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Ficha técnica
  • Currículo: graduado em direito na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG); pós-graduado em pela Escola de Magistratura do Paraná; Escola Superior do Ministério Público do Estado Paraná; e em direito constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional; mestre em direito econômico e social. Juiz do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF 4), atualmente atua como secretário-geral do CNJ.
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Entre as promessas do Código de Processo Civil (CPC) estão maior celeridade e respeito à ordem cronológica. Mas essas possibilidades podem se confrontar, segundo o ponto de vista do juiz Fabricio Bittencourt da Cruz, secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Durante o Seminário “O Direito Processual Civil nos Tribunais Superiores”, realizado em Foz do Iguaçu, em março, o jurista apresentou uma análise segundo a qual a necessidade de se respeitar a ordem cronológica pode, muitas vezes, impedir o juiz de deliberar sobre assuntos que seriam de resolução mais fácil. Cruz concedeu uma entrevista ao Justiça & Direito e, além de falar sobre o novo CPC, comentou sobre a importância de estudos de estatísticas no CNJ e sobre seu tema de pesquisa acadêmica, as medidas provisórias.

Qual sua opinião sobre o novo CPC?

Uma mudança necessária, corajosa, histórica e também paradigmática. Agora, cabe a nós, aqueles que trabalharão com o novo CPC, conformá-lo à realidade vivenciada no dia a dia, seja pela via doutrinária, seja pela via da jurisprudência. O espaço é muito rico para essa reflexão. Estamos nesse momento, foi dada a largada e nós podemos no Judiciário, via jurisprudência e, na academia, via doutrina, balizar a amplitude e os limites das regras do novo CPC.

Em palestra proferida durante o seminário, o senhor manifestou a opinião de que a ordem cronológica – prevista no novo CPC – vai dificultar a administração da Justiça. Como chegou a essa conclusão?

Veja, toda conclusão depende da premissa da qual você parte. Se nós partirmos de uma perspectiva macro, que são os 91 milhões de processos pendentes de julgamento no país para 16 mil juízes, isso de acordo com dados do último [relatório] Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), nós temos que colocar outro componente, não é um único processo antigo, e sim toda uma lógica que deve justificar a chamada administração da Justiça. O magistrado tem que administrar pessoas, recursos e milhares de processos. Nessa administração dos processos, vem as grandes causas, as causas complexas e eu, como juiz federal, posso dizer isso com muita tranquilidade. Quando chega uma causa complexa, ela precisa ser maturada, o juiz precisa pensar, estudar, captar subsídios para fazer uma boa decisão e isso não é da noite para o dia. Como um juiz pensa? 24 horas por dia. O magistrado deixa a sede da subseção e é impossível não pensar nas causas de impacto, nas ações civis públicas, ações populares, de improbidade administrativa. Essas não se conseguem decidir da noite pro dia, essas maturam um certo tempo no gabinete. Pela ordem cronológica pura e simples, o que vai acontecer? A necessária de maturação de uma tese dentro do gabinete, retardará o julgamento de inúmeras outras que são singelas, são simples e muitas vezes demandariam muito menos tempo e energia, mas com resultado imediato para as partes, que também esperam seu julgamento.

Então o caso que levaria talvez algumas horas para ser resolvido vai ter que esperar, muita vezes, até meses por causa da fila?

O artigo 12 [do novo CPC] tem várias exceções, entre essas exceções, não se falou em momento algum sobre complexidade e essa é a minha preocupação. As exceções são muito bem-vindas e são as mais variadas e importantes, mas a complexidade não está ali e esse é um ponto para o que eu chamo atenção, que realmente é o que torna difícil a atuação jurisdicional e, ao mesmo tempo rica, porque é ali que nós damos a nossa contribuição enquanto verdadeiros magistrados.

Como o senhor disse, há uma série de exceções previstas, não se corre o risco de a ordem cronológica se tornar uma exceção?

É uma excelente pergunta, se nós analisarmos todos os incisos que tratam de exceções, num primeiro momento a pergunta é justamente essa, ao que parece, a própria lógica do artigo 12 trata de um quantitativo de exceções maior do que a regra. A regra, realmente, será exceção.

Com relação ao Justiça em Números, do CNJ, qual é o impacto que esse estudo tem na realidade prática do Judiciário?

O CNJ, que completou dez anos, surgiu com a reforma do Judiciário, com a Emenda Constitucional 45, em 2005. Hoje, nós estamos criando planejamento, nós vemos o Judiciário com base em números. Isso é um ganho maravilhoso em termos de gestão. Hoje nós sabemos, por exemplo, que dos 91 milhões em estoque no Poder Judiciário nacional, 32 milhões são processos executivos fiscais. Desses 32 milhões de processos, a cada 100 novo que chegam na Justiça, apenas 9 saem no ano em que chegaram. Ou seja, é o tipo de demanda que representa o maior índice de congestionamento no Poder Judiciário. Eu poderia lançar uma opinião acadêmica aqui: estamos num momento de refletir sobre os destinos da execução fiscal. Só assim ganhamos tempo para julgar outras causas.

O senhor pesquisa medidas provisórias, qual a sua linha de estudo?

Faço doutorado na faculdade de direito da USP, no departamento de direito do estado. A minha especial preocupação acadêmica é a medida provisória com uma base empírica, o que hoje representa esse instituto, que é novo, começou em 1988, mas que nós ainda não o reconhecemos da maneira adequada.

Qual seria essa maneira adequada?

Analisar tudo que já foi feito para desenhar o perfil institucional da medida provisória como ela é, não como nós queríamos que ela fosse.

As medidas provisórias não acabam levando o Executivo a ter mais poder do que estava previsto?

Olha, até a Emenda Constitucional 32, de 11 de Setembro de 2001, nós tínhamos o fenômeno da chamada reedição da medida provisória. Então, se por um lado, o Congresso Nacional não conseguia acompanhar a evolução numérica e quantitativa das medidas que eram editadas pelo Poder Executivo, os presidentes da República de 1988 a 2001 se utilizavam do expediente da reedição. Então, nós tivemos medidas reeditadas 80 vezes, se nós traduzirmos isso em meses, estamos falando em quantos anos, já que a duração era de 30 dias? Em 2001, houve uma guinada institucional, a medida provisória passou a ter vigência de 60 dias e se proibiu a reedição, admitindo-se apenas uma única prorrogação de mais 60 dias. Isso, por um lado, foi muito celebrado. Foi uma conquista histórica do Congresso Nacional. Mas a emenda 32 trouxe uma outra consequência que foi o trancamento da pauta legislativa. Então, à medida que os presidentes da República editavam medidas que não eram analisadas em 45 dias pelo Congresso, as pautas da Câmara dos Deputados e do Senado ficavam trancadas. Isso fez com que o Congresso ficasse inoperante durante vários períodos, sem poder votar emendas, sem poder tratar de vários outros assuntos legislativos porque uma medida provisória estava na ordem do dia . Esse assunto ainda está em aberto e o estudo acadêmico da medida provisória não deve se furtar à realidade. Não posso buscar apenas em livros e opiniões, tenho que analisar as que estão aí para ver o que isso representa na nossa realidade.

Mas pode ser uma boa alternativa, se utilizada com sensatez?

A argumentação teórica é que existem assuntos tão urgentes que não se pode esperar o processo legislativo ordinário, isso não se pode desconsiderar.

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