A melancolia que impele

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Aristóteles afirmou que a melancolia era um ponto em comum entre os que ele chamava de "homens de exceção", aqueles raros, que fazem algo além do normal. Portanto tomemos essa ilustração aristotélica para combinarmos, desde já, que a melancolia não é ruim, é completamente diferente da depressão e ajuda filósofos e artistas a construir sua profissão desde a Grécia Antiga.

Esse sentimento é uma an­­gústia com as coisas ao redor, que Baudelaire costumava chamar de "spleen" – que remete também à Grécia Antiga, cuja medicina dizia que o motivo era o excesso de bile negra, ou humor negro. "Quando o céu plúmbeo e baixo pesa como tampa/ Sobre o espírito exposto aos tédios e aos açoites..." dizia o poeta francês que, talvez pela referência ao tempo pesado, aos dias cinzas, fez tanto as cabeças dos poetas curitibanos, maior centro do simbolismo do país na virada do século 19 para o 20.

Curitiba e os artistas continuam cultivando seu "spleen" e com ele gerando obras de arte. Este texto vem falar do disco Arrow of My Ways, da banda Rosie and Me. Um disco banhado de melancolia tanto em letras quanto nas melodias. Um disco de transição, de passagem do EP de estreia, Bird and Whale, para o que virá adiante.

Em Bird..., apesar da música que mais se destacou, "Bonfire", ser alegre, um convite juvenil para a dança, a canção título trazia a história de um amor impossível: "it’s two against the world but we’ll be brave." Nesse ponto, quero deixar claro que a melancolia não é um sentimento passivo, que deixa a pessoa prostrada. Ela impele uma reação criativa. O filósofo Walter Benjamin tratou disso, mas não há espaço e nem eu tenho a competência para falar do trabalho dele agora, por isso, cito apenas uma frase retirada do texto "O Narrador": "Se o sono é o ponto mais alto da distensão física, o tédio é o ponto mais alto da distensão psíquica. O tédio é o pássaro de sonho que choca os ovos da experiência".

Então, combinemos aqui mais uma coisa, que, quando falo em melancolia, ou tédio, ou "spleen" etc, falo de um sentimento que põe um artista em movimento. A retração serve para refletir o que está se passando à sua volta, principalmente quando há um momento de transição. Rosanne Ma­­chado, a band leader do Rosie and Me, passou por esta transição. 2011 foi um ano doloroso para a banda, que quase viu o seu fim depois dos desentendimentos com o antigo produtor. Como ela mesma fala, o novo trabalho foi feito quase como um diário sobre a transição e representa um amadurecimento do grupo.

Arrow of My Ways não é um disco tão fácil quanto o primeiro EP. As letras são mais pesadas e as melodias mais densas, menos dançantes. A voz doce e a interpretação não deixam o disco ficar soturno. Mesmo assim, pode ser que corra uma lágrima de uma alma sensível que passa por um período mais frágil.

As dúvidas e emoções do ano passado são traduzidas por Rosanne em canções que contam a história de pessoas e seu relacionamento, ou dificuldade de relacionamento. Por mais tristes que sejam, há uma esperança que fica. Como disse, é uma transição. O título do ál­­bum pode explicar isso. É um trocadilho com "errors of my way", expressão – que também é uma canção da banda inglesa Wishbone Ash – que se refere aos erros que uma pessoa comete. Na versão de Rosanne, ela aponta caminhos.

O disco tem duas participações especiais internacionais: Joshua Thomas e Greg Thomas, que não são irmãos – um é americano e o outro inglês. A faixa título tem a voz de Greg, que caiu perfeitamente bem com a de Rosanne. Tanto que até ela passou a sentir falta de uma voz masculina em outras canções.

A banda ainda tenta marcar shows para Curitiba antes de viajar, em março, para os Estados Unidos, como convidada do festival South by Southwest e emendar outros shows. O grupo tem uma grande expectativa pelo que acontecerá no mítico The Hotel Café, em Los Angeles.

O novo disco pode ser baixado gratuitamente ou comprado em sua versão física no site da banda (rosieandmemusic.com)

Assista à entrevista com Rosanne Machado e sua performance de "Shotgun to the Heart"em www.gazetadopovo.com.br/blog/sobretudo