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Trilhos da Ferroeste: interligação com os trechos anunciados esta semana será difícil, devido à diferença entre os padrões de trilho | Cesar Machado/Vale Press
Trilhos da Ferroeste: interligação com os trechos anunciados esta semana será difícil, devido à diferença entre os padrões de trilho| Foto: Cesar Machado/Vale Press

Números

23 mil quilômetros de ferrovias no Brasil usam trilhos de bitola métrica. Há apenas 3 mil quilômetros de bitola larga – o padrão adotado no projeto que o governo federal incluiu em seu plano de concessões.

Concessões

"Estamos assumindo riscos", diz ministro

O pacote de concessões de rodovias e ferrovias anunciado pelo governo federal agradou a empresários e investidores. Como muitos trechos a serem concedidos, no entanto, estão em regiões onde o movimento de veículos e cargas não é alto o suficiente para torná-los rentáveis por si, as garantias oferecidas pelo governo terão de ser altas. "Estamos, de fato, assumindo os riscos, para reduzi-los ao capital privado e atrai-lo a vir", disse o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Fernando Pimentel. "O setor privado está acostumado a uma situação confortável, a um sistema financeiro de retornos fáceis. Não está acostumado aos riscos. Precisamos dele para realizar estes investimentos e temos de atraí-los aos poucos", disse. O governo federal, por meio da estatal Valec, se compromete, no novo modelo, a comprar a capacidade das ferrovias construídas pelas futuras concessionárias para revendê-la ao mercado.

Pacote mostra mudança de rumo

Euclides Lucas Garcia

Um dos pontos mais polêmicos do pacote bilionário de concessões em rodovias e ferrovias está no compromisso do governo de assumir o risco da demanda por transporte. Na prática, se a demanda for menor que a capacidade, a União arcará com os prejuízos. Ontem, o próprio governo admitiu que assumiu o risco (leia ao lado). Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo concordam que essa é a saída mais viável para não espantar os investidores. Eles alertam, porém, que será necessário acompanhar de perto as concessões para coibir eventuais irregularidades.

O doutor em Economia José Guilherme Vieira, professor da Universidade Federal do Paraná, diz que a lógica do setor privado estabelece que é preciso ter uma lucratividade alta para compensar o risco. Nas concessões em questão, como os vencedores serão os que oferecerem menor preço de pedágios e tarifas, o governo precisava estimular os investidores de alguma forma. "Nessas concessões, o ganhador será quem estiver disposto a lucrar o menos possível. Mas o investimento em melhorias deve ser alto, o que desestimula a participação", afirma.

Secretário-geral da ONG Contas Abertas, especializada em fiscalizar gastos públicos, o economista Gil Castelo Branco avalia que o pacote caracteriza de forma clara uma mudança de rumo, na medida em que o governo assume as dificuldades que sempre teve para investir em infraestrutura. Ele ressalta que, entre privatizar o sistema ou não realizar os investimentos, a União optou por dividir a obrigação com a iniciativa privada. "O governo vinha tentando tapar o sol com a peneira, centrando tudo na questão do consumo, sem atacar a raiz do problema. Agora, a sinalização é de que avançaremos em infraestrutura e logística, para tornar o país mais competitivo", afirma.

Largura de linha impede uso de ferrovia

Trechos previstos no novo pacote de investimentos em logística são incompatíveis com malha já existente

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  • Richa Filho: ministro ouviu e elogiou, mas não fez nada

Dos 29 mil quilômetros de malha ferroviária no Brasil, 23 mil são de bitolas métricas e cerca de 3 mil, apenas, de bitolas largas. De acordo com especialistas, a escolha pelas bitolas largas para os novos projetos não foi acertada. Para maior interação entre as malhas existentes com o plano de expansão, o ideal seria a instalação de bitolas métricas, com recuo para que, eventualmente, fossem instaladas bitolas mistas.

