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Marco Antônio Braz dirige o grande elenco, com Joelson Medeiros, Aru França e Claudia Mello |
Marco Antônio Braz dirige o grande elenco, com Joelson Medeiros, Aru França e Claudia Mello| Foto:

O delicado fio da comédia reflexiva

De viagem marcada para Curitiba, onde apresenta a peça A Alma Boa de Setsuan, sucesso nos palcos paulistas, no próximo fim de semana, Denise Fraga conversou por telefone com a Gazeta do Povo.

Leia a entrevista

  • Indicada ao Shell de melhor atriz, Denise Fraga já foi premiada pela APCA pela atuação como Chen Tê

Sua mãe sempre dizia: "Gentileza gera gentileza." E, no entanto, às vezes até Denise Fraga acabava por duvidar dessa máxima. Porque gentileza pode gerar abuso, e o medo de, ao oferecer a mão, tomarem-lhe o braço. "Na correria do dia-a-dia, a gente é convidado cada vez mais a agir duramente para que não abusem de nós. Temos um convite diário a viver em bolhas individuais. Se eu te dou a mão e você me toma o braço, deixo de dar a mão" – a atriz constata, sem se contentar com a reação. "A gente esquece que a mão moveria montanhas e que nós podemos negar o braço."

Toda essa conversa sobre solidariedade e desconfiança nas relações pessoais passou a incomodá-la há seis anos, quando foi apresentada à peça A Alma Boa de Setsuan, do dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956), pelo diretor Marco Antônio Braz, com quem gostaria de trabalhar, admiradora que é de sua criatividade e irreverência. "Desde que li essa peça, não queria ler mais nada", conta.

Ficou tocada pela parábola sobre "um defeito de fabricação humano: essa convivência entre generosidade e crueldade", perfeitamente cabível à realidade atual de "crise humanitária", embora escrita há mais de 60 anos e ambientada na China. Denise abraçou o papel de Chen Tê, a prostituta pobre que, bondosamente, dá abrigo a Deus – no original, eram três deuses, transformados por esta adaptação na Santíssima Trindade – e recebe em troca uma pequena fortuna. Generosa e agora rica, sofre para negar os pedidos alheios, ao ponto de inventar uma outra personalidade mais corajosa ao dizer "não".

Estranho o interesse da popular comediante, que esteve oito anos à frente do quadro "Retratos Falados", no Fantástico, pelas discussões brechtianas sobre ética e poder? De modo algum. "O mais legal dessa peça é que Brecht fala disso de uma maneira muito bem-humorada. Como artista, o que mais me fascina é esse caminho do meio entre drama e comédia. Você pode dizer o que quiser com humor. É um veículo transgressor, vai como uma flecha."

Está explicado, em parte, o sucesso tremendo da montagem, que estreou em São Paulo em julho passado. Denise Fraga, por si só, é um inegável apelo de público. O tempero do humor garante a satisfação de quem procura apenas entretenimento, enquanto os momentos de reflexão se infiltram entre os risos e, respaldados por atuações, direção, figurinos, cenário e iluminação competentes – categorias pelas quais está indicado ao prêmio Shell-SP –, conquistaram a crítica. A Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) o elegeu o melhor espetáculo de 2008 e escolheu Denise como melhor atriz.

Encerrada a temporada paulista, durante a qual acumulou mais de 31 mil espectadores nas primeiras 60 apresentações, a montagem seguiu para Florianópolis no começo deste mês e faz sua segunda parada da turnê nacional em Curitiba, no Teatro Guaíra, dias 14 e 15. Denise é acompanhada por um elenco de mais 11 atores, entre os quais estão Maurício Marques, idealizador do projeto ao lado dela e de Marco Antônio Braz; o curitibano Joelson Medeiros, com quem trabalhou na minissérie Queridos Amigos; Ary França (de Durval Discos) no papel de ninguém menos do que o Todo-poderoso; e Cláudia Mello (A Diarista) – um bando de humoristas experientes.

"Estou superfeliz, porque nunca estive em cena me apropriando tanto do texto como nessa peça", comemora a atriz, satisfeita em "provar que Brecht é divertido". "Quando se é ator, você fica em dúvida se o que te tocou em um texto chega ao público. Com essa peça, não. A plateia compreende exatamente o que eu queria que compreendesse. Escuto gente gargalhando e fungando, é muito bom!"

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Serviço

A Alma Boa de Setsuan. Guairão (R. Cons. Laurindo, s/n), (41) . Direção de Marco Antônio Braz. Com Denise Fraga, Ary França, Cláudia Mello e Joelson Medeiros. Dia 14 às 21 horas e dia 15 às 19 horas. Ingressos a R$ 60 (plateia) e R$ 50 (balcões) até 12 de março. Meia-entrada para estudantes e idosos.

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