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Sede do Banco Central, em Brasília.
Sede do Banco Central, em Brasília.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A ciência econômica é conhecida como dismalscience, o que, traduzindo em bom português, significa algo como ciência do desespero ou do desânimo. A razão básica para essa qualificação é a existência das chamadas consequências não intencionais da política econômica, consequências essas que costumam ocorrer a longo prazo, sendo muitas vezes inesperadas e opostas às intenções iniciais dos formuladores da política econômica. Assim, por exemplo, o controle de preços para evitar que subam, devido à escassez do produto correspondente, tende a reduzir a produção e piorar sua escassez – e assim por diante; há muitos outros exemplos de consequências não intencionais, opostas aos desejos dos formuladores da política econômica.

O presidente Lula, no seu discurso de posse falou emocionadamente sobre a pobreza e a má distribuição de renda no Brasil, que realmente é um problema sério do país, a demandar políticas adequadas para a sua atenuação. No entanto, recentemente, Lula criticou com intensidade a independência do Banco Central do Brasil e a sua política monetária, em particular as taxas de juros no país que estão excessivamente elevadas, segundo o presidente. Ele gostaria que houvesse uma queda imediata de juros e, possivelmente, que a independência do Bacen fosse reduzida (ou, quem sabe, eliminada).

O presidente Lula deveria cuidar para que a inflação, seja ela aberta ou reprimida, não assole mais o país, tendo em vista que professa tanta e legítima preocupação com a pobreza.

O Banco Central do Brasil segue, há cerca de 20 anos, uma política de metas de inflação e gerencia a taxa de juros de forma que a inflação se mantenha em uma certa faixa; para tal, segue um protocolo de atuação conhecido como Regras de Política Monetária (uma variante das chamadas Regras de Taylor), testadas empiricamente em muitos países (inclusive no Brasil) para estabilizar a taxa de inflação em nível baixo.

A inflação elevada é um evento macroeconômico que causa grande prejuízo aos pobres, exatamente porque, em geral, eles dependem de rendimentos que são corrigidos com atraso – às vezes grandes atrasos – em relação à taxa de inflação. Os pobres têm muita dificuldade de se defender da inflação elevada, atuando, por exemplo, no mercado financeiro ou especulando com compras antecipadas de mercadorias ou serviços.

Na verdade, o presidente Lula foi derrotado nas eleições de 1994 exatamente porque Fernando Henrique Cardoso, ministro da Fazenda de Itamar Franco, implantou o Plano Real, que debelou a hiperinflação brasileira em poucos meses. As classes pobres tiveram um grande ganho devido à redução da inflação (o coeficiente de Gini brasileiro, que mede a concentração de renda, teve uma queda de quase 10% em menos de um ano; muitos analistas dizem que este foi o maior episódio de redução da desigualdade de rendas no Brasil). Então, FHC ganhou a eleição presidencial.

O presidente Lula deveria cuidar para que a inflação, seja ela aberta ou reprimida, não assole mais o país, tendo em vista que professa tanta e legítima preocupação com a pobreza. Qualquer que seja sua intenção de política econômica, acabar com a independência do Banco Central do Brasil e produzir uma política monetária “criativa, intuitiva”, fora dos protocolos exaustivamente testados de metas de inflação, é um risco grande para as pessoas economicamente mais vulneráveis. Um aumento da inflação tem a importante consequência não intencional de aumentar a pobreza e a miséria, como aconteceu na Argentina.

Antonio Carlos Porto Gonçalves é conselheiro superior do Instituto Liberal, graduado em Engenharia Industrial e Metalúrgica pelo Instituto Militar de Engenharia e Mestre e Doutor em Economia pela University of Chicago.

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