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Presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), terá de revisar os termos de sua parceria política com Lula para viabilizar seu projeto de ser governador de Minas Gerais.
Presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), terá de revisar os termos de sua parceria política com Lula para viabilizar seu projeto de ser governador de Minas Gerais.| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado.

Enquanto persiste o impasse sobre a decisão do governo de contestar judicialmente as desonerações na folha de pagamento concedidas pelo Congresso a 17 setores econômicos e milhares de municípios, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ainda conta com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à sua candidatura ao governo de Minas Gerais. Mas o choque entre Legislativo e Executivo, que agora alcança o Judiciário, acrescenta complexidade ao já ousado projeto político do senador.

Na terça-feira (30), Pacheco reiterou seu protesto contra a decisão do Executivo de levar a questão das desonerações para o campo judicial, destacando-a como “um erro”. Em tom de ameaça, apontou a liminar concedida pelo ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu o benefício, como “vitória ilusória” do governo, pois ela também gera “crise de confiança entre os Poderes”. Para constranger Planalto e STF, Pacheco anunciou sessão de plenário na tarde de 13 de maio para debater dívidas previdenciárias das cidades. Lula avisou durante a celebração do Dia do Trabalhador, nesta quarta-feira (1°), em São Paulo, que insistirá até o fim para acabar com a desoneração.

O caso começou a ser julgado no plenário virtual da Corte, com quatro votos favoráveis à posição do relator, mas o ministro Luiz Fux solicitou vista, o que levará a discussão ao plenário físico, em data certa. Nesse período, a liminar seguirá em vigor, contrariando a lei aprovada pelo Congresso e afetando empresas de 17 setores que empregam juntas cerca de 9 milhões de pessoas. O Congresso recorreu semana passada no STF contra a decisão e deixou no ar o risco de retardos em outras votações. Apesar disso, o Senado confirmou na mesma terça-feira (30) a restrição ao Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), solicitada pelo governo para impedir perdas de receita.

Enquanto Pacheco ressaltava a "vitória ilusória" do governo em relação à liminar, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, expressava a sua gratidão ao senador e ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pela aprovação do Perse limitado. Segundo Haddad, o benefício traria uma renúncia fiscal anual de R$ 13 bilhões a R$ 25 bilhões, mas agora foi reduzido para cerca de R$ 5 bilhões, tornando-se viável dentro do Orçamento. “Agradeço tanto a Lira quanto a Pacheco, que trouxeram moralidade a um programa que enfrentava problemas", explicou. Além desse gesto de simpatia, também foi visto como afago ao presidente do Senado a nomeação de um indicado seu para o Tribunal Superior do Trabalho (TST) no mesmo dia.

Pacheco e Lula terão de revisar parceria política

Na noite de quinta-feira (2), Lula convidou Pacheco para um jantar com o intuito de tentar amenizar o clima de conflito. Interlocutores afirmaram anonimamente a órgãos de imprensa que a desoneração dos 17 setores e as dívidas dos estados foram tratadas e Lula teria tentado reverter o clima ruim. A reportagem não conseguiu confirmar tais relatos com fontes independentes.

Apesar dos gestos de boa vontade recíproca logo após o embate mais duro, as relações entre Pacheco e Lula ainda vão requerer uma revisão de seus termos. O cenário atual está bem diferente de quando os dois trocaram elogios em público em um evento de Belo Horizonte em 8 de fevereiro, com a presença do governador Romeu Zema (Novo), para anúncio de obras federais no estado. A situação atual também destoa do clima do happy hour oferecido pelo presidente da República no Palácio da Alvorada a líderes do Senado em 5 de março último, no qual Pacheco foi recebido por Otto Alencar (PSD-BA) como “o futuro governador de Minas”.

Foi nesse primeiro trimestre que se forjou a combinação entre Pacheco, o ministro da Fazenda e o próprio Lula para se construir uma “solução” para a retomada dos pagamentos da dívida federal pelo governo mineiro, suspensa pelo STF. Nesse jogo ensaiado, Zema foi apresentado como omisso e intransigente, enquanto Pacheco se colocou como um ator voluntarioso, a denunciar excessiva austeridade pretendida pelo governo mineiro na renegociação. O impasse continuou e arrastou consigo a situação dos demais estados muito endividados com a União – Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

O presidente do Senado, em colaboração com o seu principal aliado em Minas Gerais e correligionário Alexandre Silveira, ministro das Minas e Energia, além de uma coordenação com o governo central, empreendeu esforços significativos para influenciar a situação da dívida pública de Minas Gerais, a qual totaliza R$ 165 bilhões. Suas intenções incluem a federalização de empresas estatais mineiras e a instituição de um incentivo de abrangência nacional para todas as unidades federativas que quitarem metade de seus débitos. Essas medidas proporcionariam um alívio financeiro imediato o caixa estadual.

