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O jornalista Breno Altman é acusado de endossar uma “fala antissemita” proferida pelo ex-presidente do PT, José Genoino, e “incitar uma caçada aos judeus”
Imagem ilustrativa.| Foto: Chris Hearn/Unsplash

Por volta de 1821, o termo “pogrom” (que na Rússia czarista significava basicamente massacre ou carnificina contra judeus) foi adotado para se referir aos ataques sofridos pelas comunidades judaicas da Rússia. Com apoio do governo, ou mesmo participação dos exércitos e forças policiais, a população local atacava cidades ou vilarejos judaicos com objetivo de saquear, matar, destruir e violentar a população. Isto acontecia por mero preconceito, sem nenhuma causa ou gatilho real.

Em paralelo, na Europa, os judeus vinham de um longo histórico de perseguições e fugas. Expulsos da Inglaterra em 1290, acusados de provocar a peste negra, convertidos à força, expulsos ou mortos pela Inquisição, a história de preconceito vivida pelos judeus da Europa desde a Idade Média, até o início do século XX é repleta de ciclos de perseguição, morte, destruição e expulsão.

Negar a um povo específico o direito de viver e se autodeterminar conforme suas necessidades de sobrevivência, é uma forma totalmente cruel de preconceito,

Com o Renascimento e o Iluminismo, alguns países passaram a aceitar judeus em suas instituições de ensino, seus exércitos e mesmo funções governamentais; no entanto, o antissemitismo fomentado pela sociedade por séculos, não desapareceu, e fez com que o preconceito aparecesse de diversas formas.

Durante todo este período, o saudosismo judaico sempre se fez presente em suas preces (que ansiavam pela redenção, pela vinda do Messias e para o retorno à Terra de Israel, conhecida por Sião). As preces judaicas sempre foram feitas com a face volta para Jerusalém, as histórias, as leis bíblicas e o imaginário judaico, sempre viram o retorno a Israel como a salvação divina para o povo de Israel.

Um caso bastante conhecido, disparador do Movimento Sionista, é o Caso Dreyfus, em 1894. O capitão francês, judeu, Alfred Dreyfus foi acusado de traição por ter entregue segredos militares da França para a embaixada alemã em Paris. Dreyfus foi condenado e preso na Guiana Francesa, por 5 anos. Nesse período, as investigações se aprofundam, e descobriu-se que o responsável pela traição não era Dreyfus, mas sim o major Esterhazy. Ainda assim, Esterhazy foi inocentado e Dreyfus permaneceu na prisão, com base em provas e documentos falsos. Isso gerou grande repercussão nos meios de comunicação francesa, especialmente nos mais antissemitas, que reforçavam as acusações contra Dreyfus pelo simples fato de ele ser judeu. A população, em suas manifestações contrárias a Dreyfus, pedia por ‘morte aos judeus’ e outros gritos de ordem antissemitas. Dreyfus foi finalmente inocentado em 1906.

Acompanhando e cobrindo o caso Dreyfus, o jornalista judeu Theodor Herzl, embora assimilado, concluiu que a solução para a aceitação do judeu na sociedade seria a criação de um Estado judeu. Isso faria com que os judeus fossem vistos como normais, e que assim como os franceses tinham a França, os alemães, a Alemanha, os judeus teriam o seu Estado, e seriam assim um povo como qualquer outro, com seu Estado nação.

Herzl então escreveu suas idéias num livro, O Estado Judeu, e promoveu o 1º Congresso Sionista, que foi um primeiro encontro de representantes judeus, de diversos países, para iniciar um movimento político com objetivo de pleitear para as demais nações do mundo o direito de criação de um Estado Judeu. O lugar almejado foi a histórica Terra de Israel, berço do povo judeu desde os contos bíblicos até sua expulsão da região pelos romanos, nos séculos I e II da era comum. A Terra de Israel era, neste momento, parte do Império Otomano, não era aspirada como nação por nenhum povo específico, e lá viviam grupos judeus (alguns que foram ao longo dos 2.000 anos de dispersão do povo judeu para a região, alguns que nunca  saíram desde a expulsão pelos romanos) e alguns grupos de beduínos árabes, nômades ou em pequenos vilarejos. Menos de 400.000 pessoas viviam na região, entre judeus, muçulmanos e cristãos, sem grandes aspirações nacionais.

