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Catalunha e o direito de secessão
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Deu no GLOBO: Catalães fazem cordão humano de quilômetros por independência

Cerca de 1,5 milhão de pessoas formaram nesta quarta-feira uma corrente humana de 400 quilômetros na Catalunha para pressionar o governo central espanhol pela independência da região autônoma. O cordão, que ligou as praias do sul de Tarragona até a localidade francesa de El Pertús – na fronteira – passando por 86 municípios, foi organizado durante meses e contou com o apoio do governo de Artur Mas. Imagens de TV locais mostraram durante meia hora a gigante formação da cadeia de pessoas vestidas de amarelo, que passou pelos pontos mais conhecidos da região – como a costa catalã, o Estádio de Nou, a Basílica da Sagrada Família, a Rambla e a catedral de Girona – e pelas estradas N-II e N-340.

A presidente da Assembleia Nacional da Catalunha, Carme Forcadell, assegurou em seu discurso após a finalização do cordão que só existem dois caminhos possíveis para a região: “Se submeter ao Estado espanhol e desaparecer como povo ou a independência”. E cobrou do governo uma consulta popular no próximo ano.

– É hora de se comprometerem (o governo) a convocar uma consulta para 2014, com uma pergunta única e clara – disse.

Segundo o jornal “La Vanguardia”, a cadeia humana se uniu às 17h14m (12h14m, no horário de Brasília) e permaneceu por alguns minutos. Após o fim da corrente, o departamento regional do Interior divulgou um relatório afirmando que a polícia não registrou nenhum ato de violência durante o protesto e que o ambiente da manifestação foi “festivo e familiar”. O movimento foi inspirado em uma manifestação similar de 1989, que ajudou as repúblicas bálticas da Estônia, Letônia e Lituânia a conseguirem a independência da União Soviética.

A manifestação também coincidiu com o Dia Nacional da Catalunha, quando ativistas realizam atos pela separação da região. No ano passado, uma mobilização de cerca de 1 milhão de pessoas em Barcelona fez com que Mas endurecesse sua posição pela independência da Catalunha.

Os “pais fundadores” dos Estados Unidos reconheciam, em sua maioria, o direito de secessão das colônias. Nenhuma devia ser obrigada a permanecer na federação contra a própria vontade. No Canadá, Quebec de tempos em tempos flerta com plebiscitos pela secessão. Ao liberalismo, a ideia parece fazer todo sentido.

Resgato um texto antigo sobre Lord Acton e o federalismo, que explica melhor os motivos dessa simpatia liberal pelos secessionistas.

O poder corrompe

“A liberdade não é um meio para um fim político mais elevado; ela é em si mesma o mais elevado fim político.” (Lord Acton)

Muitos conhecem o famoso ditado “o poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente”, mas poucos conhecem mais sobre as idéias de seu autor, o historiador católico e liberal John E. E. Dalberg Acton, ou simplesmente Lord Acton.

No livro The History of Freedom foram reunidos vários de seus escritos, e sua análise sobre a liberdade na antiguidade, logo no começo da obra, tem inestimável valor. Importantes lições podem ser extraídas através da experiência dos povos antigos, tais como os judeus, atenienses e romanos. O que Lord Acton faz é justamente filtrar essas preciosas lições.

Para Acton, o progresso da liberdade sempre enfrentou seus inimigos naturais, pela ignorância e superstição, pela sede de conquista, pelo desejo de poder etc. Lord Acton conclui que em todos os tempos os amigos sinceros da liberdade foram raros, e que seus triunfos foram devidos a minorias, que teriam obtido sucesso se associando a aliados cujos objetivos freqüentemente diferiram dos seus próprios.

Mas Acton reconhece que tais associações são sempre perigosas, e algumas vezes desastrosas para a própria liberdade. Ainda assim, o historiador entende que os interesses hostis à liberdade causaram menos ferimentos a ela do que as falsas ideias. As instituições que tentam preservar a liberdade acabam dependendo das ideias que as produzem e do espírito que as preserva. Por isso a preocupação com os pensamentos dos homens é crucial. A causa da liberdade, segundo Acton, deve mais a Cícero e Sêneca, por exemplo, do que às leis de Licurgo.

Por liberdade, Lord Acton entendia a garantia de que todo homem deve ser protegido ao fazer aquilo que ele acredita ser seu dever contra a influência da autoridade e maiorias, costumes e opinião. Portanto, o teste mais certeiro pelo qual podemos julgar se um país é realmente livre seria a quantidade de segurança desfrutada pelas minorias.

Como um dos primeiros exemplos usados para ilustrar o que tinha em mente, Acton usou a história do “povo escolhido”. O governo dos israelitas era uma Federação, unida sem uma autoridade política, por acordo voluntário. O princípio de autogoverno estava bastante presente em cada grupo e, pelo que afirma Acton, não havia privilégios nem desigualdade perante a lei. Lord Acton respeita o fato de que uma constituição cresce de suas raízes, por um processo de desenvolvimento, e não por uma mudança essencial. Essas características estariam presentes nas origens do povo judeu.

Um segundo caso mencionado por Acton é o de Atenas, na Grécia Antiga. Cita mais especificamente Sólon, o “mais sábio de Atenas”, assim como um “gênio político da antiguidade”. As reformas introduzidas por Sólon foram fundamentais para a ampliação da liberdade na região. As classes mais pobres eram excluídas, e Sólon as deu voz política ao garantir a eleição de magistrados.

Isso introduziu a ideia de que o homem deve ter direito a uma voz ao selecionar aqueles aos quais irá confiar seu futuro e sua vida. O governo pelo consentimento acima do governo compulsório. Era admitido o elemento de democracia no estado. O único recurso conhecido contra as desordens políticas era a concentração de poder, e Sólon escolheu o caminho contrário, da descentralização. Na essência da democracia estaria obedecer nenhum mestre além da lei. A liberdade individual tinha em Sólon um grande amigo.

A democracia, porém, não pode ser vista jamais como simples ditadura da maioria. Para Lord Acton, se é ruim ser oprimido pela minoria, é ainda pior ser oprimido pela maioria. Afinal, existe uma reserva latente de poder nas massas a qual, caso seja despertada, a minoria raramente consegue resistir.

A lição que se pode tirar das experiências passadas a esse respeito é que o governo da classe mais numerosa e poderosa representa um mal da mesma natureza que uma monarquia. Pelos mesmos motivos, portanto, exige instituições que servem para proteger o governo dele mesmo, na tentativa de permitir o reino permanente da lei contra revoluções arbitrárias de opinião. Lord Acton considerava que o perigoso não era alguma classe específica ser inadequada para governar, pois para ele todas as classes eram inadequadas.

O poder deve ser descentralizado, e por esse motivo Acton defendia o Federalismo. Se a distribuição de poder entre as várias partes do estado é o meio mais eficiente de restringir uma monarquia, a distribuição de poder entre vários estados é o melhor caminho na democracia. Multiplicando os centros de governo ele promove a difusão do conhecimento político e a manutenção da opinião independente. Afinal de contas, o poder corrompe, e o poder absoluto corrompe absolutamente!

Em tempo: se o abuso de poder da esfera federal continuar nesse ritmo, vai fazer sentido falar em secessão de Brasília por aqui, se já não faz!

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