Para o coordenador de projetos do Instituto Tecnológico de Transporte e Infraestrutura (ITTI), Eduardo Ratton, os governos paranaenses não conseguiram modernizar as ferrovias a ponto de torná-las viáveis. Segundo ele, o trecho que liga Maracaju (MS) a Mafra (SC) vai passar por uma importante região produtiva do Mato Grosso do Sul e do Paraná, mas o desvio para a cidade catarinense deve custar caro ao Porto de Paranaguá.

O escoamento da produção paranaense e do Centro-Oeste brasileiro, feito por Maracaju (MS), passando por Cascavel até Mafra (SC), seguiria para o Porto de Rio Grande ou para Santos. A estrutura de trilhos de bitola larga favorece esse trajeto. Isso porque o trecho de Mafra a Paranaguá usa trilhos de bitolas métricas. Sem um plano de modernização de trechos importantes para o Paraná, como um novo ramal entre Guarapuava e o Litoral do estado, os principais gargalos no setor devem permanecer os mesmos.

"A opção do governo pela construção de trechos que levam ao porto de Rio Grande reflete a sucessiva incompetência dos governos estaduais em gerenciar e modernizar o porto paranaense", afirma Ratton, do ITTI. "Enquanto Paranaguá possui um único terminal de contêineres, que define o valor das tarifas cobradas, os portos de Santa Catarina, embora menores, têm conseguido atrair cargas importantes com tarifas diferenciadas e maior eficiência", acrescenta. Ratton ressalta ainda as filas de caminhões que se formam a cada escoamento de safra na BR-277, única rodovia de acesso ao Porto de Paranaguá. "O corredor de exportação de Paranaguá é muito lento. A prova disso são as dezenas de navios esperando dias para poder atracar com prejuízos que encarecem o custo".

Governo do estado foi pego de surpresa, diz secretário

O secretário de Infraes­trutura e Logística do Paraná, José Richa Filho, afirma que o governo do estado foi pego de surpresa com os anúncios do pacote de projetos logísticos do governo federal. No anúncio, dois trechos da expansão ferroviária passam pelo Paraná. De acordo com o secretário, o estado foi usado como corredor de passagem entre São Paulo e Rio Grande do Sul. "A impressão é que, se fosse possível, eles passariam as linhas por um duto pelo mar ou pelo Paraguai. Não fomos só esquecidos, fomos prejudicados", afirma Richa Filho.

O secretário evitou culpar a falta de articulação po­lítica dos ministros e da bancada paranaense sobre a presidência, mas disse que achou estranho que as reivindicações do governo do estado não tenham sido contempladas. Ele afirma que o corpo técnico do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes locado no estado apresentou uma série de projetos ao Ministério dos Transportes nos últimos dois anos. "O que achamos mais estranho é que o ministro todas as vezes nos ouviu e nos elogiou, mas efetivamente não resultou em nada", explica.

Richa afirma que o governo já articula com representantes do setor produtivo local e com a bancada na Câmara e Senado para que as demandas estaduais sejam ouvidas. Sem data marcada, o governador Beto Richa já teria solicitado à presidente Dilma Rousseff uma audiência com representantes paranaenses. Ao todo, são quatro trechos de rodovias e dois de ferrovias que foram esquecidos pelo plano nacional de expansão. "Uma das nossas demandas é o trecho anunciado entre Maracaju (MS) e Cascavel, que não foi detalhado, mas ao que tudo indica, não será no percurso ideal", lamenta. Cascavel e Guarapuava já contam com interligação ferroviária operada pela estatal Ferroeste, pertencente ao governo do estado. Até agora não há men­ção à integração entre a Ferroeste e os trechos anunciados. Será difícil, já que a Ferroeste também foi construída com trilhos de bitola métrica.

Sem qualquer planejamento de novas ligações com o litoral paranaense, Richa Filho teme que o porto de Paranaguá seja deixado de lado no segundo pacote que o governo federal vai anunciar, no fim do mês, que contemplará portos e aeroportos. "O produtor do Oeste do estado vai acabar escoando sua produção pelo Rio Grande do Sul, em vez de usar o porto do próprio estado", completa.

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