Bons ventos
Especialistas apontam as características da cultura orgânica:
Produção pequena
Apenas 2% das 374 mil propriedades agrícolas do Paraná produzem pelo sistema orgânico. O número é pequeno, mas significativo para a agricultura familiar, que deixa de ter contato com agrotóxicos e evita a contaminação do solo. O sistema tem vantagens econômicas para os pequenos produtores, que deixam de se endividar comprando insumos químicos e conseguem vender a produção por preços maiores. No entanto, a menor produtividade e a dificuldade de produção em grande escala impede que o sistema seja adotado por médios e grandes produtores.
Preço
A produtividade menor da agricultura orgânica é uma das razões para os preços mais altos. No entanto, os preços são menores nas feiras orgânicas, onde produtores vendem diretamente para os consumidores. Nas feiras, o valor dos orgânicos é de 30% a 50% mais caro que o dos convencionais. Nos supermercados, o preço pode custar de 100% a 300% mais. Para levar os orgânicos às gôndolas, o agricultor tem que passar por esquemas de venda e atravessadores que acabam aumentando o valor do produto.
Segurança alimentar
A agricultura orgânica pode ajudar populações em risco no acesso a serviços de assistência técnica, crédito rural diferenciado e incentivos governamentais. As comunidades quilombolas, por exemplo, frequentemente estão instaladas em áreas de preservação ambiental. O sistema orgânico pode ser uma alternativa para que produzam tanto para o autoconsumo quanto para a venda de excedentes, diminuindo a dependência dessas populações da ajuda do governo.
Fontes: Iniberto Hammerschmidt, engenheiro agrônomo do Emater; José Marfil, produtor e integrante da Rede Ecovida de Agroecologia; Ângela Martins, presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional e integrante da Rede de Mulheres Negras do Paraná; Eugenio Stefanelo, professor de Economia Rural na UFPR.
Serviço
Confira onde estão as feiras de produtos orgânicos em Curitiba. Ao todo, são 12 pontos de venda, funcionando das 7 da manhã ao meio dia, com exceção do Mercado Municipal e da feira da prefeitura:
Diariamente
Mercado Municipal de Curitiba
Segunda-feira, das 7h às 14h, terça-feira a sábado, das 7h às 18h, e domingo, das 7h às 13h.
Rua da Paz, 608 (setor Mercado Orgânico) Centro
Terças-feiras
Campina do Siqueira
Rua São Vicente de Paula, ao lado do Terminal de Ônibus
Portão
Praça Hildegard Schmah, entre as ruas Calixto Rasolini e Caetano Marchesini (estacionamento do Museu Metropolitano de Artes)
Quartas-feiras
Emater
Rua da Bandeira, em frente à Emater Cabral
Praça do Expedicionário
Rua Saldanha de Gama - Centro
Prefeitura
Das 7h às 14h. Rua Papa João XXIII, ao lado da Prefeitura Municipal de Curitiba Centro Cívico
Quintas-feiras
Igreja do Cabral Praça São Paulo da Cruz
Avenida Paraná esquina com Rua Bom Jesus
Praça do Japão
Avenida República Argentina esquina com Avenida Sete de Setembro Batel
Sábados
Jardim Botânico Praça da Itália
Rua Dr. Jorge Meyer Filho, ao lado da Igreja Nossa Senhora de Lourdes
Passeio Público
Rua Presidente Faria Centro
Praça da Ucrânia
Avenida Cândido Hartmann esquina com as ruas Padre Anchieta e Capitão Souza Franco Bigorrilho
Santa Felicidade Praça Piazza San Marco
Via Vêneto, em frente à Rua da Cidadania Santa Felicidade
Os amigos da recepcionista Joyce Sponchiado, 70 anos, nem imaginam que convidá-la para almoçar em casa pode acabar em flagrante. Consumidora de alimentos orgânicos desde que morava em Palmeira das Missões, no Rio Grande do Sul, Joyce garante que é capaz de abrir uma geladeira e identificar a presença de alimentos que foram produzidos com a ajuda de agrotóxicos. "Esse aqui não. Vamos chegar aos 130 anos", adverte os amigos, enquanto tira de sua frente um maço de rabanetes. "Já convenci a Almira, a Olívia, a Idê e o seu Paulinho. E costumo checar se estão usando mesmo." A recepcionista puxa o assunto sempre que pode e chega a levar hortaliças orgânicas para incentivar colegas de trabalho.
Joyce faz parte do grupo de adeptos da cultura dos alimentos orgânicos em Curitiba. A rede é heterogênea e engloba produtores, cooperativas, consumidores, organizações não governamentais e iniciativa pública. Uma de suas particularidades é a ausência de filtros econômicos e culturais. Embora o consumo orgânico seja uma prática dos mais informados, não raro um pequeno agricultor é parceiro de debates de um catedrático.
