem representados, imagine na derrota.

Dói muito quando um Dante, brother dos teutos, diz, acompanhado de uma piscadela de olho, que não há diferença entre perder de 1 ou de 7. Como é? Dói mais quando o mesmo zagueiro afirma não se lembrar dos placares com os quais o Brasil conquistou seus títulos (!). Machuca sim. Porque ou é indiferença, ou é ignorância.

Chorei 98. Principalmente porque tinha 14 anos. Mas também porque vi um time chegar para sua segunda final de Copa consecutiva, sucumbir e ser massacrado. Essa é a verdadeira lição de vida do futebol: estar preparado para o improvável. É esse tipo de sentimento que catalisa a paixão por esse esporte tão maluco. Doeu, mas, lá na frente, vou contar que não chorei 2014, porque não deu tempo de sofrer. Porque foi um atropelo elegante, e não havia a mínima chance de reação, de reestruturação, apesar do gol de desonra.

Um time se preparou, entrou em campo, curtiu a Copa, conheceu os índios pataxós na Bahia, conversou sobre futebol o tempo todo durante as entrevistas coletivas – nada de “psicológico” — e comeu feijão tropeiro depois da maior vitória de sua história. O outro, fez de um moleque um mártir, de um treinador ultrapassado um possível milagreiro e de uma seleção medíocre e óbvia que jamais jogou bola um vexame incomparável.

Mas o que mais dói — medo maior – é pensar na hipótese de as outras seleções, outrora só determinadas, sortudas ou valentes, terem encontrado também a magia, coisa que, sem perceber, deixamos em algum lugar pelo caminho. Aí, melhor voltar para 1950, absolver Barbosa, e começar tudo de novo.

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