No mês passado, a encíclica Humani Generis, do Papa Pio XII, completou 60 anos. Por causa desse aniversário, o Wall Street Journal publicou um artigo de John Farrell sobre a encíclica, que, nas palavras do autor, “confirmou claramente que não tá conflito intrínseco entre o Cristianismo e a teoria científica da evolução”, o que é mesmo verdade. No Twitter, Michael Shermer foi um pouco mais sensacionalista e falou da “encíclica que deu permissão para um bilhão de católicos aceitarem a evolução”. Bom, permissão havia desde 1859, já que nunca foi proibido aos católicos defender a evolução. O que Pio XII fez foi ratificar essa possibilidade: Por isso o magistério da Igreja não proíbe que nas investigações e disputas entre homens doutos de ambos os campos se trate da doutrina do evolucionismo, que busca a origem do corpo humano em matéria viva preexistente (pois a fé nos obriga a reter que as almas são diretamente criadas por Deus) (…) E a ressalva que o Papa faz sequer tem relação com a teoria científica, já que Darwin nem tocou no assunto da alma.
No entanto, Farrell avisa que a encíclica não se limita a isso. Na Humani Generis, Pio XII defende o monogenismo, a teoria segundo a qual todos os seres humanos descendem de um único casal, Adão e Eva: os fiéis cristãos não podem abraçar a teoria de que depois de Adão tenha havido na terra verdadeiros homens não procedentes do mesmo protoparente por geração natural, ou, ainda, que Adão signifique o conjunto dos primeiros pais; já que não se vê claro de que modo tal afirmação pode harmonizar-se com o que as fontes da verdade revelada e os documentos do magistério da Igreja ensinam acerca do pecado original, que procede do pecado verdadeiramente cometido por um só Adão e que, transmitindo-se a todos os homens pela geração, é próprio de cada um deles. A explicação do Papa é clara: não se consegue (ou ao menos não se conseguia, no tempo de Pio XII) reconciliar a teologia do pecado original com a existência não de um primeiro casal, mas de um primeiro grupo de homens. E se apenas alguns deles tivessem se rebelado contra Deus, e os outros não?
Farrell explica que um documento da Comissão Teológica Internacional, Comunhão e serviço (2004), abre portas para a aceitação do poligenismo, ao menos em sua variante monofiletista (a humanidade descenderia não de um casal, mas de um grupo, em que todos os integrantes teriam pecado). Quanto a isso, tenho que dizer que li o documento, especialmente os parágrafos 62 a 70, que comentam as mais recentes descobertas científicas sobre a origem do mundo e do homem, ligando-as com a teologia católica, e não achei nada parecido com o que Farrell alega. Como ele também não fez nenhuma citação do texto vaticano, fica difícil confirmar o que ele diz. Enquanto isso, os estudos sobre a “Eva mitocondrial” continuam sendo feitos para verificar se toda a espécie humana descende de uma única mulher. Parece que a ciência ainda não encontrou nenhuma resposta definitiva a respeito do assunto, e as próprias pesquisas sobre a “Eva mitocondrial” e o “Adão cromossômico” merecem um post à parte. Mais um assunto para minha lista de pesquisas.
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