Ainda que não necessariamente articulados e agindo de maneiras diferentes, os curitibanos pró-orgânicos defendem a mesma causa. "Não é só a comida que está em jogo. Tem toda a preocupação com o meio ambiente e com novos hábitos. Isso sem contar as relações pessoais cultivadas a partir da conversa direta com o produtor", defende Gabriel Gallarza, 32 anos, consumidor de orgânicos há três.
Eles ainda são poucos. Segundo a Secretaria Municipal de Abastecimento, em 2008, 20 mil pessoas circulavam pelas feiras de orgânicos de Curitiba semanalmente. Mas o grupo cresce. De lá para cá, as vendas no primeiro trimestre aumentaram entre 11% e 15% ao ano. No Paraná, a demanda por esses alimentos cresce entre 30% e 50% anualmente, de acordo com o Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater).
O aumento da procura pelos orgânicos é uma boa notícia para Moacir Darolt, engenheiro agrônomo do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar). Darolt faz o tipo militante em tempo integral. Nem o título de doutor em Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), nem a presença certa como palestrante em congressos do ramo lhe roubam o prazer de panfletar e propagar os ganhos da cultura orgânica. É autor do livro Agricultura orgânica: inventando o futuro, está escrevendo outro sobre formas de aproximação entre consumidores e produtores, produz guias e cartilhas educativas e ainda cultiva seus próprios orgânicos em uma pequena propriedade.
"Para que o movimento cresça, é importante atingir diferentes setores da sociedade, como a escola e a universidade", afirma Darolt. Segundo o pesquisador, o trabalho não se limita a falar sobre os benefícios da agricultura orgânica para a saúde e para o meio ambiente: o desafio é educar para o consumo. Isso significa diversificar a cultura alimentar, resgatar a noção de épocas dos alimentos e até estimular a produção de hortas em casa, por exemplo. "As pessoas estão acostumadas a comer as mesmas coisas o ano inteiro. Há uma redução na diversidade na cultura alimentar. E é uma redução para culturas com maior nível de resíduos de agrotóxicos."
Orgânicos serão um nicho de mercado
Para o professor de Economia Rural da UFPR Eugenio Stefanelo, a produção de orgânicos não vai substituir a agricultura convencional e será sempre um nicho de mercado, podendo chegar ao patamar máximo de 10% da produção total. A menor produtividade e a dificuldade de produção em grande escala impede que o sistema seja adotado por médios e grandes produtores. "Quem vai continuar é o pequeno produtor, com disponibilidade de mão de obra familiar e em função da pequena produção, que tem que ter um plus de preço", explica.
Para atingir a produtividade da agricultura convencional no sistema orgânico, seriam necessárias áreas maiores, colocando biomas nativos em risco. Stefanelo lembra também que os dois sistemas apresentam problemas quando mal- aplicados. "A agricultura orgânica mal-feita contamina o lençol freático com coliforme fecal. A convencional, contamina com nitrato", explica. "Temos que tirar da cabeça das pessoas o estereótipo de que a orgânica é boa e a convencional é ruim. As duas dependem das práticas que usam", diz.
Sempre aos sábados no Passeio Público
O Passeio Público é o principal ponto de encontro da rede da cultura orgânica em Curitiba. Aos sábados pela manhã, entre mexericas e tomates, um estande atrai frequentadores de velha e nova data. No espaço, a Associação dos Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná (Acopa) divulga práticas de alimentação saudável e de comércio solidário. Uma das voluntárias é Gessi Zampieri, encarregada dos passeios e cursos promovidos pela associação.
Enquanto entrega cartilhas, vende camisetas e agenda os passeios promovidos pela Acopa pelas rotas de produção, Gessi atende conhecidos que param na barraca. "Formamos uma família que se encontra todo sábado e toma um chimarrão", conta Gessi, sobre uma conversa que não acontece nos mercados e feiras convencionais.
Além de eliminar intermediários que encarecem os produtos orgânicos, a aproximação entre os consumidores e produtores permite, por exemplo, que o agricultor José Marfil, produtor de orgânicos desde 1994, explique aos clientes o motivo de os preços dos tomates estarem altos entre abril e novembro a hortaliça está no período de entressafra. Como quem produz também comercializa, a procedência do alimento é garantida.
Outra presença frequente na barraca da Acopa é Ralph Miller, um dos fundadores da entidade. Sobre como conheceu a cultura dos alimentos orgânicos, Miller dá uma resposta de peso histórico: "Quando eu tinha a sua idade, só tinha orgânico", afirma o engenheiro aposentado, nascido em 1921. Ele diz ter visto a introdução dos insumos químicos na agricultura. "Foi a época da célebre revolução verde. Hoje, vemos que a coisa não é o que se pensava", relembra Miller.
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