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Representantes dos setores de cana-de-açúcar e etanol são contra a possibilidade de redução na alíquota do imposto de importação sobre o biocombustível dos Estados Unidos. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estuda a medida como forma de amenizar os impactos das chamadas tarifas recíprocas que o governo norte-americano promete anunciar nesta quarta-feira (2).
Hoje o Brasil aplica uma tarifa de 18% sobre o etanol importado dos Estados Unidos, enquanto sobre o produto brasileiro incide em média 2,5% de imposto na entrada em território norte-americano.
A discrepância no tratamento da troca comercial do biocombustível entre os dois países foi citada diretamente pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em fevereiro, quando foi assinado o memorando determinando a imposição das tarifas recíprocas.
Na segunda-feira (31), o Escritório do Representante Comercial dos EUA (USTR, na sigla em inglês) voltou a citar a taxação brasileira sobre o etanol norte-americano em um relatório em que analisa barreiras e políticas comerciais de mais de 40 países, além de blocos econômicos, como a União Europeia e o Mercosul.
Para evitar o aumento abrupto sobre o etanol exportado para os Estados Unidos, o governo brasileiro negocia reduzir a tarifa de importação do biocombustível norte-americano, fabricado a partir do milho, diferentemente da produção brasileira, majoritariamente derivada da cana-de-açúcar.
A medida ainda poderia forçar uma queda de preços no mercado brasileiro, inclusive da gasolina, em razão da mistura obrigatória de etanol anidro, em um momento de inflação de alimentos e combustíveis, que afeta diretamente a popularidade do chefe do Executivo. A iniciativa, contudo, é rejeitada pelo setor sucroenergético.
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À Gazeta do Povo, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica) informou estar “acompanhando as discussões em andamento” e que compartilhará sua avaliação do tema “assim que houver definições concretas”.
Alguns dias atrás, no entanto, o presidente da entidade, Evandro Gussi, se disse contra a hipótese de uma redução na tarifa sobre o etanol dos Estados Unidos. Para o setor, não há razão para estimular a entrada do bicombustível americano, produzido a partir do milho e com maior emissão de carbono.
“Não está faltando etanol no Brasil. Resolvemos o problema da entressafra [de cana] com etanol de milho”, afirmou Gussi na 9.ª edição do evento Abertura de Safra de Cana, Açúcar e Etanol.
O presidente da Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), José Guilherme Nogueira, segue o mesmo discurso, contrário à redução da tarifa. “O setor não quer ser moeda de troca para fazer qualquer tipo de negociação”, disse, em entrevista à Exame.
“A gente sabe que os negociadores, ao negociarem tarifas de importação, podem fazer alguma coisa que pode impactar algum setor. É importante proteger os acordos que já existem”, acrescentou.
Apesar de estar no centro da discussão sobre a imposição das tarifas recíprocas pelos Estados Unidos, a exportação de etanol para o mercado norte-americano representa pouco mais de 1% da produção brasileira.
De acordo com a Unica, foram produzidos 35,8 bilhões de litros de etanol na safra 2023/2024 de cana-de-açúcar. Desse total, cerca de 440 milhões tiveram como destino os Estados Unidos.
Para Gussi, caso a Casa Branca aplique de fato a tarifa de 18% sobre o etanol brasileiro, a consequência será um aumento dos custos internos dos Estados Unidos, sem impacto imediato aos produtores brasileiros.
O principal destino do etanol exportado pelo Brasil em território norte-americano é o estado da Califórnia, em razão de compromissos de redução de gases do California Air Resources Board, agência governamental local destinada ao controle da poluição do ar e do combate a mudanças climáticas.
“O americano chega a ter o triplo de emissões do que o etanol brasileiro. Não teria lógica essa tarifa de equivalência, já que os produtos são diferentes. Então, para cumprir as metas de redução de emissões lá na Califórnia, eles precisam do etanol brasileiro”, afirmou Gussi, ao jornal “O Estado de S.Paulo”.