Um dos maiores sucessos do cinema nacional em 2007, com quase 400 mil espectadores, Ó Pai, Ó foi rejeitado na Região Sul. Pouca gente assistiu ao filme, achando que "era Bahia demais". E é mesmo. A boa notícia para quem quiser conferi-lo agora, que está sendo lançado em DVD, é a seguinte: apesar de ser uma ode a Salvador e seus habitantes, é também uma obra ficcional capaz de interessar terráqueos de qualquer nacionalidade. Basta colocar de lado os preconceitos.

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Inspirado numa peça teatral encenada pelo Bando de Teatro do Olodum nos anos 1990, Ó Pai, Ó, de Monique Gardenberg (de Benjamin), tem inegável molho regional – no caso, o sotaque e a música baiana, a partir do ambiente do bairro histórico soteropolitano do Pelourinho.

Misto de comédia musical e sátira social, o longa conta a história de Roque (Lázaro Ramos, de Madame Satã), aspirante a cantor que, como a maioria dos moradores do Pelourinho, dá duro para viver, sem carteira assinada, fazendo um bico aqui e outro acolá.

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Mas a graça do filme, apesar do já comprovado talento do protagonista, está mesmo na galeria de personagens coadjuvantes, que formam um instigante mosaico humano: Neuzão (Tânia Tôko), a dona lésbica de um boteco pé-sujo; a imigrante desiludida Psilene (Dira Paes), que retorna à casa, da Suíça; e o motorista de táxi Reginaldo (Érico Brás), dividido entre a mulher grávida (Valdinéia Soriano) e o amante, o travesti Yolanda (Lyu Arisson) são algumas dessas figuras coloridas e intencionalmente carnavalizadas.

Como contraponto a essa fauna humana, um dos achados do filme é dona Joana (Luciana Souza), uma mãe de família evangélica e rígida, que serve como uma espécie de síndica do cortiço onde grande parte dos personagens vive. Ao mesmo tempo em que fiscaliza e crítica o comportamento alheio, ela se digladia com a tentação de largar a Bíblia e cair na folia – até porque a história se desenrola durante o carnaval.

Os filhos de Joana, os meninos Cosme (Vinicius Nascimento) e Damião (Felipe Fernandes), estão no limite entre o lúdico e o crime, passando o dia na rua, dizendo para a mãe que vão ao culto religioso. Na verdade, ocupam-se com trambiques e até pequenos furtos na feira.

Esse confronto entre realidade e fantasia é constante, do princípio ao fim da trama. E, talvez por isso, o filme seja tão profundamente brasileiro em sua essência. GGG