• Carregando...
Entre um tiro na cabeça e o mainstream, ele escolheu uma vida no campo
| Foto:

Você sabe que Kurt Cobain era um cara cabeça aberta. Virou ídolo. Era o bonito, tímido e talentoso. Tinha dores e as adormecia com muitas drogas e remédios. Casou-se com uma roqueira deslumbrada. Fez as melhores música dos últimos 20 anos. Ficou doidão e deu um tiro na cabeça.

Você sabe que Dave Grohl era o baterista do Nirvana. Era um bobão enquanto Kurt estava vivo. Mas soube aproveitar a onda dos acontecimentos e formou a banda inflacionada Foo Fighters. Ficou ainda mais rico, lançou vários discos e continua um cara nada a ver.

Você sabe que Krist Novoselic era um baixista grande. Quando Kurt morreu tentou fazer decolar algumas bandas, como Sweet 75, Eyes Adrift e Flipper. Mora no campo e… um momento! Acho que o que aconteceu com o terceiro membro de uma das maiores bandas da história da música a maioria não sabe.

Você não sabe quem é Renato Noviello. Ele acompanha o movimento grunge desde os “tempos mais primórdios”, como diria Hermes e Renato. Deve ser uma das poucas pessoas do mundo que ainda se importa com o que acontece, aconteceu ou acontecerá em Seattle. Isso que ele tem 20 poucos anos. Então se você ficou interessado em saber o que levou Krist do grunge à granja acompanhe as linhas abaixo:

**********************

Reprodução/Krist Novoselic: Contention & Conscious
Krist com toda a pinta de blogueiro

Homem; 43 anos; 2,04 metros de altura; formado em 1984 pela Escola Secundária de Aberdeen; membro fundador do Nirvana juntamente com seu grande amigo Kurt Cobain; ativista político; presidente do Partido Democrata do Condado de Wahkiakum; escritor; cineasta; fotógrafo; blogger; apresentador de programa de rádio; disc jockey voluntariado; mestre da Granja de Grays River; fazendeiro diletante; piloto de avião; ex-pintor de interiores; ex-empregado de uma rede de fast-food mexicana; ex-trabalhador da Sears; orgulhoso descendente da Croácia; mecânico amador de automóveis Volkswagen; e presidente do FairVote, organização que tem o propósito de mudar a democracia.

Este é o currículo de Krist Anthony Novoselic, talvez um dos músicos mais esquecidos do mundo inteiro. E isso porque ele fez parte da maior banda de rock que o planeta já viu.

Como um rematado viciado em maconha e álcool, Krist muitas vezes ganhava os holofotes que pertenciam a Kurt Cobain. Pelo menos nos bastidores. Bebia muito e protagonizava hilárias histórias que poderiam render inumeráveis parágrafos neste espaço. Como a que aconteceu pouco depois do lançamento de “Bleach”, em meados de 1989, quando o Nirvana saiu em turnê por todo os Estados Unidos, a bordo de uma velha van da Volkswagen, que caía aos pedaços. No caminho de volta para casa, a banda escutava uma fita cassete dos Vaselines enquanto Krist enchia a cara. E disparava: “Todo mundo é demais! Eu amo todo mundo! Você não sabe nada sobre amor! Você não está nem aí! Você não entende!”. Depois, adormeceu. Quando acordou, soltou: “Não fale comigo, sr. Raio de Sol… não quero nada com você.”

No dia 24 de setembro de 1991, o esmagador de crânios “Nevermind” foi lançado. Nesse dia o Nirvana fez um show em Boston e Krist estrelou uma de suas cenas mais cômicas. Antes da passagem de som alguém trouxe um jogo Twister e gordura vegetal para alegrar e divertir a moçada. Chris embedeou-se, como de praxe. Ficou vestindo só sua cueca azul-marinho e espalhou a gordura em seu corpo, antes de começar a jogar. Pouco depois, pegou o tabuleiro e arremessou para muito longe. Havia uma bandeira dos Estados Unidos pendurada por ali. Novoselic a pegou e começou a se limpar. Um pouco de gordura havia escorrido pela fresta de sua bunda. É claro que Krist não se incomodou em limpar seu traseiro com a bandeira americana. Havia um ex-soldado da Marinha dos Estados Unidos no recinto, cheio de raiva e observando tudo de perto, juntamente com seus amigos bombados. Todos começaram a gritar com Krist, que teve de ir embora do clube escoltado por vários seguranças.

