• Carregando...
Ele não é somente o presidente da maconha.

Ele não é somente o presidente da maconha.

É muito injusto que a maconha, o aborto e a união civil entre pessoas do mesmo sexo sejam as bandeiras consideradas mais importantes do governo Mujica, mesmo porque estas duas últimas sequer tiveram apoio do poder executivo, o qual encampou a luta somente após a sua condução e aprovação por parte da Frente Ampla no parlamento.

Mujica também não deve ser lembrado pelo seu “pobrismo”, um título dado a ele por dois motivos, ambos imprecisos. O primeiro por ser considerado pela imprensa internacional como o presidente mais pobre do mundo, um título mais impactante do que real. Devemos lembrar que alguns dos meios de comunicação (BBC, CNN, Le Monde e The New York Times) que utilizaram este título, classificaram Lula como um “estadista global”…

O outro motivo desse “pobrismo”, está baseado na conduta realmente humilde de Mujica, o que não faz com que ele aguarde de sandálias o atendimento em hospitais públicos de Montevidéo. A humildade de Mujica estaria mais ligada ao seu desapego a bens materiais, o que efetivamente o afasta de desconfianças de busca por enriquecimento pessoal às custas do poder, e à sua imagem de conciliador entre os setores mais opostos e radicais da política uruguaia, sem ter o orgulho pueril de se manter fiel às suas raízes de guerrilheiro de esquerda tupamaro.  Esta humildade, no entanto, no faz com que Mujica adote uma posição de passividade, fato este comprovado pelas acirradas lutas políticas com seus opositores, evidenciado interesses diversos defendidos por políticos tradicionais como seu vice-presidente Danilo Astori e seu sucessor Tabaré Vazquez.

Mujica deve antes de tudo ser lembrado pelo seu progressismo, por seu afastamento da esquerda radical, pelo seu não rompimento com reformas neoliberais iniciadas na década de 90. Mujica não rompeu com a estrutura, mas reestruturou o capitalismo uruguaio na busca por desenvolvimento, sem embarcar na onda destrutiva adotada por Argentina, Venezuela, Bolívia e Brasil. Mujica é um “tupamaro” que se afastou das tragédias professadas por seus ex-companheiros de guerrilha que pregavam a instituição imediata de reforma agrária e a nacionalização dos setores produtivos, dentre outras medidas radicais.

Acima de tudo Mujica sempre foi um grande negociador que quando enfrentando uma plateia de empresários não se fazia de rogado ao manifestar a sua aproximação ao capitalismo e à economia de mercado, baseadas em sua nova crença de ajudar o Uruguai a ter um capitalismo sério na busca por mais emprego e atividade econômica, utilizar o capitalismo como instrumental de desenvolvimento. Entretanto, ao enfrentar um  público diametralmente diferente, formado por sindicalistas e líderes da velha esquerda, lança mão de argumentos keynesianos afirmando a necessidade de empresas públicas autogeridas por trabalhadores, criticando, inclusive, alguns aspectos da sociedade de consumo.

Mujica não rompeu com a lógica instaurada no início dos anos 90 no Uruguai, espantando os tupamaros mais tradicionalistas ao manter pilares contrários aos anseios da esquerda como por exemplo a desregulação financeira; a privatização da produção e da comercialização de produtos centrais para a economia uruguaia como por exemplo carne e soja, a qual permanece sendo 100% transgênica, ao arrepio de ambientalistas; a flexibilização da entrada de capital estrangeiro, até mesmo na exploração da terra; a multiplicação de zonas com benefícios fiscais a partir da criação de zonas francas e; a adoção de parcerias público privadas. Deve-se ressaltar, no entanto, que Mujica não diversificou a economia, ou seja, fixou a estrutura produtiva no setor primário (setor muito influente na política uruguaia), algo que deve ser visto como algo temerário a longo prazo.

Mujica não é direita e não é esquerda, e talvez tenha que ser lembrado por sua humildade, mas não a humildade do ”pobrismo” romântico para “inglês ver”, mas sim a humildade de ser um tupamaro que conseguiu impor a consciência de que na Frente Ampla não existe mais esquerda, mas também não existe direita, assim como não existe patrimonialismo ou aproveitamento de cargo para benefícios pessoais, e por perceber que a democracia de mercado é um sistema que pode ser utilizado para o bem da sociedade, e não ser destruído por aproveitadores do Estado. Mujica cometeu erros, não conseguiu implementar tudo que queria, cabe agora ao socialista Tabaré Vázquez manter-se nos trilhos da Frente Ampla.

Muito injusto que Mujica seja somente lembrado e reconhecido mundialmente pela maconha!

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]