Lindomar e a cabra que produz 4,5 litros/ dia. Ao lado, Marineide e Raimundo sob um umbuzeiro.| Foto: Fotos: Jonathan Campos / Gazeta do Povo

As chuvas foram embora em fevereiro e só devem voltar daqui dois meses. Mesmo assim, após oito meses de seca, o Sertão continua produzindo alimentos e movimentando pequenas agroindústrias na região de Juazeiro (BA). Na primeira parte da viagem pela região, a Expedição Agricultura Familiar verificou que sistemas que aproveitam ao máximo os recursos da caatinga abrem novas perspectivas ao setor.

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Lindomar Pereira produz leite e carne de cabra numa propriedade de 70 hectares de sua família. Ele cultiva palma – cacto forrageiro de origem mexicana comum no Nordeste brasileiro – com água de um poço artesiano. Os cerca de 70 animais exigem o cultivo de dois hectares. O corte de palma é diário e o cuidado com os animais, constante. Sem o poço artesiano, a terra não produziria naturalmente alimento para o rebanho

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O pecuarista se especializou a ponto de vencer concurso de produção de leite, com a marca de 4,5 litros numa única ordenha. Faz seleção genética dos animais no próprio sítio. Sua meta é ampliar a ordenha, que hoje alcança 20 litros e rende cerca de R$ 50 ao dia.

Indústria

A extração de frutas da caatinga permite a estruturação de agroindústrias na zona rural. O umbu se transforma em polpa, que vira suco, licor e geleia.

Uma pessoa tira até R$ 50 por dia colhendo umbu no campo natural. A renda se multiplica com processamento da fruta. Uma unidade de beneficiamento produz 2 toneladas de polpa/ano, com uma estrutura que custou R$ 100 mil.

“O umbu dá muito produto. Se a gente se organiza, dá para trabalhar o ano todo sem parar”, afirma Raimundo de Lima. A coleta se concentra entre janeiro e fevereiro. Já está faltando matéria-prima neste ano.

Uma saca de 45 quilos rende R$ 10 a R$ 40, dependendo do interesse dos atravessadores. Beneficiado, o alimento rende R$ 160, conforme os agentes do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), que presta assistência técnica e facilita acesso a recursos de programas que apoiam o agricultura na caatinga.

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A região, por outro lado, não ignora a importância da água. A produção e a qualidade de vida seriam bem melhores se houvesse, por exemplo, mais recursos para construção de poços artesianos, que custam cerca de R$ 10 mil. O acesso ao crédito e a novos mercados são desafios na caatinga.

Num ano mais seco que o normal, a região do semiárido está em apuros, mas estaria muito pior se não fosse a contribuição do Rio São Francisco, que nasce em Minas e corta o semiárido brasileiro.
Como as chuvas são inexpressivas desde fevereiro, a paisagem seca tem suas características destacadas, produzindo imagens impressionantes.
Roseli e Cristiano Silva produzem uva em Petrolina graças a um projeto de irrigação colocado em prática 48 anos atrás. Foi a primeira iniciativa do gênero, que teve de ser reformulada para dar resultados.
Valdenor Silva e Terezinha de Souza completam 45 anos de união fortalecida pelas dificuldades enfrentadas no Sertão. Eles saíram de São Paulo e conseguiram estruturar produção de frutas juntos em Pernambuco. Agora, com renda familiar recuperada, a sensação é de alívio.
Boa parte das mangas que chegam aos principais centros de consumo do Brasil sai de região extremamente seca, graças a irrigação com água do Rio São Francisco.
Irrigação ainda pode ser aperfeiçoada para que consumo de água seja menor, conforme a Embrapa Semiárido.
Roseli Silva a uma semana da colheita de uva. Parreiras permitiram que família recuperasse renda perdida durante década de dificuldades.
Um cacho de uva da variedade Itália Melhorada normalmente rende 600 gramas, mas chega a 1 quilo nas melhores safras.
Girassol é um alternativa em estudo na região do semiárido. O que falta de água sobra de energia solar.
Projetos de irrigação foram implantados nos dois lados do Rio São Francisco. Trabalhadores que fazem colheita e raleamento, por exemplo, atravessam as águas do Velho Chico diariamente para ir de casa ao serviço.
A maior feira da agricultura familiar do Nordeste, a Feira Semiárido Show, ocorreu na última semana. Produtores ainda sentem falta de exposição mais centrada nas culturas irrigadas, com apresentação de máquinas e novas tecnologias.
Casa de máquinas de unidade de captação de água do São Francisco. Cada projeto tem seu ponto de retirada. Canais levam água até as propriedades rurais, dedicadas principalmente à fruticultura.
As águas do São Francisco são tradicionalmente calmas. E, com a seca, ficam praticamente paradas sempre que não há vento, mesmo nos pontos de captação.
O São Francisco continua sendo canal de transporte d e pequenas cargas. Hidrovia foi intensamente usada na colonização do Brasil, principalmente no trecho entre a Bahia e Minas Gerais.
No fim de um dia de trabalho, mulheres de Petrolina (PE) chegam na margem norte do São Francisco voltando para casa.
O trabalho na fruticultura envolve homens e mulheres na região da caatinga. Na foto, trabalhadora que estava retornando para casa depois de um dia de serviço em parreiras de uva.
Água é bombeada do São Francisco para canais que permitem a irrigação dos pomares.
Expedição Agricultura Familiar percorre região da represa de Sobradinho, onde reservatório está a menos de 6% de sua capacidade.
Período seco deve continuar até dezembro. E reserva só será restabelecida quando chover também em Minas Gerais, onde nasce o São Francisco.