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A cabeça política do típico empresário brasileiro: o exemplo de João Doria
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Após uma entrevista de João Doria na revista Época, que gerou muita revolta nos meios conservadores, alguns adeptos de teorias conspiratórias passaram a reafirmar com mais empolgação que o prefeito é um “agente do socialismo fabiano” infiltrado pelo PSDB na direita para impedir a vitória de Jair Bolsonaro, o legítimo representante da direita brasileira. Tudo faria parte de uma grande estratégia gramscista para manter o poder com a esquerda.

Muita calma nessa hora! Nem Bolsonaro é o legítimo representante da direita brasileira, a menos que por isso se entenda apenas aquela nacionalista e antiliberal, nem Doria é um socialista fabiano. O prefeito simplesmente não tem um arcabouço teórico consistente, e segue seus instintos, o bom senso e, infelizmente, uma (de)formação intelectual ao longo de décadas de exposição aos nossos jornalistas.

Meu amigo Paulo Figueiredo escreveu um comentário sobre a “verdadeira” cabeça de João Doria, que seria em vários aspectos a cabeça política do típico empresário brasileiro. Concordo com ele. Via de regra, o empresário brasileiro é um ignorante em filosofia política, pois bebe de uma fonte corrompida, que é a nossa grande imprensa. Eis alguns pontos destacados por ele:

Doria não sabe o que é fabianismo; Doria não sabe a diferença entre globalismo e globalização (assim como Guga Chacra); Doria não sabe o que diz a Escola de Frankfurt; Doria não sabe o que é gramscismo; Doria não sabe direito quem é e o que diz Saul Alinski; Doria acha que o comunismo acabou; Doria acha que a esquerda e a direita têm boas ideias; Doria acha que a esquerda se preocupa com as pessoas mais pobres; Doria acha que o Islã é uma religião da paz como qualquer outra; Doria não sabe que o Partido Democrata americano e Obama são de esquerda; Doria acha que o George Soros é só um empresário; Doria nunca leu nem uma linha de Edmund Burke, Alexis de Tocqueville, Russel Kirk, Roger Scruton ou mesmo Friedrich von Hayek, Mises, Milton Friedman, John Stewart Mil, Ayn Rand e a lista continua; Doria não sabe quem é Andrew Breitbart e nunca entrou no Breitbart.com; Doria lê a Folha e o Estadão todos os dias, assiste GloboNews e não perde o Jornal Nacional; Doria acha que Trump é autoritário, mas não sabe que defende o Federalismo, porque não sabe bem nem o que é Federalismo; Doria gosta do Papa Francisco e acha que ele está “abrindo mais a igreja para os tempos modernos”; Doria acha que ser “progressista” é bom; Doria acha que ser social-democrata significa ser democrata e se preocupar com “o social”; Doria acha que o governo pode ser promotor e regulador da economia; Doria gosta da palavra “liberal”, mas não gosta do termo “conservador”; Doria não sabe que “liberal” tem significados diferentes em inglês e português.

Esse é um bom resumo da mentalidade do empresário médio brasileiro, que se informa pela Folha, Estadão, Valor e GloboNews, além da CNN e o NYT (e às vezes o WSJ). Não é tanto sua culpa pensar assim, e mais dos “formadores de opinião”, dos jornalistas que ocupam essas redações e manipulam os fatos ou abusam da própria ignorância.

Afirmar que Doria é um “fabiano consciente” tentando salvar o PSDB e a esquerda da “verdadeira direita” é uma tremenda besteira! Doria, assim como os heróicos empresários brasileiros, é um executor, um bom gestor, alguém pragmático e com senso prático, capaz de sobreviver e prosperar em um ambiente hostil aos negócios como o nosso. Mas não se deve exigir dele muita profundidade teórica em filosofia política.

Paulo Figueiredo o compara ao próprio Trump nesse sentido, e conclui:

Isso significa que seria um mau presidente? Não… necessariamente. Neste sentido, a inconsistência de Doria é muito parecida com a de Donald Trump, que, por conta disto, foi abandonado pelos ‘conservadores puro sangue americanos’ – alguns, já arrependidos.

Uma diferença entre ambos é que Trump foi aprendendo bastante ao longo da longa campanha e se cercou de conservadores de verdade (como Steve Bannon), que aos poucos foram lhe dando mais robustez e uma visão mais consistente de mundo. Também entendeu que a mídia de esquerda é doente e passou a chamá-los de “Fake News” e ignorá-la.

Não sabemos se Doria será sequer candidato a presidência, mas, se for, é uma das melhores alternativas que temos na mesa até agora. É um homem de bom senso e com capacidade executiva. Como fiz com Trump, estou menos preocupado em colocar rótulos e consistência ideológica e mais interessado no que ele vai se propor a fazer de fato. Errou feio até agora, mas ainda há um longo processo de aprendizado para um político de primeira viagem.

Torço para que Doria aprenda que a guerra em que ele está se propondo a entrar tem lado. E que ache o seu Steve Bannon o quanto antes.

Não tenho tal pretensão, mas como alguém que já foi chamado pela respeitada revista “Foreign Affairs” de “Breitbart brasileiro”, posso ao menos oferecer ao prefeito meus cursos sobre liberalismo na Kátedra. Tanto “Trajetória das Ideias Liberais” como “Civilização em Declínio” podem elucidar diversas dessas questões, mostrando as bases da teoria liberal ao longo do tempo e como certos “liberais” vêm distorcendo tudo mais recentemente, o motivo pelo qual acredito que liberais clássicos podem e devem beber de fontes conservadoras (de boa estirpe) também.

Espero que Doria vá em busca de mais informação independente fora do circuito de nossa mídia tradicional, para que possa entender melhor a essência da verdadeira guerra cultural do mundo moderno. Seu bom senso aponta para o liberalismo, mas sua inconsistência teórica o torna refém de manipulações grosseiras da imprensa vermelha e “fake news”. Em vez de descartá-lo de vez, o ideal é redobrar o esforço em lapidar sua mente, dando-lhe matéria-prima para que possa filtrar melhor quais bandeiras merecem apoio, e quais devem ser rejeitadas.

Rodrigo Constantino

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