Do Lago Ness a Mucuri

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Não é todo o dia que o frequentador de boteco tem o privilégio de ter à mesa ao lado um escocês. Pois isso está ocorrendo no Bar VIP da Vila Piroquinha. Coisas da Copa. O problema, segundo Rosbife, o feliz proprietário do distinto estabelecimento, contou que, no início, não foi fácil entender e se entender com o gringo.

– Ele só fala português recorrendo à mímica…

Como no primeiro dia o turista solicitou um legítimo scotch e engoliu um made in Paraguai, da segunda vez, prevenido, chegou pedindo sugarcane juice. Só pôde ser atendido quando rabiscou 51 num papel de embrulho.

Sugarcane juice, como se constatou depois, vem a ser caldo de cana. Ou sumo de cana, a nossa prosaica cachaça.

– Tudo certo agora. O nosso escocês chega e sai todo sorridente. Escapamos de sofrer a fúria do monstro do Lago Ness…

Por ordem da Coroa

Já a poucas quadras do Bar VIP da Vila Piroquinha, um carro chamava a atenção dos pedestres. Não que fosse um carrão importado, até porque o coitado exibia as marcas do tempo – ou melhor, da alta quilometragem. Era a placa que cutucava a curiosidade da distinta clientela: Mucuri, BA.

Não deu outra. Localizado o proprietário, num dos cantos do boteco, a turma ficou sabendo que Mucuri fica na Bahia. No extremo sul do Estado. Mais: quem nasce lá é mucuriense.

No século XVI, o município pertencia à Capitania Hereditária de Porto Seguro. A região foi invadida pelos portugueses à procura de ouro e pedras preciosas. Fracassada a empreitada dos garimpeiros, teve início a extração de Pau-Brasil e a produção de açúcar em engenhos, por ordem da Coroa Portuguesa.

A revolta dos donos da terra

Depois de 200 anos de ocupação, os índios Aimorés, Abatires e Pataxós uniram forças com os Botocudos e atacaram a Capitania. Eliminaram quase todos os portugueses e os índios Tupiniquins – que colaboravam com os invasores.

Entre 1720 e 1730, eis que chegam alemães e suíços, dando início ao cultivo de café. Os índios chamavam a região de Mucuri, nome de uma madeira que existia em abundância nas áreas próximas ao rio. Para os estrangeiros, o nome era Porto Alegre. Em 1768, brancos e índios construíram uma capela dedicada a São José, hoje padroeiro do município.

Do barco a vapor ao trem de ferro

Ordem Régia de 10 de outubro de 1769 criou o município São José de Porto Alegre, instalado a 15 de outubro de 1779, pelo Ouvidor Geral da Comarca de Porto Seguro, José Xavier de Machado. Em 1852, com três barcos movidos a vapor, entrou em operação a Companhia de Comércio e Navegação do Rio Mucuri, que operava do porto de Mucuri até o porto fluvial de Santa Clara, abaixo de Nanuque, Minas Gerais. Em 1918, com funcionamento da Estrada de Ferro Bahia-Minas, a Companhia encerrou suas atividades. Os primeiros imigrantes na região foram os membros da família Gazzinelli e italianos. Depois vieram os Borges, Kochs, Saúdes, Schappers, Kammietts, Câmara, Ribeiros, Costas, Limas, Cunhas e outros.

O município passou a ser oficialmente chamado de Mucuri em 1931. Hoje, por conta principalmente do turismo, é um dos mais importantes municípios da Bahia.

– Isso é bom. Bebendo e sempre aprendendo – comemorou Beronha, nosso anti-herói de plantão.

ENQUANTO ISSO…