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Damon Albarn comanda. (Foto: Ricardo Matsukawa/ Terra)
Damon Albarn comanda. (Foto: Ricardo Matsukawa/ Terra)| Foto:

No caminho entre a Estação Carandiru e o Campo de Marte, a amostra do que seria o público do Planeta Terra 2013. Trotando sob o sol das 16 horas e desviando dos ambulantes que tentavam empurrar uma Stella “geladíssima” por R$ 5, um rapaz solitário exibia sua camisa cinza do Travis. Havia de ser cinza. Do outro lado da rua, um casal se perguntava se aquele era mesmo a direção a seguir. Ela tinha a bolsa em forma de caixinha de leite. Ele vestia uma camiseta azul. Blur. Os fãs do Beck, esse camaleão, eram os mais difíceis de serem identificados porque poderiam ser qualquer um – o garoto de óculos e bermuda cáqui; o sujeito de alguns cabelos brancos e camisa de mangas curtas. Fácil mesmo de reconhecer eram os/as Lanetes, adolescentes que fundem os gêneros e se vestem quase da mesma forma: calças jeans skinny, botas exageradamente grandes, regata e faixinha na cabeça. Por dentro, o histerismo em potencial.

Primeiro aeroporto de São Paulo, o Campo de Marte tem o tamanho total de 2 milhões de m2. Pouco mais de um quarto disso, em uma fatia retangular, foi usado para a sétima edição do festival mais bem organizado do país, no último sábado, com a presença de 27 mil pessoas – havia vários vazios perto do palco mesmo durante a apresentação do Blur. O som do The Roots vazou para o outro palco. Houve filas, sim, mas é cada vez mais difícil um mundo sem filas, seja onde for. Os banheiros permaneceram dignos até o fim dos trabalhos. E, o principal, todos os shows começaram e terminaram no horário previsto — tá, é estranho ouvir “Why Does it Always Rain on Me” com sol na moleira, mas é ótimo poder pegar o metrô com calma depois de tudo.

Ao menos no Terra o Coxa estava por cima. (Foto: Mauro Pimentel/ Terra.)

Ao menos no Terra o Coxa estava por cima. (Foto: Mauro Pimentel/ Terra.)

Palma Violets

A “nova sensação da música inglesa” – de qual semana? – tentou dar mais do que podia. Seu garage rock moderninho flui bem no disco 180, lançado em fevereiro deste ano. Mas ao vivo é uma performance artificial e descabida. Querem ser punk e grunge ao mesmo tempo. Foi um show morno e sem alma do começo ao fim, mesmo com peripécias deslocadas do vocalista Samuel Thomas, que reveza os vocais, quase idênticos, com o baixista. Mas ok. A banda é nova (foi formada em 2011). E “Best of Friends” é boa mesmo. Serviu como esquenta.

Palma Violets: sem muitas palmas. (Foto: Mauro Pimentel/ Terra)

Palma Violets: sem muitas palmas. (Foto: Mauro Pimentel/ Terra)

Travis

O lado frágil do britpop chama-se Travis. Se a banda escocesa um dia ganhou elogios do próprio Liam Gallagher pelo álbum Good Feeling (1996), sempre manteve uma distância considerável de Oasis e Blur, tanto na sonoridade quanto na postura. Divulgando seu último disco, o horrível Where You Stand (2013), o grupo do carismático Fran Healy (como está velho!) tinha um desafio a mais porque era o primeiro show da banda no Brasil. Os hits tinham de surgir. Havia uma expectativa velada, principalmente mais à frente, perto do palco, estampada na cara de fãs já trintões.

Siiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiing. (Foto: Ricardo Matsuwaka/ Terra).

Siiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiing. (Foto: Ricardo Matsuwaka/ Terra).

É difícil avaliar a apresentação de uma banda quando sua memória afetiva duela com seu senso crítico. De forma geral, o show foi sonolento. Mas também poderia dizer que foi uma espécie de redenção saudosista, principalmente na trinca “Side”, “Closer” e “Sing”. Depende de quem você é, na verdade. Foi quase um show família, com momentos muito bonitos, embora rodeado por uma atmosfera sépia. “Flowers in the Window” ganhou uma versão acústica e quase a capella — memorável. Faltou “Tied to the 90’s” e “The Humpty Dumpty Love Song” – veja o setlist abaixo.  Mas teve “Why Does it Always Rain on Me” e “Happy”, alguns dos bons clichês da vida. Ponto positivo é ver que a própria banda sabe seu tamanho e seu lugar na história. Ao fim do show, Healy disse, como algum amigo seu poderia dizer, cutucando seu ombro: “Muito obrigado, pessoal. Agora aproveitem Lana. E aproveitem Blur.”

Setlist:

Mother
Selfish Jean
Pipe Dreams
Moving
Love Will Come Through
Driftwood
Re-Offender
Where You Stand
My Eyes
Reminder
Writing to Reach You
Side
Closer
Sing
Slide Show
Blue Flashing Light
Turn
Flowers in the Window
Why Does It Always Rain On Me?
Happy

Lana del Rey

O show da Lana começaria às 18 horas. E Beck estava marcado para as 18h30, no palco ao lado, menor. Estava muito curioso pelo fenômeno Lana, que começou desde cedo, com o desfile dos Lanetes. O disco da moça é bem palatável e ela tem feitos curiosos, como uma versão para “Chelsea Hotel #2”, de ninguém menos que Leonard Cohen. Além disso, era a exibição ao vivo de um produto cultural que nós mesmos criamos, gostemos ou não. E com tudo o que vem a reboque.

