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8 de janeiro
Manifestantes em frente ao Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro.| Foto: André Borges/EFE

A CPMI do 8 de Janeiro caminha para sua fase final e encerramento. No início, o governo Lula era contra a sua instauração. Após a divulgação, em abril deste ano, de vídeos constrangedores da atuação do ministro Gonçalves Dias (do GSI), rendeu-se ao inevitável e permitiu a instalação da comissão de inquérito.

As pessoas que realizaram a invasão dos prédios dos três poderes e que depredaram patrimônio público devem ser punidas na proporcionalidade de sua responsabilidade individual. Isso já está sendo feito na esfera policial e judicial, sendo pouco relevante a CPMI para esta finalidade. Todos esperam que tenham um julgamento justo. Pelo menos, neste momento, a maioria já responde em liberdade, o que me parece apropriado já que muitos cometeram excessos levados pelas emoções do momento e do ânimo da multidão.

Outro ponto importante da investigação é entender como foi possível acontecer o 8 de janeiro. Sem pretender aliviar a responsabilidade dos invasores, é forçoso reconhecer que as forças de segurança federais e distritais falharam em impedir as invasões. Caso tivessem atuado de maneira convergente ou mesmo isoladamente, não teriam tido grandes dificuldades de impedir a invasão ou pelo menos de minorá-la. A apuração das causas dessa falha é fundamental para evitar que se repita.

Até o momento, a responsabilidade pela falha tem sido atribuída exclusivamente à Polícia Militar do Distrito Federal, inclusive com alguns ex-dirigentes presos, mas falta um escrutínio melhor sobre as omissões das forças de segurança federais.

Sem pretender aliviar a responsabilidade dos invasores, é forçoso reconhecer que as forças de segurança federais e distritais falharam em impedir as invasões

A maioria dos parlamentares que compõem a CPMI é da base do governo e tem atuado para impedir esses esclarecimentos. A exemplificar, requerimentos para oitiva do diretor da Força Nacional de Segurança Pública não foram aprovados, mesmo se tratando de uma diligência simples e necessária, já que a Força Nacional estava presente na Esplanada no dia da invasão. É de se duvidar que essa falta de vontade de apurar as omissões das forças de segurança federais seja sanada até o fim da CPMI.

Assim, baseado no que já se encontra comprovado, tomo a liberdade de elencer uma série de perguntas que faltam ser respondidas sobre o ocorrido no dia 8 de janeiro:

As invasões e depredações havidas no dia 8 de janeiro foram resultado de uma ação coordenada e centralizada em um ou mais comandos, ou foi produto de uma ilusão coletiva passageira aliada ao descontrole da turba na Praça dos Três Poderes?

Tendo os órgãos federais de segurança e distritais sido expressamente avisados desde pelo menos o dia 6 acerca dos riscos de invasão de prédios públicos e de vandalismo, conforme alertas feitos pela Abin, como não foi possível, com antecedência, evitar a violência?

Tendo o ministro do GSI, Gonçalves Dias, recebido desde o dia 6 alertas de risco de violência e de invasões, inclusive no início da manhã do dia 8, provenientes do diretor da Abin, por que ele não tomou as providências para pelo menos deixar o Palácio do Planalto guarnecido pelo inteiro efetivo da Batalhão da Guarda Presidencial?

Por que o GSI enviou, no dia 6, comunicado ao Batalhão da Guarda Presidencial, responsável pela proteção do Palácio do Planalto, dispensando o reforço da segurança do Planalto nos dias 7 e 8? Caso o GSI tivesse uma informação errada sobre os riscos no dia 6, quando mandou a mensagem, por que não retificou sua posição nos dois dias seguintes, antes da invasão, e quando o cenário já era bem mais grave e os riscos se acentuaram?

Por que o GSI solicitou o envio ao Planalto de somente um pelotão do Batalhão da Guarda Presidencial – cerca de 30 soldados – às 11:54 do dia 8, e não de todos os 198 disponíveis e que estavam de prontidão?

Por que o comandante do Comando Militar do Planalto teve, ele mesmo, de tomar a iniciativa de enviar o restante da tropa ao Planalto quando os invasores já estavam em ação, sem que tivesse havido prévia solicitação do GSI?

