Emparedado pelos caminhoneiros, o governo Temer precisou rebolar para encontrar dinheiro que subsidiasse o diesel. Está rebolando para cumprir a meta fiscal deste ano. E o próximo ou a próxima presidente terão de fazer o mesmo.
Não há solução fácil para as contas públicas. Melhor dizendo, não há solução que não desagrade a algum grupo de interesse.
Veja o caso das renúncias fiscais. É imposto que o governo decidiu não cobrar para beneficiar este ou aquele setor, eleitor ou financiador de campanha. Uma montanha de dinheiro que a União deixa de arrecadar todo ano. E em geral prefere deixar por isso mesmo, para não irritar certos setores, eleitores e financiadores de campanha.
Há quem defenda que é melhor manter dinheiro nas mãos de empresas, entidades e pessoas físicas do que repassá-lo ao governo. A questão é que, quanto menor é a carga tributária dos escolhidos, maior acaba sendo a da maioria que não desfruta desse tipo de incentivo.
O Tribunal de Contas da União (TCU) e o próprio Tesouro Nacional já alertaram para as falhas nos programas de benefício tributário. Mais de 80% deles não têm data para acabar, o que significa que continuam existindo mesmo que não deem retorno que justifique a benesse. Metade não tem um órgão gestor. E, mesmo quando ele existe, em geral não avalia se o programa funciona bem ou se deve ser revisto ou mesmo extinto. Não há aprendizado.
Duas semanas atrás, o TCU aprovou um novo relatório sobre o tema, no qual constatou que as falhas apontadas anteriormente não foram corrigidas, e que Congresso e governo continuam concedendo desonerações sem demonstrar seus benefícios. Pelo jeito, é de interesse dos envolvidos que tudo permaneça como está.
Mesmo quando toma atitude, o governo o faz pelas razões erradas. Há pouco Michel Temer e companhia ‘reoneraram’ em parte a folha de pagamentos, desmontando benesses concedidas pelo governo Dilma, e mudaram as regras para grandes fabricantes de refrigerante, que terão menos créditos tributários (isso se o lobby que fazem em contrário não der frutos). Essas mudanças, no entanto, só ocorreram para compensar uma nova desoneração – a redução de impostos sobre o diesel.
O risco de novas concessões é grande. A greve dos caminhoneiros serviu para mostrar que o governo é ainda mais fraco do que se pensava e fará o necessário para agradar descontentes capazes de parar o país ou algo assim. Os afagos podem não vir na forma de mais desonerações, mas, por exemplo, com o perdão de antigas dívidas tributárias – como ocorreu com R$ 17 bilhões em contribuições à Previdência devidos por produtores rurais, representados por uma bancada ruralista que, no ano passado, ajudou Temer a se livrar de denúncias na Justiça.
Quanto custam as renúncias fiscais
No ano passado, as renúncias fiscais da União somaram R$ 276 bilhões, segundo estimativa da Receita Federal. Esse dinheiro cobriria quase toda a folha de pagamentos do funcionalismo federal (R$ 284 bilhões em 2017). Ou pouco mais de dois anos de despesas dos ministérios da Saúde e Educação (R$ 129 bilhões no ano passado, somados).
Neste ano, serão mais R$ 283 bilhões em desonerações. E seguiremos nessa toada, a julgar pelas estimativas que o Fisco anexou ao Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do ano que vem. Conforme essas projeções, o governo federal abrirá mão de:
– R$ 303 bilhões em impostos em 2019, o equivalente a 4% do Produto Interno Bruto (PIB) e 20,3% da arrecadação federal;
– R$ 325 bilhões em 2020 – 4% do PIB e 20,6% da arrecadação;
– R$ 342 bilhões em 2021 – 3,9% do PIB e 19,3% da arrecadação.
Quem vê tamanha generosidade pensa que o país está de boa com suas contas, o que não é o caso. A meta deste ano é de fechar com um déficit primário de R$ 159 bilhões. Se temos déficit primário, significa que estamos gastando mais do que arrecadamos antes de pagar os juros da dívida. E que estamos pegando dinheiro emprestado para cobrir as despesas primárias e também para pagar os credores, o que naturalmente faz a dívida crescer ainda mais rápido.
A última vez que sobrou dinheiro de imposto para pagar parte dos juros foi em 2013. Desde então, ninguém pode dizer que a dívida pública é a culpada de nossas mazelas, muito menos que metade da arrecadação de impostos é destinada aos credores. Desde 2014, estamos torrando tudo e mais um tanto antes mesmo de lidar com nosso endividamento.
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