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Paridade de preços do etanol e gasolina ganhou competitividade após o fim da política de subsídio da gasolina realizada pelo governo federal, durante a gestão de Dilma Rousseff. | Albari Rosa/Gazeta do Povo
Paridade de preços do etanol e gasolina ganhou competitividade após o fim da política de subsídio da gasolina realizada pelo governo federal, durante a gestão de Dilma Rousseff.| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

A cada dez abastecimentos de veículos de passeio, quatro motoristas pedem etanol. A estimativa revelada pela União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA) à Gazeta do Povo, por meio do diretor técnico da entidade, Antonio de Padua Rodrigues, é consequência de uma série de fatores.

Há pouco mais de dois anos, o pedido pelo álcool nos postos de combustíveis era inferior a 30% dos abastecimentos. Agora, o “etanol bombou”. A participação do hidratado e anidro (o primeiro vendido na bomba e o segundo misturado em até 27% da gasolina) na frota de veículos de passeio e de carga leve atingiu 50,2% em outubro, o maior nível histórico.

E não é à toa: preço e rendimento vêm colaborando. A conta tradicional recomenda que o preço do etanol não supere 70% da gasolina para que seja a melhor opção. “Mas a paridade é de 73%”, garante Padua Rodrigues.

Paridade de preços: etanol gasolina

Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) mostram que mesmo em regiões em que o etanol costuma sair mais caro, como a Norte-Nordeste, a paridade média de preços foi de 72,5% em outubro contra 79,6% no mesmo mês do ano anterior. Segundo a Unica, nessas regiões, o consumo em outubro recorde para a região, 213 milhões de litros, 140% superior ao mesmo período do ano passado.

Nas principais regiões produtoras e consumidoras, os números também cresceram: no Centro-Sul, em outubro foram consumidos 1,82 bilhão de litros - aumento de 41,3% em comparação a outubro de 2017. A paridade média foi de 62,2% contra 66,3% no comparativo, estima a ANP.

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“Estados com política de ICMS favorável, como Goiás, São Paulo e Minas tiveram crescimento expressivo. No caso do Paraná, em outubro do ano passado tivemos 113 milhões de litros vendidos e neste 163 milhões de litros”, afirma o diretor da Unica. Na opinião dele, muitos motoristas já perceberam a vantagem do biocombustível.

Instrutor de direção em Curitiba, Wagner Soares Marques é um desses motoristas e garante: a autoescola em que trabalha sempre dá preferência para etanol nos carros. Em seu carro particular não é diferente: Marques só utiliza etanol porque o veículo apresenta melhor desempenho com o biocombustível. “Até fevereiro eu misturava, mas depois de uma regulagem ficou bem melhor o etanol. Se eu uso gasolina, chega a dar problema”, diz.

Política de preços: etanol versus gasolina

O executivo considera que, durante o governo Dilma Rousseff (PT), o setor sucroalcooleiro foi prejudicado pela antiga política de preços de combustíveis. À época, o preço da gasolina era subsidiado e repassado defasado ao consumidor – a Petrobras chegou a importar gasolina mais cara para vender mais barato no mercado interno, o que favorecia o preço do combustível fóssil.

“A intervenção do governo federal que matou a Petrobras também matou o setor [de produção de cana] com o congelamento [de preços da gasolina] entre 2008 e 2014, que perdeu participação relativa. Neste ano e no ano passado, o mercado voltou a funcionar. Quem matou a Petrobras foi o governo do PT, e a hora que congela a gasolina, também acaba congelando o preço do etanol, mas não consegue controlar o preço a produção do setor, que foi perdendo capacidade e reduzindo a oferta de cana”, afirma Padua Rodrigues.

Wagner Soares Marques , instrutor de autoescola: tanto no carro particular quanto nos da empresa a preferência é pelo uso do etanol à gasolina.Arquivo pessoal

Com o reajuste diário adotado em julho de 2017, conforme a variação do preço do petróleo no mercado internacional, o preço da gasolina subiu. Com isso, o preço do etanol também pôde ser reajustado mais facilmente, e o mercado se tornou mais competitivo - em parte também devido ao programa Renovabio (Política Nacional de Biocombustíveis), opina o diretor da entidade.

O programa adota metas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa para distribuidoras e inclui biocombustíveis em combustíveis fósseis. Um dos objetivos é estimular a cadeia. Quando foi assinado o decreto de regulamentação, o então ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, reconheceu que o setor sucroalcooleiro estava sendo prejudicado pela antiga política de preços de combustíveis e que precisava de incentivos.

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“Enfrentamos momentos muito difíceis, em setores que sofreram muito. O setor de etanol, principalmente, talvez tenha sido o que mais sofreu”, disse à época o ministro.

O presidente Michel Temer considerou a lei uma agenda de modernização: “Diria, pelo entusiasmo que vejo da plateia e dos que me cumprimentaram, dos que se manifestaram, penso que o Renovabio, de todos os atos, será um dos mais importantes desse governo”, disse Temer, que assinou o decreto em um evento em Ribeirão Preto, região com forte produção de cana-de-açúcar.

Acordo de Paris e desempenho do setor

Padua Rodrigues espera que o Renovabio siga alinhado às metas de emissão de carbono do Acordo de Paris para 2028 e 2030, com aumento no uso de combustíveis limpos e renováveis, para que o consumo de gasolina, no mínimo, se mantenha no patamar atual e que o de biocombustíveis como o etanol cresça.

O acordo internacional chegou a ser motivo de polêmica quando o governo eleito de Jair Bolsonaro anunciou a desistência de abrigar a Conferência do Clima da ONU em 2019 e foi criticado pelo presidente da França Emmanuel Macron, que chegou a suspeitar do não cumprimento.

“Precisamos ter um programa de longo prazo e temos capacidade para ampliar a produção dos atuais 610 milhões de toneladas de cana [por ano] para 900 milhões em 2028. São menos de dois ciclos de cana. Isso tudo vai depender da rentabilidade e retorno”, diz Padua Rodrigues.

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A rentabilidade do setor, contudo, pode não ser tão boa em 2019 segundo relatório da consultoria Finch Ratings e divulgado no jornal Valor Econômico na última quinta (7):

“O fluxo de caixa livre da maioria dos emissores deve continuar negativo, impedindo redução da dívida em 2019. A ausência de grandes altas dos volumes moídos, devido à disciplina dos investimentos em 2018, e o contínuo enfraquecimento do real devem impedir melhorias significativas na alavancagem da maioria das empresas”, escreveu no relatório Claudio Miori, analista sênior da agência de rating.

O diretor da Unica Padua Rodrigues contesta: para ele, os resultados das empresas precisam ser vistos separadamente, e não representam o setor como um todo.

“Quem vai ter uma situação menos favorável é aquela [companhia] que não teve flexibilidade e foi obrigada a fazer açúcar a qualquer preço”, contesta o executivo. O açúcar ‘compete’ com o etanol nas usinas e é uma opção de mercado. “Quem saiu do mercado de açúcar exportação e foi para o etanol está melhor. No geral o setor não está perdendo. Muita gente soube fixar preço, câmbio, mix de produção”, garante Padua.

Atualmente, a divisão de produção com a moagem de cana está em 36% para açúcar e 64% etanol no Brasil.

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