Bonitinha e ordinária, literalmente. (Foto: Ricardo Matsukawa/ Terra).

Bonitinha e ordinária, literalmente. (Foto: Ricardo Matsukawa/ Terra).

Em um palco kitsch tomado por palmeiras, Lana surgiu de branco. Caminhava a passos modorrentos, enquanto os/as Lanetes exibiam seus agudos – misturado aos teclados da banda, se Enya entrasse no palco àquela hora, não ficaria surpreso. Lana desceu para dar autógrafos – ainda a passos irritantemente lentos – e finalmente recebeu uma coroa de flores de uma Lanete privilegiada, que chorava as cascatas do Niágara. Ela começou a resmungar algo, mas não deu tempo de vê-la cantar, infelizmente. Ou felizmente. É que Beck surgia para resetar o Planeta Terra.

Beck

No aniversário de 20 anos de seu primeiro disco, Beck (como está velho!) fez um show digno da palavra, com talento, carisma e improvisos. A plateia se transformou em uma pista de dança meio desajeitada, principalmente no início da apresentação – “Devil’s Haircut” logo de cara, imagine. Sua banda é poderosa e esperta, seja no rap ou no funk. “Loser”, a quarta da noite, fez absolutamente todo mundo celebrar o que um dia não deu certo, pulando de forma irônica.

No miolo do show, a vez do seu anti-folk (“Gamma Ray”, “Girl” e “Soldier Jane”). Beck também jogou para a torcida. O guitarrista Smokey Hormel citou “Asa Branca”, de Luiz Gonzaga, e também Caetano e Gil. “Lost Cause”, das músicas mais tristes da história, ajudou a provar o ecletismo não forçado desse sujeito de 43 anos. E no fim, a loucura.

Beck fez festa particular no Campo de Marte. (Foto: Mauro Pimentel/ Terra)

Beck fez festa particular no Campo de Marte. (Foto: Mauro Pimentel/ Terra)

“Isso soa familiar, não?”, perguntou Beck durante o riff de baixo de…Billie Jean”. “Não, não podemos tocar isso. Existem algumas canções que simplesmente não podemos tocar. Que são boas demais”, brincou. “Mas vocês nos permitem?” Permitimos.

Também sobrou para Lana Del Rey, aparentemente eclipsada no palco ao lado. “Tudo o que eu tenho no mundo são essas guitarras, esse microfone e esse vestido, que achei no backstage”, disse Beck, antes de se enrolar no pedaço de tecido branco cheio de lantejoulas. “E-Pro” e “Where It’s At” fecharam as portas da balada e deixaram uma missão complicada para o Blur.

Setlist:

Devil’s Haircut
Novacane
One Foot in the Grave
Loser
Black Tambourine
Soul of a Man
Tainted Love
Modern Guilt
Get Real Paid
Hotwax
Tropicalia
Qué Onda Güero
Debra
Gamma Ray
Girl
Soldier Jane
The Golden Age
Lost Cause
Sissyneck / Billie Jean
E-Pro
Where It’s At

Blur

Hit sobre hit. Todos são personagens e sabem disso. Damon e Coxon, às vezes são um só. Uma parte da história da música recente ali, ao vivo. E, diferente do Oasis em sua sobrevida, não foi anacrônico. Porque, na segunda vez no país, a banda estava afim. Não há muito mais o que dizer sobre um show que começa com “Girls & Boys” e termina com “Song 2” – veja o setlist abaixo. A única surpresa num roteiro óbvio, mas ainda espetacular, foi a balada “Under the Westway”, criada especialmente para a apresentação do Blur durante a cerimônia de encerramento das Olimpíadas de Londres, no Hyde Park, em 2012.

Damon Albarn comanda. (Foto: Ricardo Matsukawa/ Terra)

Damon Albarn comanda. (Foto: Ricardo Matsukawa/ Terra)

Em “Tender”, aquele coro profundo e messiânico. Que música. “Parklife” contou com Phil Daniels, o ator que emprestou sua voz para gravar a música lá em 1994. Trazer o cara para cantar apenas uma música foi um sinal de comprometimento e respeito. Faz uma baita diferença. No palco, durante “Coffee & TV”, Alex James sorria para Damon e Graham, como se quisessem dizer um ao outro, simplesmente, “que legal.”

O fim do jogo teve “For Tomorrow”, “The Universal” e a urgente “Song 2” (veja vídeo abaixo) – lembra do FIFA 98? O clima era de 3 a 0 a favor em final de campeonato, até entre a própria banda. “Nos vemos na Copa do Mundo”, disse Damon.

 

Setlist:

Girls & Boys
There’s No Other Way
Beetlebum
Out of Time
Trimm Trabb
Caramel
Coffee & TV
Tender
To the End
Country House
Parklife
End of a Century
This Is a Low
Under the Westway
For Tomorrow
The Universal
Song 2

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