Em paralelo com o movimento sionista criado por Herzl, os pogroms se intensificavam na Rússia, e grupos de judeus começaram a fugir ou serem expulsos, e vários desses se espalharam por outros países da Europa, pela Américas (especialmente Estados Unidos), e pela Terra de Israel. (A Terra de Israel era chamada de Palestina, um nome adotado pelos romanos para se referir aos inimigos bíblicos do povo judeu, os filisteus, e não por referência a algum povo moderno que vivesse na região). “Palestinos”, neste período, era a identificação dos habitantes da região independentemente de sua religião. Havia palestinos judeus, muçulmanos e cristãos.

O sionismo foi tentando se tornar mainstream no mundo judaico (no início, grupos ortodoxos, reformistas e comunistas não se identificavam com a ideia), e em paralelo, tentava se reunir com líderes e governantes dos países do mundo para conquistar apoio a esta iniciativa. Os anos se passaram, a comunidade judaica na Terra de Israel foi crescendo lentamente, e trazendo desenvolvimento para a região. Diversos emigrantes de países árabes, como Egito, Síria, Líbano e outros se mudaram para a região, onde o desenvolvimento econômico trazia novas oportunidades de emprego e educação.

Com o advento da 2ª Guerra Mundial e do Holocausto, diversos governantes limitaram a imigração judaica em seus países (incluindo Brasil e Estados Unidos), e o mundo não se mostrou solidário às vítimas do Holocausto. Grupos sionistas que viviam na Terra de Israel tentavam trazer os judeus da Europa para a região, mas sofriam restrições por parte dos ingleses, que dominavam a região desde a 1ª Guerra Mundial. Os ingleses tentavam agradas aos países árabes, que não queriam o aumento da população judaica, e, com isso, muitos judeus que tentavam fugir da Europa nazista não tinha para onde ir, e houve inclusive navios de refugiados que tiveram que voltar para a Europa, e os refugiados, para os campos de concentração e extermínio.

O fim da guerra mostrou para o mundo a urgência de se ter um refúgio para os judeus, e assim, numa assembléia da então criada Organização das Nações Unidas, foi estabelecida a divisão da Terra de Israel (ou Palestina, como continuava sendo chamada) entre os judeus e os árabes que lá viviam. Houve muito debate entre todos os grupos; havia grupos, tanto judeus, quanto árabes, que queriam a terra toda para si. No caso dos judeus, apesar das disputas internas, a aceitação à proposta da ONU foi acatada. Entre os árabes, a possibilidade de haver na região um país não muçulmano, e as promessas de os países árabes de expulsarem os judeus da região, fez com que a proposta não fosse aceita. Assim, em maio de 1948 os judeus declararam a independência do Estado de Israel, e os árabes, ao invés de declararem a independência de seu Estado, seguiram a orientação dos países árabes e apoiaram a declaração de guerra que estes países fizeram ao recém criado Estado judeu.

Não vou abordar a história do Estado de Israel após sua independência, a declaração de independência do Estado de Israel, que pede pela convivência pacífica com todos os seus cidadãos (incluindo, é claro, os não judeus), ou as reações dos árabes da região e dos países árabes após a criação do Estado.

Em resumo, sionismo é o movimento político que levou à criação do Estado de Israel, e do direito de o povo judeu se autodeterminar em sua terra ancestral, de forma a se proteger do antissemitismo. As aspirações religiosas se fundindo com a necessidade de refúgio contra a perseguição são a mola propulsora do sionismo

Sionismo é o movimento político que sonhou, defendeu e atuou politicamente para a criação de um Estado que servisse de refúgio para o povo judeu, para que este tivesse uma situação de ‘normalidade’ entre as nações, e protegesse os judeus do antissemitismo russo e europeu. O movimento sionista jamais pregou destruição ou guerra; jamais pregou um posicionamento político (direita, esquerda, centro, etc.), embora, como em qualquer grupo humano, sempre houve defensores dos mais diversos espectros políticos. O sionismo não é sobre os árabes e muçulmanos, não prega a exclusão de não-judeus, não prega guerras ou disputas territoriais.

Ser contra o sionismo, é negar aos judeus o direito de realizarem suas aspirações ancestrais, negar o direito de terem um refúgio contra as perseguições. Ser contra o sionismo é negar a um povo específico o direito de viver e se autodeterminar conforme suas necessidades de sobrevivência (ideológicas, aspiracionais, ou mesmo físicas – dada a história do antissemitismo e seu auge como Holocausto).

Negar a um povo específico o direito de viver e se autodeterminar conforme suas necessidades de sobrevivência, é uma forma totalmente cruel de preconceito, que, no caso de a vítima deste preconceito ser o povo judeu, é chamado de antissemitismo. Assim, antissionismo é antissemitismo. E assim é percebido pelo povo judeu, ou pelo menos por 99.5% dele.

Dov Bigio é diretor da Federação Israelita de São Paulo (Fisesp).

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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