Governador e adversário se preparam para 2026

Com grande popularidade no mandato para o qual foi reeleito, Zema precisou dar provas mais claras de que está buscando o diálogo com Lula e a equipe econômica para encontrar uma saída para a questão da dívida federal do estado, rompendo a tese de que as diferenças ideológicas o impedem de negociar. Até mesmo a federalização das maiores estatais mineiras, as quais prefere privatizar, foi aceita como objeto de negociação.

Em paralelo, Zema tenta emplacar inicialmente a candidatura de seu vice Matheus Simões (Novo) para a sua sucessão em 2026. Não por acaso, o “professor Simões’ tem intensificado as suas agendas pelo estado e liderado o diálogo com a base governista na Assembleia Legislativa e se envolvido na espinhosa negociação da dívida mineira com a União.

Pacheco, por sua vez, tem tratado de forma direta nas articulações envolvendo o PT nas eleições municipais em Minas Gerais. O senador atuou para que o seu partido, o PSD, abdicasse de candidaturas próprias em cidades do interior para reforçar campanhas petistas. A legenda deverá apoiar, por exemplo, as prefeitas de Contagem, Marília Campos (PT), de Juiz de Fora, Margarida Salomão (PT), ambas pré-candidatas à reeleição. Em Belo Horizonte, o PSD apoia a reeleição do seu filiado Fuad Noman, que não tem aparecido bem nas pesquisas.

Essa é mais uma movimentação orientada pela formação de um futuro palanque comum para sua candidatura ao Palácio da Liberdade e para a campanha de reeleição de Lula. Essa empreitada também tem como um dos seus artífices o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, presidente licenciado do PSD estadual. A expectativa é que o PT indique o nome do vice na chapa de Pacheco para o governado mineiro. Outras ações em favor de transferências de recursos federais para prefeituras governadas por amplo espectro partidário, com emendas parlamentares e verbas de ministérios, complementam o engajamento eleitoral desse grupo político em 2024 e 2026.

Governo teme ações de Pacheco como candidato

Lula avisou a cúpula do seu partido que precisa ampliar o arco de alianças em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do País, contando com Pacheco como candidato à sucessão de Zema. Nas últimas semanas, contudo, algumas posturas do presidente do Senado têm preocupado o entorno de Lula, que teme retaliações dele e os efeitos de pautas bomba, com destaque para a proposta de emenda à Constituição (PEC) que promove reajustes salariais reais e automáticos para juízes e outras categorias. No jantar com Pacheco, Lula teria tentado convencê-lo a dar menos atenção a essa pauta.

Nascido em Porto Velho (RO), mas criado em Minas, onde fez carreira no meio jurídico e na política, Pacheco é visto como “político mineiro” em razão dos gestos aparentemente calculados e o discurso em favor da conciliação de contrários. Contudo, ele tem colecionado posições dúbias em relação ao chamado ativismo judicial e na agenda do governo para buscar um desafiador equilíbrio fiscal. A proposta que defende o fim das decisões monocráticas de ministros do STF está parada na Câmara e o término do benefício que permite a saída temporária de presos em regime semiaberto, as “saidinhas”, foi em parte vetada por Lula.

Segundo o cientista político e consultor eleitoral Paulo Kramer, o governo não tem o que reclamar de Pacheco, pois graças a ele a agenda econômica de Haddad andou, com foco no aumento de receitas para fazer frente às fragilidades do arcabouço fiscal, também aprovado pelo Congresso. Além disso, a despeito das falhas de articulação política do Planalto, a reforma tributária avançou, bem como a sua regulamentação prevista para este ano.

“Contudo, até mesmo o Pacheco tem de dar satisfação para sua base, seja ela o colegiado de 81 senadores que ele representa, seja a instituição Congresso que preside, ou mesmo o eleitorado do estado que o elegeu em 2018”, observou. Os posicionamentos do presidente do Senado visam melhorar sua imagem perante o mesmo perfil de eleitor que votou nele, de centro-direita e direita.

Neste ambiente tenso, nem Pacheco, que depende do apoio do Planalto para avançar com sua plataforma política, nem o presidente da República, que conta apenas com uma maioria instável no Senado e com o respaldo do Judiciário para enfrentar pressões e aprovar as suas propostas, se beneficiam. Para o político e diretor da Action Consultoria, João Henrique Hummel, os frequentes embates entre os três poderes estão se tornando uma rotina perigosa, revelando uma tentativa do governo de testar os limites de seu controle sobre a agenda nacional, enquanto também dá mostras de sofrer derrotas no Congresso, a exemplo do adiamento de sessões para avaliar vetos presidenciais. “Será que Lula está disposto a correr o risco de ser atropelado pelo Legislativo, ignorando que ainda tem dois anos e meio de mandato pela frente? É uma incógnita interessante”, ponderou.

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