• Carregando...
Pré-carnaval ganhou chancela oficial e deixa o Largo da Ordem: domesticação. | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Pré-carnaval ganhou chancela oficial e deixa o Largo da Ordem: domesticação.| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

As mudanças no carnaval anunciadas pela Fundação Cultural de Curitiba (FCC) na segunda-feira são exemplos de como, mesmo com boas intenções, se pode acertar e errar a mão nas políticas públicas na área cultural. Ainda servem para ilustrar como a "política" é mesmo a arte do possível, como bem definiu Bismarck, a velha e felpuda raposa da unificação alemã (e não aquele que jogava no Vasco).

Se por um lado, a volta à Marechal pode dar uma levantada no desfile das escolas, a domesticação do bloco de pré-carnaval Garibaldis e Sacis mostra que as aparentes mudanças de "grupos" no comando da administração municipal são limitadas e esbarram em algumas circunstâncias sociais e políticas aparentemente inquebrantáveis.

No caso do retorno dos desfiles ao centro, todos ganham. A arquitetura e a atmosfera asséptica do Centro Cívico não combinavam com carnaval. Ao contrário da velha Marechal que é uma rua viva, popular, cercada de bares, equidistante a todos os bairros da cidade. E com uma tradição de desfiles e corsos carnavalescos desde o tempo em que o salvador Graciano tocava sua gaita de oito baixos nos corredores da PRB2. Uma opção que tem tudo para dar certo, dentro das proporções do nosso tríduo momesco.

Na outra ponta, se anunciou também que o Psycho Carnival entrou para o calendário oficial e vai ter apoio de estrutura e patrocínio da FCC. Aqui também, as mudanças aparentemente vêm para melhorar o que já era bom. Estão programados, por exemplo, uma perna de shows (chamada de Rock Carnival) de graça e na rua com 21 bandas. Entre elas, duas das preferidas da casa – os "duros de matar" Pelebrói Não Sei e Beijo AA Força.

E também outras muito boas, como Hillbilly Rawhide, Motorocker, Cadela Maldita, Diablo (Porto Alegre), Camarones Orquestra Guitarrística (Natal) e as inglesas Sharks e King Kurt, da cena psychobilly britânica da década de 80. Será na praça Eufrásio Correia, que estava precisando mesmo de atenção, pois já vão longe seus melhores dias.

A versão oficial não prejudica a tradicional festa no Jokers nas madrugadas, para onde sempre levo meus coturnos nos tempos do samba, suor e ouriço. Aqui também, tudo aparenta estar no seu lugar.

Não fazer nada

No meio disso tudo, o pré-carnaval. Na minha modesta opinião, quando chegou à mesa de decisões a questão do destino do bloco Garibaldis e Sacis, a melhor saída teria sido um ofício nos moldes daquele famoso do então prefeito biônico Jaime Lerner: "Não fazer nada, com urgência". Na ocasião, obras da prefeitura colocavam em risco um olho d’água em um bairro da cidade.

No caso dos Sacis, o mais sensato seria deixar as coisas como estavam. As últimas saídas tinham sido exitosas em todos os sentidos – alegria independente e segura no espaço mais agradável da cidade, percorrendo o trajeto que, enfim, dá nome ao bloco. Era só deixar rolar.

Contudo, ao que consta, a solução costurada pela prefeitura e os demais interessados – incluir o pré-carnaval no calendário oficial, sujeito a pagamentos de cachês e limitações contratuais – parece ter agradado aos blocos de rua, de sujos, da situação e da oposição (sem falar do bloco dos apoiadores e patrocinadores).

Em especial o último, que tem em seu cordão elementos com o poder de decisão sobre o que pode ou não pode acontecer na região da nossa apressada e apertada feirinha dominical, que com o passar dos anos vai substituindo o artesanato por produtos chineses.

Nada contra o fato da remuneração dos foliões do G&S, que ralam e se empenham a vera, mas é inegável que tudo fica mais chato – único pecado que se pode cometer no carnaval – quando ganha a chancela oficial. Se a tendência for mesmo essa, os foliões do pré-carnaval do Ao Distinto Cavalheiro também querem que a FCC coloque a festa – alvo preferido da polícia de costumes nos últimos anos – no calendário do ano que vem.

De qualquer forma, como escreveu o poeta João Batista de Pilar: "Mesmo que a vítima adormeça/ A corda enlace o pescoço/ A voz se perca no grito e o circo desapareça…/ ainda haverá espetáculo". Aliás, o poeta é quem deveria ser o "subprefeito" do Largo da Ordem, pois conhece melhor que ninguém aquelas calçadas.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]