Hoje em dia, Krist Novoselic desabafa: “Em algumas momentos eu apenas precisava de uma válvula de escape, então fumava maconha e bebia. Nunca mergulhei em drogas pesadas. Até hoje nunca vi heroína na minha frente. Já vi pessoas chapadas de heroína. Posso dizer quando as pessoas estão chapadas de heroína. Sempre usei drogas de uma maneira mais recreativa, ou para funcionar como um tipo de remédio. Mas depois tive que parar de fumar maconha. Não podia mais fazer isso, não era mais bom para mim. Como eu conheço pessoas que fumam maconha, e que são pró-maconha… Deus os abençoe. Pensando no passado, enquanto era adolescente, talvez não tenha sido uma boa ideia fumar maconha. Se você é jovem e fuma maconha, não percebe, mas há sempre uma taxa. Um preço a se pagar. Você poderá sofrer problemas no crescimento que vai te segurar de várias maneiras. Você tem uns 18 anos e fuma maconha. Eu não acho que é uma boa ideia, e não acho que deveria ter feito isso na época, mas eu fiz, mais uma vez. Repito, por algumas disfunções pessoais que tinha.”

Apesar do depoimento, Krist não dispensa um boa caneca de Guinness enquanto faz algum show de rock.

Em março de 1994, Kurt Cobain, devido a seu grande problema com heroína, concordou em ir para uma clínica de desintoxição pela enésima e última vez. Krist Novoselic foi convocado para levar o velho companheiro ao aeroporto, rumo ao tratamento. Houve uma grande relutância por parte de Cobain, que começou dentro do carro e seguiu-se até o terminal de embarque, quando os dois se esmurraram no chão, até que Kurt conseguiu desvencilhar-se da briga e fugiu. Krist Novoselic voltou para sua casa, chorando. E, do fundo de seu coração, sabia que nunca mais veria seu grande amigo novamente, vivo. E ele tinha razão. Depois, Kurt foi convencido a ir para a clínica, mas acabou pulando o muro do lugar e voou de volta para casa. Em questão de dias, Kurt Cobain terminou tudo com um tiro na cabeça.

Depois da tragédia, poucos sabem que vida levou o grande (em pessoa e em estatura) baixista do Nirvana. Recusou-se a fazer parte do Foo Fighters, grande banda de seu compadre Dave Grohl. Em 1997, lançou o álbum Sweet 75. O “Sweet 75” era a dupla que Krist formara com a exótica cantora venezuelana Yva Las Vegas, que acabou após um ano de atividade. Segundo ele, os dois mantinham uma relação “cheia de disfunção”. Sua próxima tentativa de cair no gosto do público foi montar a ótima banda Eyes Adrift no final de 2001, juntamente com Curt Kirkwood (Meat Puppets) e Bud Gaugh (Sublime). O grupo lançou um disco em 2002 e desintegrou-se em 2003.

Depois, Novoselic envolveu-se muito com a política norte-americana. Como um bom Democrata, em 2004 escreveu e publicou o livro “Of Grunge and Government: Let’s Fix this Broken Democracy!”. Voltou à música em 2006, como baixista da banda Flipper, um grupo de punk rock adorado por Krist durante sua adolescência. Um disco novo disco foi gravado e deve ser lançado em maio ou junho deste ano. Vale lembrar que será um disco duplo, metade com gravações em estúdio, metade ao vivo. No final de 2008, Novoselic acabou saindo da banda. (Aliás, fiquem de olho no álbum, este promete.)

Fica claro, pelo menos para mim, que ele tem problemas em manter-se num grupo de rock, e não é difícil entender por quê. Dentre suas outras atividades, Krist apresenta um programa de rádio; é dono de um Cessna 182 com o prefixo N233KS; é marido de Darbury Ayn Stenderu, artista têxtil com quem casou-se em 2004; escreve toda terça para seu blog; e vive numa casa isolada no vilarejo rural Deep River, Condado de Wahkiakum, Estado de Washington, Estados Unidos.

É por essas e outras que Krist Novoselic é o cara mais legal do mundo. E se você quiser conhecer rock and roll de verdade, vá atrás do que ele fez e do que ele escuta. De Led Zeppelin a Flipper, de Beat Happening a Scratch Acid, de Nirvana a Eyes Adrift.

Para saber mais:

Krist Novoselic: Contention & Conscious” – blog de Krist Novoselic publicado na página do Seattle Weekly. As colunas são publicadas toda terça-feira.

Krist Novoselic: Of Grunge and Grange – An Oral History
– Longa entrevista concedida por Krist em outubro de 2008 para o “Projeto de Presevação do Legado do Estado de Washington”.

Come As You Are – A História do Nirvana – Livro que conta a história da banda. Originalmente publicado em 1993, só teve lançamento no Brasil em 2008. Autor: Michael Azerrad; Editora Madras; 363 páginas; formato 16×23 cm; Preço médio: R$49,00

Por Renato Noviello

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]