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A maldição de Dorian Gray. Ou: O hedonismo e a morte do desejo
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Luiz Felipe Pondé tem batido bastante nessa tecla da busca de uma saúde perfeita e da eternidade física como sintomas do mal moderno. “Adultescentes” que se recusam a amadurecer, a reconhecer a finitude da vida e também sua decadência física, ou que acreditam no “sexo livre” como caminho da libertação: esses têm sido alvos de vários textos do filósofo.

Hoje não foi diferente. Sua coluna da Folha usou Dorian Gray, o mais famoso personagem de Oscar Wilde, para esfregar em nossas caras essa realidade muitas vezes dura e cruel, da qual, porém, não temos escapatória. Aqueles que pensam o contrário serão as maiores vítimas dessa crença falaciosa. Seguem alguns trechos:

A imortalidade é para os deuses. Em nós, ela seria uma deformação, mas nem por isso deixaremos de procurá-la e construí-la. Muitas vezes, quando vejo paquitas velhas andando pelas ruas, lembro de Dorian Gray e sua aposta na juventude eterna.

A propósito, nada deixa filhos e filhas mais envergonhados do que pais e mães que querem parecer jovens como eles. Um ridículo de doer. Impressionante como, à medida que a vida se torna mais longa, a alma se torna irrelevante.

[…]

Dorian, eternamente jovem e belo, come todo mundo, viaja pelo mundo, come todo mundo, bebe todas, come todo mundo, mergulha no ópio, come todo mundo e volta para casa anos depois, eternamente jovem, belo e saudável.

Mas fracassa: não suporta tanta “felicidade”. Só bobo “acredita” no desejo, mas, se você nunca levou o desejo ao extremo da realização, talvez não tenha noção do custo desse fato: “O tédio é o único pecado para o qual não há perdão”, dizia nosso grande escritor irlandês.

Se o hedonismo apresentado por Oscar Wilde no romance trai a afetação de quem vivia antes da broxante revolução sexual dos anos 60, ainda hoje não desistimos de apostar numa forma de hedonismo, aquele que podemos definir como “safe”: faço tudo, mas com camisinha e sem tabaco.

Wilde provavelmente experimentaria um enorme tédio hoje em dia, maior do que em seus anos vitorianos, porque então podíamos dar a desculpa da ignorância: hoje sabemos que já nos deixaram desejar tudo e descobrimos que não desejamos mais nada.

[…]

Wilde nos legou como herança a aposta não de que nós seríamos Dorian Gray, jovem atormentado pela descoberta do que o deuses sempre souberam (que necessitamos da dor, da morte e do sofrimento como formas de humanização), mas sim seu retrato: um rosto que recolhe a grotesco de um mundo clean, “safe”, teen e maníaco pela saúde.

Crescer dá trabalho. Mas a alternativa é muito pior…

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