Se a Força Nacional foi autorizada a agir pelo ministro da Justiça no dia 7 de janeiro, por que ela não foi empregada para prevenir as invasões dos prédios dos três poderes?

Por que o governo escondeu inicialmente os vídeos que mostravam a atuação frouxa do ministro Gonçalves Dias e de seus subordinados dentro do Palácio do Planalto no dia da invasão, sendo depois atropelado pelo vazamento deles à imprensa?

Tendo o ministro Gonçalves Dias sido alertado expressamente do risco de invasão e de violência, ele comunicou o presidente Lula ou outros ministros?

O ministro Gonçalves Dias mandou suprimir, de relatório enviado pela Abin à Comissão de Inteligência do Congresso, a informação de que ele era um dos destinatários dos alertas da Abin de que haveria risco de invasões e de violência, com a finalidade de acobertar a sua omissão no dia 8. Assim sendo, outros membros do governo tiveram conhecimento dessa fraude empregada pelo ministro?

Tendo a Força Nacional de Segurança Pública sido autorizada a agir pelo ministro da Justiça no dia 7 de janeiro, por que ela não foi empregada para prevenir as invasões dos prédios dos três poderes?

Tendo sido revelado que quatro pelotões da Força Nacional de Segurança Pública – cerca de 120 soldaldos – ficaram parados no estacionamento do Ministério da Justiça, e que apenas dois agiram, depois da invasões, para retirar os invasores, por que eles não atuaram desde logo para prevenir ao menos a invasão do prédio do Palácio do Planato, ao lado?

Por que o Ministério da Justiça permitiu, em uma situação de urgência e assistindo-se a tudo do prédio do Ministério, a invasão do Congresso, do STF e do Planalto, enquanto os pelotões da Força Nacional ficavam parados, sem uso, no estacionamento do Ministério?

Por que o ministro da Justiça insiste no álibi de que precisaria de autorização do governo do Distrito Federal quando há precedentes de atuação da Força Nacional na Esplanada dos Ministérios, sem que tenha havido autorização do governo distrital, em 2017, 2019, 2020 e até mesmo na posse do presidente Lula?

Por que o ministro da Justiça, quando a ele foram solicitadas as gravações das câmeras do Ministério do dia 8, não disse desde logo que não as teria conservado e, em vez disso, protelou ao máximo o atendimento dessa solicitação até culminar com a informação?

Não se trata de construir teorias da conspiração, de realizar ataques pessoais a membros do governo federal, ou mesmo de aliviar para os responsáveis pela invasão. Estas questões são objetivas e relevantes, e merecem ser respondidas ao povo brasileiro

Somando o efetivo que, naquela data, estava de prontidão – 198 soldados do BGP e 214 da Força Nacional de Segurança Pública –, seria possível evitar as invasões, dissuadir a sua ocorrência ou pelo menos em muito minorá-las. Difícil de entender, no contexto, por que ele não foi utilizado antes das invasões para proteger os prédios públicos. Por que esses efetivos, disponíveis, não atuaram?

Uma última questão diz respeito ao presidente Lula. Em entrevista para a Globo News em 18 de janeiro, ele afirmou que o 8 de janeiro teria se tornado possível por um “apagão de inteligência” do governo federal. Atualmente sabemos que a inteligência não falhou e que comunicou o que iria ocorrer a diversos dirigentes de órgãos federais e distritais, via Abin, desde o dia 6. O que falhou foi a parte operacional – na parte do governo federal, com a manutenção do BGP e da FNSP paradas e sem ação antes das invasões. Lula, no dia 8, estava mal informado e, portanto, não sabia que estava mentindo na entrevista? Ou, se ele sabia, já estava construindo um álibi para a primeira grande omissão de seu governo?

Não se trata aqui de construir teorias da conspiração, de realizar ataques pessoais a membros do governo federal, ou mesmo de aliviar para os responsáveis pela invasão. As questões acima são objetivas e relevantes. Elas merecem ser respondidas ao povo brasileiro. O governo quer silenciar. A ver.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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