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Use carro, ar-condicionado e protetor solar
| Foto:
Ivonaldo Alexandre/Gazeta do Povo
Para encarar as ruas de bicicleta só se for com muito estilo, como o Aldo, que pedala pelo Água Verde e não participa de catálogos de moda

Não adianta gralhar. Bicicleta não é um dos melhores meios de locomoção para o habitante de uma cidade média-grande brasileira. Comprovei isso na prática, após uma mudança de emprego que decidi usar como uma mudança mais geral em meus hábitos diários. A mais radical de todas foi não ter mais televisão no quarto usado para dormir. Erro homérico. Pois, assim que a fila de livros acumulados ao lado da cama acabar, tenho certeza que me pegarei dormindo no sofá-cama da sala carinhosamente apelidado de Leleca, como diz a pequena etiqueta que cobre a metade da lateral do estofado.

Fiquemos agora, no entanto, concentrados na mudança que mais está mexendo comigo neste um mês e meio. A tal da bicicleta. Ela parecia a melhor opção para um cara que tem trinta anos e nunca se mexeu para tirar a carteira de motorista. Como minhas pesquisas se deram pela internet, acabei alugando um apartamento que, tecnicamente, segundo o Google Maps, seria o mais perto do local de trabalho.

Nem quero comentar que acabei escolhendo o Bronx londrinense, ou que estes mapas da internet esquecem do pequeno detalhe que existem morros e baixadas nas cidades e que um caminho de 2 quilômetros pode levar apenas 20 minutos em uma direção e quase 40 minutos na direção contrária. Eu me acharia um sortudo se o período mais longo não se desse exatamente às 10 horas numa cidade onde acham normal um dia com seus 35º C.

Existe o transporte coletivo. Mas também existe o bom senso. Se até em Curitiba, considerada há anos como modelo pelo seu sistema público de transporte, só os mais necessitados têm coragem de enfrentar a odisseia de encarar um Inter 2 às 18 horas, imagine em Londrina. Ainda não tenho base para fazer uma crítica maior à administração municipal, mesmo assim estranho o fato de não haver ônibus que possa fazer meu trajeto em um período menor que uma hora. Talvez quando mais moço, um sonhador, eu defendesse o transporte público com o mesmo entusiasmo de minha filha. Explico. Com pouco mais de 3 anos, fez sua primeira viagem de ônibus. Adorou e não quis sair mais do veículo. Ainda mais ao se lembrar que o pai sempre andava de ônibus. Vale lembrar que minha filha é linda. Tão bonita que consegue tornar um ônibus de recife, aos 100ºC, apinhado de gente, em uma imagem sublime.

E quais seriam os outros meios? Tentei ir andando por um tempo. Prefiro não justificar o que me levou a considerar uma péssima ideia andar por 40 minutos em uma avenida onde está concentrada a prostituição, o tráfico e, volta e meia, aparece um morto. Outra opção seria fazer como a Angélica e ir de táxi. Na lista de justificativas para um futuro pedido de aumento salarial.

Como se pode notar, não tive outra opção ao encarar a rotina de piloto de magrela. Agora, sim, uma crítica à administração pública. Qual o motivo de não haver possibilidade alguma de se locomover em uma cidade usando a bicicleta? Ciclovia e ciclofaixa parecem sinônimos de desocupados. Ou os administradores realmente acreditam que a população mora ao lado de um lago e trabalha na margem oposta? Todos os projetos e vias (poucas) que existem parecem só contemplar parques e lagos. Há algum mal em traçar uma via exclusiva que possa levar o proletariado de um lado ao outro da cidade sem precisar pegar um carro? Claro que há, só não dizem qual.

Sou um cara fraco e desisto rápido. Tinha uma visão que a bicicleta era o transporte do futuro. Não é, pelo menos no Brasil. Pensava nos bens físicos (minha saúde parece ter melhorado), ambientais (não polui) e econômicos (é barato) como minha filha vê os ônibus de recife.

A verdade é que a bicicleta é um dos piores meios de locomoção que o homem já inventou. E o Brasil, um país sempre antenado, identificou isso lá atrás e resolveu acabar com as pretensões de um maluco qualquer se aventurar nas duas rodas. Quem usa bicicleta chega ao trabalho suado (qual empresa tem vestiário?), com a roupa amassada (no mínimo tem que levar uma mochila nas costas) e descabelado (tem que usar capacete). Claro que se não for atropelado no meio do caminho.

Isto posto, defendo o bom e velho carro. De preferência aqueles grandões, que te dão um bom espaço interno para você curtir a vida e um bom papo com amigos. Que saudades do Landau. Com um desses não tem tempo ruim. Choveu? Dane-se. Fez sol? Ar-condicionado na veia. Congestionamento? Mais um momento de lazer.

Acredito que um dia ainda teremos a cultura do carro social, onde todos sairão de casa com seus automóveis para curtir a vida num grande e belo congestionamento, como uma festa. Do volante, os motoristas conversariam num grande chat. No painel teríamos ainda a possibilidade jogos online, como nos aviões. Nada como uma partida de pôquer no semáforo. Ainda tem serviço à francesa, como os prestativos vendedores de ameixa e amendoim vindo até as janelas. Mundo melhor não existe.

Alguns reacionários poderiam combater meu texto falando no tal do aquecimento global. A resposta é óbvia: ligue o ar-condicionado e seja feliz.

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