Eventos Bom Gourmet
Congresso reúne a nata da gastronomia
Ovacionados pelo público como se fossem popstars – e cada vez mais estão próximos a isso –, os nove chefs integrantes do G11 encerraram o primeiro dia do congresso Semana Mesa SP, nesta segunda-feira (3), em São Paulo, com uma ode à biodiversidade. No dia anterior, os membros do G11, um conselho de chefs que reúne, entre outros, o brasileiro Alex Atala, o peruano Gaston Acurio, o catalão Ferran Adrià, o espanhol Joan Roca, o francês Michel Bras, o japonês Yukio Hattori, o mexicano Enrique Olvera e o diretor do Basque Culinary Center Joxe Maria Aizega, estiveram com chefs brasileiros em um pequeno congresso fechado para discutir o futuro da gastronomia. Diferentemente dos quatro anos anteriores, este encontro não resultou em um documento, mas em um conselho: valorizem a biodiversidade de sua região.
Durante o domingo, cada um dos chefs participantes apresentou seu trabalho com ingredientes locais e pequenos produtores. A chef Manu Buffara participou do encontro e falou sobre o mel de abelha nativa e sua pesquisa no litoral paranaense. “Foi um momento para apresentarmos estudos nos quais estamos trabalhando e quais são os produtos das nossas regiões. Cada um dos chefs participantes mostrou um pouco da sua diversidade”, disse.
Na palestra de encerramento do primeiro dia do evento, Alex Atala definiu como será o bom profissional do futuro como um cozinheiro interdisciplinar, que entende de física, química e outras ciências. Para Michel Bras (apresentado por Atala como o “nosso ídolo maior”), cada cozinheiro deve ser responsável por “defender um pedaço do paraíso. Cada legume ou erva se desenvolve de acordo com a situação, clima, terra e cultura específicas”. Sobre o futuro da gastronomia brasileira, Joan Roca foi elogioso: “Se a relação entre público, cozinha e produtor depende de amor à terra e aos ingredientes, então o Brasil será uma potência gastronômica de primeira ordem, porque o Brasil tem muito amor”, disse.
Primeiro dia do Semana Mesa: valorizar a tradição e mudar a legislação
No ciclo de palestras Mesa Tendências, muitos chefs subiram ao palco com seu fornecedor para explicar a história do ingrediente e como é feita a produção, seguida de uma demonstração culinária. A mensagem de todas era a mesma: é preciso valorizar a tradição que os pequenos produtores mantém viva e lutar para mudanças na legislação.
O chef Guga Rocha abriu o evento. Ele mostrou uma receita de camarão defumado com creme de queijo de cabra Arupiara, da Fazenda Carnaúba, do sertão paraibano, servido com fufu (feito de inhame, aipim e banana), um bolinho de origem quilombola. Os queijos da fazenda são de leite cru e são proibidos de serem comercializados fora do estado pela legislação brasileira. Guga não economizou palavras e insinuou em uma apresentação de PowerPoint que o governo brasileiro é hipócrita. “Proibir é mais fácil, você não precisa dar assistência ou incentivo ao pequeno produtor. Só em Minas temos 30 mil famílias produtoras de queijo de leite cru, mas só 23 conseguem comercializar”, disse.
Outro resgate de tradições em tom de “protesto” foi do chef Jefferson Rueda, do Attimo, que encenou com Cristina, sua fornecedora de galinha caipira, o preparo de uma polenta com galinha ao molho pardo. Enquanto uma equipe arrumava a cozinha, o público podia ver pelo telão Jefferson e Cristina nos bastidores tirando o sangue da galinha. O resgate da receita caipira foi descrito pelo chef como “na roça, prato de festa, no restaurante, ato clandestino”.
O chef Argentino Antonio Soriano e o caçador Joaquim Schittko falaram sobre carne de caças e como é difícil a aceitação do público ao saber que o animal foi abatido dessa maneira ou saber que a carne não é suína, bovina ou frango. “Estamos acostumados a ver o caçador como um homem mau, que mata animais. Existe uma humanização dos animais e isso cria uma rejeição à carne de caça. Mas de onde as pessoas acham que vem a carne [encontrada no açougue]?”, questiona. Ao que ele mesmo credita ser a distância entre o consumidor e a origem do produto – tanto animal quanto vegetal. E como reverter essa situação? “Como cozinheiros, temos que mostrar o que há [de novidades, de caminhos], quais são as possibilidades de ingredientes e preparos que existem”.
Food trucks e Slow Food
Circular pela 11.ª edição do Semana Mesa é se deparar com expositores de toda parte do Brasil. No hall do prédio do Senac, expositores com amostras de iogurte grego, livros sobre gastronomia à venda, representantes de marcas de panelas, eletrodomésticos e louças. Do lado de fora, food trucks com hambúrgueres, comida peruana, macarrão e filas enormes de estudantes de gastronomia, curiosos, jornalistas e palestrantes.
Os pequenos produtores estão contemplados nos estandes da feira Farofa, boa parte representada por convívios do Slow Food do Brasil. Lá é possível encontrar geleias, sucos e caponatas de cambuci paulista ou de casca de banana, rapadura paranaense em sagu de abacaxi e crumble de maçã, pipoca de feijão verde, queijos de leite cru do sertão paraibano, moquecas de palmito babaçu ou de aratu (uma espécie similar ao siri), entre outros resgates. Bem próximo fica a estrutura do Mesa Ao Vivo, um espaço de demonstrações culinárias e degustações de pratos preparados por chefs de todo o Brasil. Três grandes profissionais de Curitiba passam por lá: Manu Buffara fala de farinhas e barreado na segunda e na quarta-feira, Celso Freire e Ivan Lopes cozinham para o público.
*A jornalista viajou a convite do evento